Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 27 de maio de 2012

Homens de Preto 3 (2012): sequência resgata o carisma da MIB em divertida produção

Após se perderem em um péssimo segundo filme, os Agentes J e K voltam a combater a escória do universo, encarando uma ameaça bem mais pessoal em uma viagem ao passado.

Nos idos de 1997, o primeiro “MIB – Homens de Preto” ajudou a fazer de Will Smith um dos maiores astros desta geração, com sua química com o sisudo Tommy Lee Jones e o contraste entre suas personas naquele universo estranho sendo uma mistura bem sucedida. Já o segundo filme da franquia foi um desastre, uma cópia sem graça e tremendamente mal-escrita do original, chegando ao ponto de ignorar sua coerência interna em favor de (péssimas) gags.

Dez anos depois, Smith e Jones voltam aos papéis dos agentes J e K neste “Homens de Preto 3”, reunidos sob a batuta do diretor Barry Sonnenfeld, comandante dos dois longas anteriores. A trama, elaborada por Etan Cohen (“Trovão Tropical”) em conjunto com alguns roteiristas que trabalharam em regime de urgência por conta de contratempos durante as filmagens, se encarrega de trazer algum frescor a uma série cansada através de um recurso mais do que conhecido aos fãs de ficção científica: a viagem no tempo.

Após fugir de uma prisão de segurança máxima da MIB, o animalesco Boris (Jemaine Clement, do seriado de TV “Flight of the Conchords”) viaja no tempo, apaga o agente K da existência e prepara uma invasão em larga escala a Terra. Cabe então a J voltar ao ano de 1969, salvar a versão mais jovem de seu parceiro (Josh Brolin) e, consequentemente, o planeta.

Não chega a ser uma surpresa que o longa invista muito mais na linha temporal passada que na presente. Bo Welch, desenhista de produção da fita, incorpora à produção um divertidíssimo toque retrô à ambientação sessentista. O maior exemplo disso é  a sede da MIB que,  no “presente”, mais parece uma versão asséptica e estilizada de uma Apple Store, ganhando em sua versão pretérita um charme meio “Mad Men”, algo que reflete a postura politicamente incorreta e até preconceituosa da agência naquela época, ilustrada pela cena em que o superior de K diz que não se importa com mortes de não-humanos. Os aliens concebidos por Rick Baker embarcam nessa onda vintage, com seus designs remetendo às obras sci-fi da época. Fiquem atentos também aos monitores da MIB para alguns easter-eggs bacanas com algumas celebridades.

A despeito disso, Sonnenfeld não se utiliza do choque gráfico para distrair o público. Os alienígenas de visuais exóticos não possuem lá grande destaque na trama, que se foca mesmo nos protagonistas e abandona algumas figuras carimbadas como os gêmeos e o cachorro Frank (lembrado apenas em duas imagens de fundo). Mesmo o bizarro Boris é um personagem simples e unidimensional. Jemaine Clement parece se divertir horrores interpretando este vilão “clássico”, que busca apenas vingança e odeia ser chamado pela sua alcunha (“O Animal”).

O novato mais interessante é Griffin, mas este não chama tanta atenção pelo seu visual diferente, mas pelo ótimo trabalho de caracterização do ator Michael Stuhlbarg, que transforma o poder do alien de enxergar todos os futuros possíveis em um dom e uma chateação que dificulta sua interação com os outros. Stuhlbarg parece ter tido algumas aulas com Emma Thompson, que viveu alguém com habilidades semelhantes – a Professora Trelawney em “Harry Potter” – e que tem um pequeno papel aqui como a Agente O, nova chefe da MIB, com Alice Eve fazendo sua versão mais moça.  O comediante Bill Hader, egresso do Saturday Night Live, também faz uma participação engraçadíssima como uma surpreendente versão de Andy Warhol.

O foco dramático do script é o relacionamento paternal entre J e K, com a evolução deste encontrando alguns ecos em “De Volta Para o Futuro”, principalmente com as surpresas que J tem ao ver outro lado de seu companheiro. Ademais, a jornada cronológica reforça a relação entre os protagonistas e acrescenta uma nova dimensão ao veterano K.

A composição de Josh Brolin para K é sensacional. Chega a ser assustador como ele conseguiu captar os maneirismos de Tommy Lee Jones e, ao mesmo tempo, deu seu próprio toque ao personagem, compreendendo que seu K ainda não era aquele homem que seu colega interpreta. A despeito de ambos serem homens sérios, este não possui a mesma carranca, nem toda a bagagem emocional e desapontamentos que mais de quarenta anos em serviço tão louco carregam.

A estoicidade de Jones e Brolin diverte bem mais que as piadas óbvias de Will Smith. Este último, por mais que seja o astro do espetáculo, acaba fazendo rir mais ao servir de contraponto às diferentes versões de seu parceiro. Mesmo assim, Smith tem alguns  ótimos momentos, principalmente os que envolvem o “choque cultural” que sofre ao aterrissar em plena época do movimento de luta pelos direitos e liberdades civis.

Sonnenfeld conduz a produção de maneira leve, mostrando um desejo em voltar ao sucesso de outrora, se sentindo em casa ao lidar com uma comédia repleta de situações e personagens igualmente estranhas, se saindo surpreendentemente bem, considerando os diversos problemas que ocorreram no decorrer das filmagens. No entanto, o diretor escorrega no uso – inútil – da tecnologia 3D, principalmente em algumas sequências cujo uso da tecnologia é tão inorgânico que mais parecem saídas daqueles filmes tridimensionais dos anos 1950 que usavam os toscos óculos de celofane.

A despeito do filme contar com sua dose de furos (o que acontece em quase todas as histórias que envolvem viagens no tempo), “Homens de Preto 3” cumpre seu papel de divertir, resgatando uma promissora franquia do estado deplorável que se encontrava.

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Thiago Siqueira
 é crítico de cinema do CCR e participante fixo do RapaduraCast. Advogado por profissão e cinéfilo por natureza, é membro do CCR desde 2007. Formou-se em cursos de Crítica Cinematográfica e História e Estética do Cinema.

Thiago Siqueira
@thiago_SDF

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