Liam Neeson retorna como o tradicional e clichê herói de ação neste razoável thriller.
Desde os atentados terroristas ao World Trade Center no dia 11 de setembro de 2001, a segurança nacional passou ser prioridade máxima e absoluta na pauta de assuntos da Casa Branca. Entrar e sair do país virou um processo altamente burocrático, e passou a requerer longos procedimentos de vistoria e monitoramento. Agentes especiais foram colocados em voos aleatórios para, caso houvesse algum tipo de problema, haver comunicação direta com a TSA (Transportation Security Administration), o Departamento de Segurança Nacional dos Estados Unidos.
Dirigido pelo espanhol Jaume Collet-Serra, reeditando sua parceria com Liam Neeson após o razoável “Desconhecido”, e com roteiro dividido com outras três pessoas, John Richardson, Christopher Roach e Ryan Engle, “Sem Escalas” acompanha a história de William Marks (Neeson), um desses agentes especiais disfarçados que, supervisionando secretamente um voo que parte dos Estados Unidos com destino à Londres, começa a receber mensagens enigmáticas no celular, afirmando que uma pessoa presente naquele avião será morta a cada 20 minutos caso uma grande quantia em dinheiro não seja depositada em determinada conta bancária.
Marks é aquele típico herói hollywoodiano: cheio de problemas, mas com uma coragem e uma honra inabalável para resolvê-los de forma honesta. A primeira cena em que ele aparece é dentro de seu carro, observando uma foto de sua filha. No decorrer da fita, percebemos que ele também não desfruta de muita credibilidade profissional, além de ser alcoólatra e fumante. O que nem de longe o torna uma pessoa ruim, elemento que o roteiro rapidamente desconstrói quando nos apresenta uma doce cena dele confortando uma assustada garotinha que viajará sozinha, devolvendo-lhe o ursinho que ela deixara cair no saguão do aeroporto.
Durante a jornada, ele conhece pessoas em que supostamente pode confiar, outras nem tanto. Eficiente em apresentar parte desses indivíduos antes mesmo de entrarem no avião, o longa estabelece desde o princípio algumas das muitas faces as quais ficaremos acostumados a ver durante toda a projeção, já implantando no espectador um sentimento de desconfiança, de estar, assim como o protagonista, sempre suspeitando de todos. Seja do outro agente presente na aeronave que o aborda no banheiro, da comissária de bordo substituta, de um rapaz que pede emprestado seu isqueiro ou até mesmo da bela Jen Summers (Julianne Moore), que senta ao seu lado após trocar de lugar para ficar na janela, desenvolvendo com ele, a partir daí, uma relação de cumplicidade.
Assim, cria-se uma atmosfera de suspense absolutamente envolvente, que em nenhum momento descamba para deduções óbvias. Toda e qualquer movimentação estranha é motivo para ser encarada com desconfiança; do piloto do avião à criança que viaja sem os responsáveis. Em determinada cena, um movimento de câmera nos faz desconfiar de uma pessoa; na seguinte, uma fala um pouco mais estranha, um olhar mais torto, pouco usual e uma colocação fora de contexto nos fazem suspeitar de outra completamente diferente.
Neste sentido, méritos para o diretor, que adota uma abordagem inteligente, fazendo excelente uso narrativo de sua câmera, sempre inquieta e à procura do culpado por trás daqueles acontecimentos. Movimentos estranhos, mudanças bruscas de direção, imagens levemente desfocadas, ângulos inclinados; tudo contribui para intensificar o clima pesado do ambiente e causar desconforto no espectador, criando uma dinâmica de tensão bastante interessante.
Tal dinâmica se mantém coesa durante os dois primeiros atos. Enquanto o foco está mais no suspense e no mistério do que na ação propriamente dita, o longa se sustenta com eficiência. Há momentos em que somos forçados a duvidar até do próprio personagem principal, questionando sua integridade, tamanho envolvimento com a trama e com toda a paranoia presente na situação. Na virada do segundo para o terceiro e último ato, entretanto, a estrutura narrativa balança quando somos confrontados com as resoluções propostas pelo roteiro.
Pouco criativas, tais escolhas mostram-se equivocadas à medida que surgem clichês sem a preparação adequada. Não necessariamente a resolução em si, mas a forma como ela é realizada. A crítica à política de segurança federal norte-americana, por exemplo, é extremamente válida, mas acaba soando vazia e artificial, uma vez que é explicitada de maneira grosseira e pouco elegante, quase como apenas para dar estofo a um filme que se apresentou como sendo puramente de ação/suspense, não parecendo disposto a propor, em nenhum outro instante das quase duas horas de projeção, um debate reflexivo maior acerca de tal tema.
Partindo de estereótipos na concepção de seus personagens e com resoluções questionáveis, mas feliz na construção de uma atmosfera tensa e instável que permeia quase toda a película, “Sem Escalas” é uma experiência interessante. Vale mais pelo suspense e mistério do que pela ação, e mais pelo carismático casal de atores protagonistas do que pelos indivíduos caricatos e de personalidades pouco marcantes que estes interpretam.