Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 25 de agosto de 2012

O Ditador (2012): mesmo sem tanta coragem, Baron Cohen continua hilário

Depois de “Borat” e “Bruno”, ator/produtor/roteirista retorna aos cinemas com mais um personagem controverso, reiterando seu afiado humor politicamente incorreto, mesmo que a convencionalidade da narrativa da nova produção a torne deveras esquecível.

Não é todo dia que nascem comediantes com a ousadia de Sacha Baron Cohen. Este britânico de vida particular discreta é um gênio na construção de personagens, já que ninguém explora situações cômicas e desconcertantes decorrentes da diversidade cultural, seja entre diferentes países, seja entre diferentes tribos sociais. Se na televisão havia encontrado seu público, no cinema o ampliou sem perder sua veia politicamente incorreta. Em “Borat” (2006), definiu seu alvo, a conservadora sociedade norte-americana, atingindo-a em cheio. Três anos mais tarde, voltou a atacar o seu puritanismo com “Bruno”, porém sem o mesmo efeito realista que caracteriza o primeiro filme. Agora retorna um pouco menos afiado e mais comercial. No entanto, ainda há muito do que se embaraçar e com que gargalhar em “O Ditador”.

Desta vez no centro da mais recente grande brincadeira de Baron Cohen está Aladeen (sim, a conexão com o nome do famoso personagem da Disney é proposital, mas as coincidências não vão muito além).  Trata-se de ninguém menos do que um poderoso  tirano do fictício país de Wadiya, localizado no Oriente Médio, como não poderia ser diferente. Odiado por chefes de Estado de diversas partes do mundo, ele pouco se importa se as mulheres não possuem direito algum em seu território ou se manda matar todos aqueles que se opõem de alguma maneira à mais irrelevante de suas opiniões. Porém, tudo muda quando, convocado para fazer um pronunciamento na sede da ONU, é boicotado por um de seus mais fiéis empregados. Sem um de seus principais instrumentos de poder, a barba, arrancada sem pudor, passa a ser confundido com um estrangeiro qualquer perdido pelas ruas novaiorquinas.

Mas se Aladeen é um “zé-ninguém” sem a barba, o mesmo não se pode dizer atualmente de Sacha Baron Cohen, seja de rosto limpo ou não. Graças às controvérsias que causou nos últimos anos, sua fama cresceu, e uma de suas principais ferramentas de trabalho, o anonimato, deixou de poder ser utilizada. A mudança acaba afetando diretamente o estilo narrativo que caracterizou seus dois primeiros longas, em especial “Borat”, que se utiliza mais eficientemente do padrão “falso documentário”. Por isso, em “O Ditador” temos uma história tecnica e narrativamente convencional, de atos bem definidos, com direito até a envolvimento amoroso. Logo, a ousadia do roteiro de Baron Cohen (dividido com Alec Berg, David Mandel  e Jeff Schaffer) e da direção de Larry Charles ficam limitadas, assemelhando-se à produção a outras obras do gênero.

A essência cômica, no entanto, faz questão de diferenciá-las. Como é da característica do criador do personagem-título, a comicidade é construída em cima de um humor escrachado que, em boa parte da duração do filme,  está em busca de realizar alguma crítica social ou política (mesmo que pouco enfática), seja a alguns questionáveis hábitos culturais de países asiáticos, seja pela falta de autocrítica dos países do Ocidente, como o roteiro deixa bastante destacado em um dos discursos finais de Aladeen em que aborda a essência da “democracia” vigente nos EUA. As melhores piadas, porém, concentram-se nos primeiros minutos de exibição do longa, quando o protagonista ainda habita sua terra natal, exercendo sua tirania sem qualquer precedente.

É nada menos do que hilário vê-lo organizar suas próprias olimpíadas e ainda arquitetar falcatruas explícitas para sair campeão, como atirar nos pés dos adversários com revólver. E o pior é que a essência do personagem crê em sua própria excelência, enquadrando-se bem no padrão “sem noção” típico das criações de Baron Cohen. No entanto, o segundo ato da trama perde-se em situações demasiadamente particulares do ditador. As gargalhadas são inevitáveis, mas a coragem do texto é bastante reduzida, dando lugar a um envolvimento amoroso pouco convicente que compromete o ritmo da história. O mesmo pode-se dizer da falta de cuidado do roteiro com o “vilão” do longa, que jamais tem suas motivações explicadas.

O personagem, por sinal, de nome Tamir, é interpretado por Ben Kingsley, visivelmente desconfortável  ao arriscar-se em um território pouco explorado por ele anteriormente. Já Anna Faris, como Zoey, a “mocinha” da história, volta a interpretar o mesmo personagem estúpido que vem marcando sua carreira. Desta vez, no entanto, ela não demonstra-se tão eficiente como nos tempos da franquia “Todo Mundo em Pânico”. Por outro lado, vale destacar as boas participações de John C. Reilly e Megan Fox, esta dispondo-se a zombar de sua própria figura artística. Mas quem rouba a cena, claro, é Sacha Baron Cohen, que continua com um timing cômico invejável . Ele compensa, em parte, a falta de originalidade de “O Ditador” com cenas pontuais bastante engraçadas que fazem valer a ida ao cinema, especialmente para quem busca uma comicidade transgessora.

Darlano Didimo
@rapadura

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