Química entre Denzel Washington e Mark Wahlberg é ponto alto de adaptação de HQ que resgata clima oitentista de longas do gênero.
Eddie Murphy e Nick Nolte, em “48 Horas”. Tommy Lee Jones e Will Smith, em “Homens de Preto”. Jackie Chan e Chris Tucker, em “A Hora do Rush”. Mel Gibson e Danny Glover, em “Máquina Mortífera”. Etc. Etc. Etc. São muitas as duplas de, digamos, mantenedores da ordem e dons bons costumes criadas e apresentadas por Hollywood para o mundo nas últimas três décadas. Agora temos mais uma para não perder o hábito: Denzel Washington e Mark Wahlberg. Juntos eles protagonizam este “Dose Dupla”, um policial padrão oitentista, adaptado da HQ “2 Guns”, da Boom! Studios, que tem como principal destaque inserir com êxito o que tornou marcante a interação entre os personagens criados pelos oito atores citados acima: o bom humor.
O quesito adentra a trama desde seu início, quando Bobby Trench (Washington) e Michael Stig (Wahlberg) ainda sustentam, escondendo também um do outro, seus disfarces de traficantes de drogas independentes. Mas não demora muito para sabermos que tudo não passa de diferentes estratégias para derrubar um poderoso traficante mexicano. Se Trench realiza seu trabalho como policial da Narcóticos, Stig atua secretamente para a inteligência da Marinha. Até que um roubo a banco armado por eles revela seus segredos e outros dos quais nem tinham ideia, colocando-os na mira de gente bastante perigosa de diferentes áreas do crime organizado.
Conscientes da essencial função da comédia em seu longa, o diretor Baltasar Kormákur e sua equipe de montagem já o iniciam de modo não linear, trazendo para o começo uma das mais hilárias cenas do filme: o planejamento do roubo ao banco. Entre piadas sobre comida, provocações, piscadelas para a garçonete e discussões infrutíferas sobre ditados populares, ainda sobra espaço para a ação, mesmo que comedida nesse primeiro momento. Somos introduzidos, então, de forma divertida ao universo perigoso habitado por esses dois particulares personagens ou, mais especificamente, por essa marcante dupla.
Com texto adaptado por Steven Grant, “Dose Dupla” sabe como explorar a personalidade diferenciada e, principalmente, o bom humor de Bobby e Stig. Quando estão juntos, então, sobram diálogos rápidos e inteligentes sobre os mais variados assuntos. As conversas entre eles são, definitivamente, os melhores momentos do filme, seja durante uma fuga de carro ou mesmo quando são alvos de uma caça organizada por bandidos fortemente armados. O objetivo é dar aos dois a “marra” exata que conceda-os credibilidade de bons investigadores, mas que ainda os aproxime do público pelo carisma.
A meta é cumprida graças também à excelente química entre Washington e Wahlberg. O clássico personagem de ego inflado interpretado pelo primeiro combina perfeitamente com o meio esperto, meio inocente, meio desbocado, mas eminentemente engraçado personagem ao qual o segundo está se acostumando a fazer (vide “Os Infiltrados” e o recente “Sem Dor, Sem Ganho”. O clima de bom humor também contamina a participação de Bill Paxton, como uma espécie de prestador de contas do crime organizado, sempre com uma arma na mão e um discurso de ameaça na ponta da língua. E ele nem precisa de piadas para fazer rir.
O mesmo não acontece com o restante do elenco, que traz ainda James Marsden, Paula Patton e Edward James Olmos, prejudicados por uma trama policial que não sabe lidar muito bem com as reviravoltas e exageros requeridos pelo roteiro, ainda que a sensação de estarmos vendo um bang-bang mais tradicional permaneça. Se o personagem de Marsden surge com o mais desinteressante pela falta de tempo dedicado a ele, a Deb de Patton não tem seu lado trágico explorado apropriadamente. Já Olmos, como o temido traficante Papi Greco, vira um mero carrasco que eventualmente concede oportunidade para os protagonistas acharem graça de sua aparência.
Com um desfecho que faz questão de reunir todos os vilões e mocinhos no mesmo espaço, o filme encerra por cima uma narrativa de bom ritmo, dona de uma duração um pouco além do recomendável, mas cheia de bom humor, inserido em momentos de descontração ou mesmo quando os diversos tiroteios acontecem. Ao fim, a sensação é de um longa policial mediano, mas com grandes doses de carisma, que podem vir a dar fôlego ao nascimento de mais uma franquia protagonizada por uma dupla de caçadores de foras-da-lei.