Confrontando-se com o dilema da renovação e da passagem do tempo, velha guarda do cinema de ação hollywoodiano dos anos 80 diverte em mais um longa descompromissado.
“Eu não me divertia assim há anos”, declara o personagem vivido por Harrison Ford em dada altura deste “Os Mercenários 3”. De fato, aos trancos e barrancos, entre escorregadas e acertos, é bem nesse clima de nostalgia e descontração tão característico dos outros dois primeiros filmes da franquia que este terceiro se sustenta e alcança seus principais méritos. Nesse clima e no carisma e talento de figuras como o próprio Ford que, ao lado do elenco estelar que já conhecemos e com algumas outras adições perfeitamente bem-vindas, diverte a si e o espectador de modo absolutamente cativante – e explosivo.
Mantendo a lógica dos longas anteriores de começar no meio de uma grande cena de ação, aqui a missão inicial é resgatar um velho companheiro de equipe, Doc (Wesley Snipes), que estava preso há oito anos sob a guarda de outra gangue de mercenários. Após o óbvio sucesso em tal empreitada, o grupo se depara com um novo desafio quando Drummer (Ford), uma espécie de patrão substituto de Church (Bruce Willis não participa deste), os demanda para caçar um vilão chamado Victor Minns. As coisas mudam de figura quando, chegando lá, Barney se dá conta de que o alvo em questão é na verdade Conrad Stonebanks (Mel Gibson), um ex-parceiro de equipe e co-fundador d’Os Mercenários que acreditava ter matado.
Escrito pelos responsáveis pelos dois primeiros longas, Dave Callaham, Richark Wenk e o próprio Sylvester Stallone, o que torna este volume diferente dos outros dois é justamente um novo elemento de “fim de linha” inserido de modo mais firme e pouco explorado anteriormente. Confrontado com uma dura realidade, em um exercício de metalinguagem perfeitamente cabível, Barney Ross se vê em um momento onde precisa renovar a equipe e recrutar novos membros. “Nós um dia fomos os melhores, hoje não”, declara para Lee Christmas (Jason Statham). Vê-lo proferindo essas palavras é quase como se estivéssemos presenciando um desabafo do próprio Stallone, no alto de seus quase 70 anos de idade, sobre sua carreira e o momento periférico que vive atualmente, após o sucesso absoluto que moldou toda uma geração nos anos 80.
Neste sentido, os novos destaques vão obviamente para a lutadora de MMA Ronda Rousey, que interpreta a porradeira Luna; Antonio Bandeiras, que interpreta o hilário e semiaposentado mercenário espanhol Galgo, e para a “pegada” nerd dos outros novos recrutas, muito mais habilidosos com as questões digitais e em burlar sistemas operacionais, e que resulta em divertidas sequências quando contrastadas com o jeitão brucutu e old school de Stallone. Além, é claro, do já citado Harrison Ford, que rouba a cena quando entra de vez no turbilhão da ação pilotando habilmente um helicóptero, no melhor estilo Han Solo e sua Millenium Falcon que todos conhecemos.
Turbilhão este que, infelizmente, mais uma vez é prejudicado por uma direção irregular e que sofre de graves problemas na organização da mise-èn-scéne, no estabelecimento geográfico de seus objetos e agentes para que possamos acompanhar com mais clareza e eficácia o que está acontecendo em tela. Patrick Hughes abusa de cortes frenéticos e mudanças de eixo arbitrárias, filmando de uma forma pedestre e cometendo erros infantis. Na maior parte do tempo, sua condução é até razoável, mas quando esbarra no principal de um trabalho como esse, a ação propriamente dita, Hughes parece não saber o básico.
Desse modo, irregular do ponto vista técnico, mas apostando nas (auto)referências e no carisma de seu elenco, “Os Mercenários 3” acaba cumprindo o que sempre promete: entretenimento sem compromisso. O roteiro é raso e previsível, os personagens são unidimensionais e pouco complexos, mas o filme parece ser o primeiro a saber disso, e com tamanha propriedade que faz com que, ao invés de um defeito, isto seja o combustível de uma experiência explosiva e cheia de energia, em uma homenagem ao cinemão escapista norte-americano da década de 80 que continua a funcionar, com seus ícones, clichês e – por que não? – muita diversão.