Cinema com Rapadura

OPINIÃO   segunda-feira, 03 de fevereiro de 2014

Gloria (2013): uma mulher à procura da felicidade

Retrato de uma mulher em busca de sair da solidão em um contexto de crise política no Chile.

GloriaO recente filme de Sebastián Lelio, “Gloria”, mostra que não importa sua faixa etária para viver, aceitar novos desafios, amar novamente. As pessoas geralmente têm uma ideia de quando se chega a uma certa idade, o que resta é apenas brincar com os netinhos ou ir no bingo da igreja. Nada disso. A terceira idade pode ter uma vida ativa como qualquer jovem.

Gloria, interpretada por Paulina García, é uma mulher determinada a sair da solidão. Com 58 anos e divorciada, ela vê seus filhos crescidos e decidindo o rumo de suas vidas. Contudo, mesmo sentindo um vazio que precisa ser preenchido, ela não fica choramingando pelos cantos e, em muitos bailes da terceira idade, procura encontrar um novo amor. E como já dizia o senso comum: “quem procura, acha”. Glória se envolve com o também divorciado Rodolfo (Sergio Hernandez), um homem tímido, mas que guarda um segredo que o mantém distante.

No início, o relacionamento é promissor, com declarações de amor e poesia. Rodolfo parece ser o companheiro ideal. No entanto, apesar da experiência, Gloria não está imune a decepções e precisa ser ainda mais forte para superar os novos obstáculos que a vida  propõe. Interessante notar que praticamente todos os personagens masculinos são fracos comparados a Gloria. Temos o ex-marido que tem a rejeição da filha, o namorado que desaparece em momentos importantes e depois volta como cão arrependido e o vizinho drogado que vive tendo recaídas, contrastando com as mulheres decididas e independentes do filme.

Lelio, juntamente com o roteirista Gonzalo Maza, também investe, de uma maneira bem superficial, em uma crítica do atual momento político do Chile. Essa crítica fica restrita a raros diálogos e em pequenas passagens do filme, pois o foco principal é realmente Gloria, tanto que em determinada cena, enquanto acontece um importante protesto no fundo, o diretor ignora para mostrar a preocupação da personagem em atender ou não o celular. Não que isso diminua o filme, porém seria interessante uma maior reflexão sobre a realidade ali inserida, até para fosse possível compreender melhor a situação.

A direção de Lelio é competente em dar destaque à protagonista, aumentando ainda mais sua importância. Perceba que a câmera insiste em focar nela, mesmo quando outros personagens estão falando. E isso nos leva a um dos momentos mais lindos do filme (destacado em um dos pôsteres), que é quando Gloria está em um gira-gira e, apesar de tudo que está acontecendo de ruim em sua volta, ainda consegue sorrir. Outra sacada inteligente que vale destacar é quando o diretor brinca com os costumes das duas gerações. Enquanto Rodolfo lê uma poesia em um caderno para Gloria, posteriormente, a filha dela recebe um poema do namorado por e-mail. São pequenos detalhes que fazem a diferença.

O figurino é bem pensado durante o desenvolvimento emocional da protagonista, que no começo usa roupas coloridas e, quando está deprimida, está de roupas apagadas. Isso fica evidente em uma das principais cenas do terceiro ato, onde o vermelho representa o ódio que domina a personagem. Porém, o que deve agradar mesmo o público é a trilha sonora que está impecavelmente contagiante, sempre dialogando com os sentimentos de Gloria (e a música brasileira marca presença com Rita Lee e Elis Regina).

“Gloria” é eficiente em desenvolver sua protagonista e mesmo pecando em começar e depois desistir de aprofundar a crítica política, serve como inspiração para aqueles que, jovens ou velhos, têm medo de que a vida possa machucar demais, deixarem o receio de lado e lutarem pela felicidade que todos merecem.

Guilherme Augusto
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