Longa transforma cantor em rebelde sem causa, preocupando-se mais com fatos curiosos de sua trajetória do que com a sua real essência como artista.
Nos últimos anos, os documentários nacionais vêm escolhendo como uma de suas principais temáticas as trajetórias de bandas e músicos brasileiros. E o resultado tem sido, no mínimo, satisfatório. É, de fato, um caminho mais fácil, de poucos percalços e de saldo quase sempre positivo. O mesmo não se pode dizer da ficção. Tanto é que os poucos que apostaram em cinebiografias não deram vida a bons filmes. Se “Cazuza – O Tempo Não Para”, em 2004, pouco valorizava o artista, dando mais atenção do que deveria a promíscua vida sexual do cantor e compositor, “Somos Tão Jovens” também não é digno do que Renato Russo significou e ainda significa para o cenário da música do País.
Pelo menos acertando na escolha do recorte da intensa, mesmo que curta, vida do cantor carioca, a trama nos mostra Renato ou Júnior (Thiago Mendonça), como era chamado pelos pais, ainda em Brasília, para onde se mudou em 1973. Foi lá que ele deu início a sua carreira, já na fase final de sua adolescência. O mergulho no rock aconteceu quando uma doença óssea não o permitia se movimentar. Mas depois da melhora, veio a chance de formar uma banda, e ela se tornou realidade. O Aborto Elétrico nasceu. Ao lado dos irmãos Fê (Bruno Torres) e Flávio Lemos (Daniel Passi), ele deixa sua marca no cenário local. No entanto, desentendimentos levam-no a sair da formação e dar vida, posteriormente, a uma das bandas mais bem sucedidas do rock nacional: o Legião Urbana.
A poesia das músicas escritas por Renato e sua consequente essência como homem, músico e intelectual, porém, jamais ganham destaque nesta produção. Quem acabamos conhecendo durante 100 minutos de duração é o menino Renato. Na verdade, o rebelde sem causa de nome Renato. Nas mãos do diretor Antônio Carlos da Fontoura e do roteiro de Marcos Bernstein (responsável por trabalhos importantes, como “Central do Brasil”), um dos compositores mais aplaudidos da História do País é transformando em um rapaz inconsequente, que decide rasgar a roupa por simples vontade, que invade a festa alheia apenas para mostrar como o rock é mais divertido e que termina uma parceria profissional por nenhum motivo convincente.
Além disso, a história de “Somos Tão Jovens” parece mais preocupada com curiosidades, em revelar como encontros, desencontros e ideias aconteceram. Logo, não se impressione se Hebert Vianna (em imitação sofrível) e Dinho Ouro Preto surgirem, mesmo que suas aparições em nada contribuam para a vida do protagonista ou para a trama. Também não fique espantado se a escolha de nomes de bandas e sobrenomes artísticos tornarem-se motivos para risos durante a sessão. A falta de naturalidade com que esses e a maioria dos diálogos do filme ocorrem, ao lado de uma direção que faz questão de dar closes inconvenientes, tornam algumas situações imotivadas e vergonhosamente cômicas.
Por sinal, a busca do texto por colocar frases de efeito (e sem qualquer conteúdo) na boca de seus personagens incomoda bastante, chegando até a influenciar na composição dos personagens por parte dos atores. Talvez por isso, o Renato Russo de Thiago Mendonça (mesmo com semelhança física inegável) soe tão acima do tom, característica que se repete em outras interpretações. Até mesmo a premiada Sandra Corvelone surge inverossímel como a mãe do cantor. A única que verdadeiramente se salva é Laila Zaid. Como Aninha, a melhor amiga do personagem principal, ela fica responsável pelos diálogos mais descontraídos do filme, dando origem a única relação que convence durante todo o longa, a amizade entre ela e Renato. Não por acaso, uma das melhores cenas da produção seja a apresentação da música que ele escreveu para a moça.
As outras exibições do cantor (e elas são várias) não possuem o mesmo significado, já que não há qualquer relação entre o que compositor escreve e canta e o modo como ele age. Suas inspirações nunca são devidamente demonstradas, não passando de citações ou flashes de curiosidades. E até mesmo a maneira encontrada por ele para guardar suas e as histórias dos outros para posteriores composições é tratada apenas como motivo para brigas e acusações.
Falhando ainda nas contextualizações, seja musical ou política, “Somos Tão Jovens”, pelo menos, ainda reserva momentos de introspecção de seu protagonista em que podemos ouvir algumas das melhores gravações feitas por Renato e sua Legião Urbana sem sermos importunados por qualquer briga juvenil, diálogo forçado ou apresentações sem conteúdo. Mas, infelizmente, eles são poucos. Muito poucos. Mais do que insuficiente para a grandiosidade de um dos maiores nomes da música brasileira. Renato Russo merecia mais.