Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 23 de setembro de 2012

Eles Voltam (2012): uma aventura com ritmo descompassado

Dois irmãos precisam se virar para encontrar seu caminho de volta para casa, depois de um castigo que não deu muito certo.

Cris, uma garota de 12 anos, e seu irmão mais velho são deixados na beira da estrada por seus pais. Em pouco tempo, eles percebem que o castigo pode se tornar um desafio ainda maior quando embarcam em uma jornada de volta para casa. O que parece ser, à primeira vista, uma versão desconstruída do conto de João e Maria, dos Irmãos Grimm, ganha cores de psicanálise social nas mãos de Marcelo Lordello, pernambucano que assina a direção do longa-metragem “Eles Voltam”.

Uma história de contrastes sociais, o longa não se limita, no entanto, a uma trama exclusivamente sobre dois irmãos perdidos e passa a tratar de conceitos mais diversos, tais como a natureza humana e a vida em sociedade, fazendo muito bem a contraposição entre os núcleos sociais retratados no filme. A atriz Maria Luiza Tavares desempenha papel primoroso aqui, nos conquistando pela forma como carrega com Cristiane essa aventura. A relação de empatia que consegue estabelecer com o público torna a experiência muito mais real para quem está do outro lado da tela, nos fazendo sentir forasteiros como ela em uma terra esquecida.

Ao longo do filme, acompanhamos a personagem em paisagens estouradas de sol, sequências cheias de silêncio no meio do nada e esbarramos em personagens humildes do interior pernambucano, solícitos em ajudar esta desconhecida a encontrar o seu destino final, mesmo que o caminho possa ser longo e tortuoso. Mas só “possa”, talvez os personagens sejam solícitos demais, e acabamos esperando por algum contratempo que não vem, impedido por mães de família dispostas a ajudar a menina e encontros milagrosos.

Outro contratempo com o roteiro vem depois do que parece ser o clímax do longa, onde se pergunta uma ou duas vezes o que ainda estamos fazendo ali, acompanhando cenas que mais parecem uma continuação de “Eles Voltam”. Essa falha acaba desmerecendo o filme injustamente e choca com o que poderia ser considerada a primeira parte do longa, anulando um pouco o efeito conquistado por Lordello até este ponto.

Fora isso, a história consegue manter coerência e engajar quem assiste, com enquadramentos bem pensados e um tom de realidade muito bem orquestrado pelo uso das câmeras e naturalidade dos diálogos entre os personagens. No geral, o roteiro flui e a torcida para que a menina consiga voltar para casa sã e salva é inevitável, o que é um mérito. As personagens são bastante solícitas sim, mas carismáticas na medida certa, arrancando algumas risadas da plateia, um elemento necessário para tirar um pouco do peso da temática.

“Eles Voltam” é o primeiro longa-metragem de ficção de Marcelo Lordello e, com ele, o diretor disputa um prêmio do Festival de Brasília pela terceira vez. Em anos anteriores, Lordello apresentou o curta-metragem “Nº 27 “e o longa-metragem documental “Vigias”.

Esse filme fez parte da programação do 45º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, em setembro de 2012.

Bruno Maranhão
@bmaranhas

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