Cinema com Rapadura

OPINIÃO   terça-feira, 15 de maio de 2012

Paraísos Artificiais: drama reflete sobre as escolhas dos jovens modernos

Primeira investida de Marcos Prado em ficção resulta em um filme visualmente impecável.

Quando Marcos Prado lançou o documentário “Estamira”, em 2004, e levou para casa prêmios internacionais importantes, como nos festivais do Rio, São Paulo, Miami e Havana, o cineasta entrou para a lista dos talentosos diretores responsáveis por uma nova identidade do cinema nacional. Foram necessários oito anos para que Prado voltasse às telonas, após se dedicar à produção de outros documentários e dos dois “Tropa de Elite”, ao lado de José Padilha, com uma obra inteiramente sua, dessa vez uma ficção (sua primeira).

Em “Paraísos Artificiais”, o diretor conta com a produção de Padilha em uma história forte dividida em três tempos da vida dos personagens. O resultado não é nada menos do que uma bela película que reflete sobre uma juventude moderna e aparentemente sem limites. A obra nos apresenta a DJ Érika (Nathalia Dill), sua amiga Lara (Lívia de Bueno) e Nando (Luca Bianchi), que se envolvem durante uma rave. Contar mais do que isso pode estragar detalhes da trama, que se desenrola ao som de muita música eletrônica, sexo e uso constante das mais variadas drogas.

Dentro desse ambiente onde tudo parece ser mais fácil e divertido quando se está “viajando”, compartilhamos o destino que foi reservado aos três jovens. Sem levantar falso moralismo sobre as drogas, o diretor se preocupa mais em transportar o espectador àquelas “viagens”, presenteando-os com sequências inspiradas que expõem o que eles vivem, dentro e fora de suas mentes.  Tudo isso auxiliado pela bem elaborada fotografia, sempre forte e impecável, e pela trilha sonora, que se utiliza das modernas batidas da música eletrônica para embalar com harmonia as “viagens” dos personagens.

Destaque para a sequência mostra Érika e Lara alucinando na praia a caminho da rave. Prado envolve o público em um espetáculo sensorial que passa pelo pavor, desespero, alegria e tristeza. Como é dito no filme, as drogas despertam o que está internalizado em cada um, e isso nem sempre pode ser uma coisa boa. A representação do pânico feita com um rebanho imaginado por Érika chega a espantar pela eficiência cênica e as imagens capturadas pela câmera de Prado compõem apenas o começo de tantas outras sequências marcantes.

O diretor aborda com crueza a tragédia que envolve o triângulo. Os dramas paralelos vividos pelos familiares e amigos também funcionam na telona, dando suporte ao trio principal. A montagem, essencial para a narrativa do longa, é bem executada, sem nunca deixar o público confuso em que fase da vida os personagens estão. Se há instabilidade no longa é quando força um romance em Amsterdã, sem o público acompanhar muito bem o envolvimento dos personagens durante aquela fase. A rapidez com que a trama precisa se resolver no terceiro ato também incomoda, mas não tira os méritos da película.

O elenco, encabeçado por Nathalia Dill, também se entrega àquele universo de diversão e perdas. Dill explora a sensualidade do seu corpo de menina para se transformar em um furacão em cena. A química dela com Lívia de Bueno, intérprete de Lara, leva força àquela relação ambígua. Luca Bianchi como Nando é o que mais desenvolve as três fases de seu personagem, deixando-se transformar pelos fatos com a passagem do tempo. O trio é tão forte em cena que deixa pouco espaço para os personagens secundários, que apenas cumprem a linha dramática sustentada pelo roteiro.

“Paraísos Artificiais” é um drama sobre encarar as consequências das atitudes, quaisquer que sejam, e buscar onde estão as chances de mudança e superação, já que a vida está aí para correções, arrependimentos e novas tentativas. Muito bem realizado por sua equipe técnica, o longa é uma grata surpresa da produção nacional, reiterando o potencial de Marcos Prado na cinematografia brasileira.

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Diego Benevides é editor chefe, crítico e colunista do CCR. Jornalista graduado pela Universidade de Fortaleza (Unifor), é especialista em Assessoria de Comunicação, pesquisador em Audiovisual e educador na linha de Artes Visuais e Cinema. Desde 2006 integra a equipe do portal, onde aprendeu a gostar de tudo um pouco. A desgostar também.

Diego Benevides
@DiegoBenevides

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