Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 04 de outubro de 2014

O Candidato Honesto (2014): uma constrangedora sátira política

Leandro Hassum se esforça para fazer rir em mais uma comédia enlatada.

O Candidato HonestoO período de campanha eleitoral no Brasil é sempre um momento controverso. Surgem candidatos de toda espécie, em todos os rincões do País. Muitos apenas querendo aparecer, outros até são bem intencionados. Infelizmente, o problema reside naqueles que ganham as eleições e se aproveitam de sua posição privilegiada para benefício próprio, virando as costas àqueles que os elegeram. Por conta de mais uma “festa da democracia” que se aproxima, o diretor Roberto Santucci traz às telas uma sátira ao sistema eleitoral brasileiro.

O filme conta a história de João Ernesto (Lenadro Hassum), candidato à presidência da República pelo partido PEDN (Partido da Ética Democrática Nacional), que chegou ao dia da votação com ampla vantagem sobre seu adversário mais próximo, o Tio Tonho (Nilton Bicudo), do partido FECO (Força Ecológica). Seu grande apelo popular se deve à sua origem humilde, como filho de imigrantes nordestinos até a bem sucedida carreira política, baseada em seu carisma e honestidade. No entanto, como muitos políticos brasileiros, Ernesto guarda segredos que não chegam ao conhecimento do público: ele é na verdade um dos mais corruptos do parlamento, envolvido em dezenas de casos de corrupção. Porém, todo o seu plano (e do seu partido) de se tornar presidente pode ir por água abaixo por conta de um evento inusitado: em seu leito de morte, a avó do candidato pede para que ele passe a ser alguém honesto.

A partir daí, ele começa a sofrer terrivelmente, pois fica totalmente impossibilitado de cometer qualquer ato desonesto. A premissa, claramente copiada de “O Mentiroso”, é bastante simples e previsível, o que era esperado. Afinal, o roteirista Paulo Cursino é um dos irresponsáveis por ˜pérolas” do cinema nacional, como “Até Que a Sorte Nos Separe 2”e “O Diário de Tati”. O sentimento que permeia boa parte da projeção é o de vergonha alheia. É lamentável ver um humorista talentoso como Hassum ser obrigado a imitar os trejeitos e caretas de Jim Carrey na fita americana. Nos poucos momentos em que escapa disso, o ator consegue arrancar algumas risadas do público.

Mas há também boas coisas na trama. A melhor delas, ainda que óbvia, é a paródia de casos famosos de corrupção da nossa história. Há referências ao mensalão, inclusive com ˜reconstituições” de eventos que ocorreram na época. Também há caricaturas de grandes líderes nacionais, desde ex-presidentes a deputados e senadores pegos em flagrante ou envolvidos em polêmicas recentes.

O elenco de apoio também realiza um bom trabalho (dentro do possível). Flávio Galvão se diverte como o corrupto líder de partido, assim como Victor Leal, que interpreta o afetado consultor de campanha. Antonio Pedro Borges é convincente como um experiente jornalista que aconselha a jovem Amanda (Luiza Valdetaro).

Infelizmente, a montagem alterna esses raros bons momentos com outros elementos sempre presentes nas enlatadas comédias nacionais: a constante necessidade de estender a projeção ao máximo, para colocar humoristas que estão em alta de qualquer forma. Ainda que algumas dessas inserções funcionem, como a curiosa sessão com um pai de santo ou a visita a um programa matutino de TV, tais sequências não acrescentam nada para o andamento da história. E para encerrar o sofrimento com chave de ouro, ainda somos brindados com as lições de moral rasas e infantis, o romance improvável e palavrões em profusão. Será que algum dia essa receita desgastada deixará de fazer sucesso nas bilheterias tupiniquins?

David Arrais
@davidarrais

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