Com quatro rapazes como protagonistas e uma série de situações bisonhas vividas por eles em um único dia, agora é a vez de o Brasil imitar o adorado “Se Beber, Não Case!”.
Há dois meses, este mesmo crítico que vos escreve fez um texto sobre “Finalmente 18!”, uma comédia adolescente que se apropriava explicitamente dos mesmos elementos que funcionaram em “Se Beber, Não Case!”. Entre situações ridículas de bom e mau gosto envolvendo asiáticos “sem noção” e animais exóticos, o filme sai com um saldo positivo. Pois chegou a vez de o Brasil se render a atual “modinha” das comédias norte-americanas e fazer a sua versão do sucesso do longa de Todd Philips. No entanto, nem o talento de Fábio Porchat salva a falta de criatividade e graça deste “O Concurso”.
A trama conta a história de quatro rapazes bem distintos, de quatro diferentes cantos do País (RJ, SP, RS e CE), que recebem a mesma boa notícia: classificaram-se para a última etapa do concurso de juiz federal. Para competir pela única vaga disponível, todos terão de estar no Rio de Janeiro, mais especificamente na Corte Federal do Estado. Precavidos, eles apresentam-se com antecipação e decidem aproveitar juntos um pouco do que a cidade tem a oferecer. Mas a oferta vem com algumas surpresas que envolvem travestis violentos, anões bandidos, atiradora de facas, muitas confusões (com direito a tiros) e até uma prisão inconveniente.
Já deixando claro que não pretende esconder a obra na qual se inspira, o filme tem início mostrando o resultado da noite bisonha que os quatro protagonistas viveram. Nem a estrutura da montagem ousa ser diferente. Ainda assim, despertando interesse em saber como quatro estudiosos concurseiros acordaram no hospital, vestido de mulher, arranhado da cabeça aos pés ou preso, o longa volta alguns dias no tempo para tentar nos convencer e divertir com suas situações bizarras. No entanto, dificilmente consegue provocar sorrisos e muito menos gargalhadas no espectador.
Apostando no riso fácil provocado por estereótipos, o roteiro traz os seguintes personagens principais: Freitas (Anderson di Rizzi), o cearense religioso; Rogério Carlos (Fábio Porchat), o gaúcho um pouco afeminado; Bernardo (Rodrigo Pandolfo), o rapaz virgem do interior; e Caio (Danton Mello), o carioca malandro. Explorando sem parcimônia a característica principal dos rapazes, o roteiro de Leonardo Levis e L.G. Tubaldini Jr. não importa-se em ser apelativo, podendo soar muitas vezes como ofensivo, especialmente com os gaúchos (apesar de tentar compensar a recorrente piada em seu final).
Mas o pior é a falta de naturalidade das situações apresentadas. O Rio de Janeiro (ainda que apenas o seu subúrbio) não parece a melhor localidade para uma noite de bebedeira, sexo e correria como já foi Las Vegas. Ou pelo menos a cidade exibida pela direção do novato em longas Pedro Vasconcelos não nos convença de que é o melhor local para receber as danações de quatro concurseiros. Logo, é inevitável não se incomodar com “forçações de barra” que trazem mafiosos (daqueles com charutos) negociando gabaritos ilegais de provas, exóticas cerimônias religiosas envolvendo gatos (em mais uma piada recorrente que não funciona) e atiradora de facas viciada em sexo com o dom da onipresença (ainda que interpretada por Sabrina Sato).
Pouca adaptada à cultura carioca, a história, ainda bastante americanizada, busca permitir-se licenças poéticas de uma trama com pouco comprometimento com a realidade. Mas acaba ultrapassando qualquer limite, o que não é devidamente controlado pela direção de Vasconcelos. Aliás, não há qualquer timing cômico no trabalho do cineasta. As raras boas piadas da trama são muitas vezes desperdiçadas pela pouca movimentação de câmera e por uma edição lenta, tipicamente televisiva. Ele fica, então, dependente do talento de atores, não-atores e comediantes em momentos de pura inspiração.
É isso o que faz Fábio Porchat quando lhe é dada a oportunidade de improvisar e brincar com seus trejeitos de gaúcho com alto grau de afetação. Enquanto isso, todo o restante do elenco parece refém de um texto nada engraçado e uma direção estática que desvalorizam ainda mais um trabalho descartável. Com ingredientes que estão se tornando velhos e sem qualquer pitada especial, “O Concurso” é mais uma comédia que desvaloriza “Se Beber, Não Case!” e que deixa claro a falta de criatividade de roteiristas e o quanto o filme tornou-se referência no gênero, até para produções de outros países.