Sam Raimi nos leva de volta à Cidade Esmeralda para revelar quem era o homem por trás da cortina, embora tenha escolhido um ator que não se mostra muito adequado para este papel.
Ainda navegando na crista da onda das adaptações “sombrias” de contos de fadas, a Disney, responsável pelo megassucesso “Alice no País das Maravilhas”, traz agora aos cinemas mais um filme baseado nas histórias de “O Mágico de Oz”, de L. Frank Baum. A tarefa de levar o público pela estrada de tijolos amarelos recaiu sobre os ombros de Sam Raimi que, assim como Tim Burton (de “Alice”), é um diretor conhecido por seu visual arrojado e pelo seu trabalho com um herói dos quadrinhos.
No entanto, para este “Oz – Mágico e Poderoso”, Raimi teve uma série problemas a enfrentar, alguns até de ordem jurídica. A versão mais conhecida de “O Mágico de Oz” foi aquela lançada nos cinemas em 1939 e estrelada por Judy Garland, atualmente propriedade da Warner.
Nisso, os elementos mais icônicos daquele clássico ficaram proibidos ao cineasta, que teve de trabalhar sob a constante supervisão dos advogados do estúdio. Para sorte do engravatado realizador, a trama concebida por Mitchell Kapner (“Meu Vizinho Mafioso”) e David Lindsay-Abaire (“A Origem dos Guardiões”) foca justamente naquele que o longa da década de 1930 nos mandava não prestar atenção, no homem por trás da cortina – ou naquele que viria a estar lá.
Oscar “Oz” (James Franco) é um mágico egoísta, vigarista e mulherengo, que sonha em ser grandioso como seus ídolos, Thomas Edison e Harry Houdini. Certo dia, tentando escapar das consequências de mais uma das suas artimanhas, ele acaba sendo tragado por um tornado e acorda na mágica terra de Oz, onde uma profecia diz que um mago com o nome daquele reino iria ser o novo rei local e derrotar a bruxa má que aterroriza seus habitantes.
Motivado por suas próprias mesquinharias (leia-se, ouro), Oz resolve aceitar a missão, tendo como companheiros o fiel macaco alado Finney (Zach Braff) e uma linda boneca de porcelana (Joey King). O problema é que o trio não sabe qual é a bruxa má dentre as irmãs Glinda (Michelle Williams), Theodora (Mila Kunis) e Evanora (Rachel Weisz).
Sam Raimi brinca com o perigo e força até o limite do possível as referências a “O Mágico de Oz”, mas não esperem sapatinhos de rubi como no longa anterior da Disney que focou nas obras de Baum (“O Fantástico Mundo de Oz”, de 1985). As ligações entre as fitas funcionam de modo mais orgânico, com cenas do clássico sendo referenciadas pontualmente.
A decisão de filmar o prólogo no mundo real em sépia e no formato 4×3 (mais ou menos) foi magnífica, fazendo uma bela conexão entre as duas fitas (a obra protagonizada por Judy Garland era em preto e branco até o momento em que Doroty chegou a Oz). O uso do 3D é interessante, mas não existe nenhum momento-chave em que este se mostre imprescindível.
O design de produção é bastante imaginativo, especialmente no tocante às criaturas, e Raimi conseguiu fazer seu estilo se sobressair, principalmente com o uso de uma paleta de cores extremamente viva, com alguns momentos mais escuros funcionando bem como contraste. A cantoria é reduzida ao mínimo e existem ideias muito bem aproveitadas, como a do exército pacífico de Oz e o uso dos talentos do protagonista no decorrer da projeção.
O principal problema de Oz é o próprio Oz. Nosso herói é um cafajeste mesquinho, interesseiro, mentiroso… Defeitos que o tornariam absolutamente curioso, se o papel tivesse caído nas mãos de um ator que tivesse a capacidade de se aproveitar dessas “qualidades adoráveis” e dar algum charme ao personagem ao mesmo tempo (vide Robert Downey Jr. e seu Tony Stark ou Harrison Ford e Han Solo).
O papel do protagonista foi entregue para James Franco, um intérprete simpático, mas extremamente limitado. A evolução da personalidade de Oz (e o paralelo entre suas ações no “mundo real” e na terra fantástica) perdem força justamente por conta da falta de alcance do rapaz. Até mesmo sua capacidade como sedutor barato jamais parece ser real, mas apenas uma exigência do roteiro que não é concretizada por Franco.
Michelle Williams passa por uma dificuldade semelhante. Mesmo sendo uma atriz deveras talentosa, a personagem não ajuda, com sua Glinda se mostrando uma figura muito rasa, sem profundidade nem mesmo com suas táticas para levantar o moral do povo de Oz. Já Rachel Weisz está bastante à vontade como Evanora, embora esta não seja uma de suas interpretações mais desafiadoras.
Quem realmente rouba o show são Mila Kunis, Zach Braff e Joey King. A primeira se aproveita do trágico arco de sua personagem para dotá-la de grande complexidade, com sua Theodora sendo, sem dúvidas, o grande destaque da produção. Braff, por sua vez, é um bem vindo alívio cômico com seu Finney e Joey King nos ganha pela doçura de sua bonequinha de porcelana. Ambos tiveram de trabalhar por meio da tecnologia de captura de movimentos, embora apareçam de carne e osso no mundo real, em situações que espelham as dos seus personagens digitais.
Mesmo que não tenha exatamente o direito de ser uma prequel, “Oz – Mágico e Poderoso” se mostra razoavelmente competente, que perde força pela equivocada escolha de seu protagonista e decepciona um pouco ao nos revelar o mistério do mago por trás do pano. Um filme para assistir e sentir saudades da estrada de tijolos amarelos de outrora.