Em seu recém-descoberto filão sci-fi, Tom Cruise estrela outro exemplar digno do gênero, embora entregue um final covarde e artificial que não faz justiça ao restante da projeção ou ao livro original.
A literatura japonesa sci-fi, mesmo aquela voltada para jovens adultos, é consideravelmente mais cínica e pessimista que a do restante do mundo, especialmente em comparação com a anglo-saxônica, que costuma dominar o gênero. Portanto, não é uma grande surpresa que este “No Limite do Amanhã”, adaptação de “All You Need Is Kill”, tome algumas liberdades um tanto mais radicais em relação à obra literária de Hiroshi Sakurazaka.
Não que o diretor Doug Liman (“A Identidade Bourne”) e os roteiristas Christopher McQuarrie (“Os Suspeitos”), John-Henry Butterworth e Jez Butterworth (“Jogo de Poder”) tenham desgraçado o que Sakurazaka escreveu. Alguns pontos são até melhor explorados pela versão cinematográfica, especialmente no que concerne ao arco central, mas é fato que um blockbuster de verão estrelado por Tom Cruise teria algumas amarras comerciais, especialmente para manter a censura baixa.
Em um futuro não tão distante, a Terra é invadida por alienígenas conhecidos como mímicos. Após anos de guerra, as forças terrestres preparam uma última investida, para a qual o covarde Major William Cage (Tom Cruise) é colocado na linha de frente, após uma desastrosa reunião com um general britânico (Brendan Gleeson).
Morto logo nos primeiros minutos do embate, Cage acorda no dia anterior ao combate, preso em um loop temporal. Contando com a ajuda da experiente Rita (Emily Blunt), que também possuiu esse “dom”, Cage vai se tornando mais habilidoso a cada morte, à medida que também chega mais perto de descobrir como derrotar os mímicos de vez.
A despeito da familiaridade do público com viagens no tempo (o filme estreou na semana seguinte a “X-Men – Dias de um Futuro Esquecido”, por exemplo), é importantíssimo nesse tipo de ficção estabelecer um grupo de regras para os saltos temporais. Não só o roteiro é bem-sucedido nisso – com exceção do inexplicável e aleatório salto final -, como também amarra o loop ao crescimento do personagem principal.
Claro que já vimos situações semelhantes. Fácil lembrar de longas como “Feitiço do Tempo” (1993), de Harold Ramis. Nesse tipo de narrativa, é ótimo ver o protagonista crescer em meio a esta situação inusitada, sua evolução e adaptação pessoal. Assim como o personagem de Bill Murray na comédia noventista, o Cage de Tom Cruise se torna um homem melhor graças às experiências repetidas, com seu amadurecimento não ficando restrito às suas habilidades de combate.
O começo arrogante e medroso de Cage, armado com o sorriso característico de Cruise, brinca com as expectativas do público referentes aos papéis vividos pelo astro. Mesmo a segurança do militar ao reviver algumas situações contrastam com sua temeridade ao enfrentar novas circunstâncias, o que contribui para mostrar que, apesar do poder especial de Cage, ele ainda é humano.
É interessante ver o ator em momentos mais vulneráveis, os quais ele entrega com a mesma intensidade das cenas de ação. Excentricidades à parte, Tom Cruise ainda é um dos atores mais completos do cinemão hollywoodiano. A atuação de Emily Blunt como a valente Rita ancora o arco do protagonista, provendo não só alguns (necessários) diálogos expositivos, como também alguém com quem se importar, especialmente porque a atriz dá, em pouco tempo, um background dramático convincente para a personagem, enxergando além da “Megera de Ferro”.
Nos papéis coadjuvantes, enquanto Brendan Gleeson faz o militar linha-dura padrão, Bill Paxton nos brinda com mais uma divertida atuação canastrona e exagerada, e as loucuras de seu Sargento Farrell funcionam até como marcadores para Cage (e nós), além de fazerem uma conexão curiosa com “Aliens – O Resgate” (1986), de James Cameron. Já Noah Taylor tem a ingrata missão de viver um cientista maluco genérico, com pouco tempo de cena para gerar qualquer impressão que seja, algo que também se aplica ao Esquadrão J, com os atores tendo de se contentar em viverem meros estereótipos.
Veterano de filmes de ação, Doug Liman aqui tem uma oportunidade de brincar de guerra, com a batalha na Europa remetendo narrativa e visualmente à Batalha da Normandia da Segunda Guerra Mundial, não sendo à toa as semelhanças entre algumas sequências do filme e o primeiro ato de “O Resgate do Soldado Ryan” (1998), de Steven Spielberg.
A despeito do design das armaduras e dos alienígenas não serem dos mais originais (as jaquetas de combate são puro “Warhammer 40k”, enquanto os invasores parecem versões biológicas das sentinelas da trilogia “Matrix”), funcionam para a proposta do longa. As cenas de ação se mostram bastante ágeis e esteticamente atraentes, além de serem claras e filmadas em ambientes abertos, o que valoriza o efetivo 3D mostrado na tela, com a versão IMAX 3D acrescentando um plus a mais no espetáculo.
O grande escorregão do filme jaz em seu artificial epílogo, que parece ter sido martelado no roteiro pela falta de coragem dos produtores em dar uma conclusão de peso à produção. Apesar do resultado final ser uma ficção cientifica mais que satisfatória, ainda saímos da sala com a impressão de que poderia ter sido melhor, especialmente por conta de um desfecho que não faz jus ao restante da projeção.