Dois irmãos precisam se virar para encontrar seu caminho de volta para casa, depois de um castigo que não deu muito certo.
Cris, uma garota de 12 anos, e seu irmão mais velho são deixados na beira da estrada por seus pais. Em pouco tempo, eles percebem que o castigo pode se tornar um desafio ainda maior quando embarcam em uma jornada de volta para casa. O que parece ser, à primeira vista, uma versão desconstruída do conto de João e Maria, dos Irmãos Grimm, ganha cores de psicanálise social nas mãos de Marcelo Lordello, pernambucano que assina a direção do longa-metragem “Eles Voltam”.
Uma história de contrastes sociais, o longa não se limita, no entanto, a uma trama exclusivamente sobre dois irmãos perdidos e passa a tratar de conceitos mais diversos, tais como a natureza humana e a vida em sociedade, fazendo muito bem a contraposição entre os núcleos sociais retratados no filme. A atriz Maria Luiza Tavares desempenha papel primoroso aqui, nos conquistando pela forma como carrega com Cristiane essa aventura. A relação de empatia que consegue estabelecer com o público torna a experiência muito mais real para quem está do outro lado da tela, nos fazendo sentir forasteiros como ela em uma terra esquecida.
Ao longo do filme, acompanhamos a personagem em paisagens estouradas de sol, sequências cheias de silêncio no meio do nada e esbarramos em personagens humildes do interior pernambucano, solícitos em ajudar esta desconhecida a encontrar o seu destino final, mesmo que o caminho possa ser longo e tortuoso. Mas só “possa”, talvez os personagens sejam solícitos demais, e acabamos esperando por algum contratempo que não vem, impedido por mães de família dispostas a ajudar a menina e encontros milagrosos.
Outro contratempo com o roteiro vem depois do que parece ser o clímax do longa, onde se pergunta uma ou duas vezes o que ainda estamos fazendo ali, acompanhando cenas que mais parecem uma continuação de “Eles Voltam”. Essa falha acaba desmerecendo o filme injustamente e choca com o que poderia ser considerada a primeira parte do longa, anulando um pouco o efeito conquistado por Lordello até este ponto.
Fora isso, a história consegue manter coerência e engajar quem assiste, com enquadramentos bem pensados e um tom de realidade muito bem orquestrado pelo uso das câmeras e naturalidade dos diálogos entre os personagens. No geral, o roteiro flui e a torcida para que a menina consiga voltar para casa sã e salva é inevitável, o que é um mérito. As personagens são bastante solícitas sim, mas carismáticas na medida certa, arrancando algumas risadas da plateia, um elemento necessário para tirar um pouco do peso da temática.
“Eles Voltam” é o primeiro longa-metragem de ficção de Marcelo Lordello e, com ele, o diretor disputa um prêmio do Festival de Brasília pela terceira vez. Em anos anteriores, Lordello apresentou o curta-metragem “Nº 27 “e o longa-metragem documental “Vigias”.
Esse filme fez parte da programação do 45º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, em setembro de 2012.