Com imparcialidade, Robert Redford conduz trama competente sobre nação dividida após Guerra Civil Americana
Retratar períodos importantes da história dos EUA muitas vezes rendem produções que se vangloriam do patriotismo intrínseco e, consequentemente, incômodo para alguns espectadores do lado de fora da fronteira ianque. O ator, diretor e produtor Robert Redford decidiu tocar na ferida da Guerra de Secessão (1861-1865) e na morte do presidente Abraham Lincoln no dia 15 de abril de 1865, quando o país ainda sentia os reflexos do grande conflito que dividiu entre os que defendiam e os que apoiavam a escravatura.
Em “Conspiração Americana”, roteirizado por James D. Solomon e Gregory Bernstein, acompanhamos a história de Frederick Aiken (James McAvoy), ex-combatente da Guerra e jovem advogado que, após o assassinato de Lincoln, é incumbido pelo veterano juiz Reverdy Johnson (Tom Wilkinson) de assumir a defesa de Mary Surratt (Robin Wright), uma viúva dona de uma pensão, acusada de abrigar oito homens que, acusados da morte do presidente, também teriam tentado liquidar o vice-presidente Andrew Johnson e o secretário de estado William Henry Seward.
Inexperiente e convicto de que Mary é culpada, Aiken começa uma luta no tribunal militar para descobrir a verdade por trás do assassinato e das verdades e mentiras escondidas pelos nove acusados. Uma peça-chave, no entanto, está faltando: o filho de Mary, John (Johnny Simmons), que se reunia na pensão com os acusados da Federação (ou seja, defensores da escravatura) para arquitetar o ousado plano de sequestrar o presidente.
Na acusação, Aiken terá de bater de frente com o promotor Joseph Holt (Danny Huston) que quer, a todo custo, condenar os apontados na conspiração. Católica e sulista, Mary é vista como alvo fácil da nortista União, que saíra vencedora da Guerra Civil do presidente abolicionista. Disposta a defender o filho desaparecido, Mary usa de todas as armas para não entregar o rapaz, nem que isso tenha de pôr em risco a filha mais nova, Anna (Evan Rachel Wood), dividida entre depor contra a mãe ou contra o irmão.
Além do incansável Holt, Aiken terá pela frente, ainda, o braço-direito de Lincoln na Guerra Civil, o secretário de guerra Edwin Stanton (Kevin Kline) que, mantendo o cargo do agora atual presidente Andrew Johnson, tenta aparar as arestas de uma sociedade ainda em frangalhos e colidindo entre si por conta do ainda recente conflito civil. Trocando em miúdos, para Stanton é necessário encontrar um culpado – ou culpados – pela morte do líder da nação. Caso contrário, a situação sociopolítica ficaria incontrolável.
Assim, Aiken, dividido entre a culpa e inocência de Mary, terá de arcar com as consequências do julgamento, seja na sua reputação ameaçada ao absolver uma mulher considerada “um monstro” pela sociedade, seja na condenação dela que colocaria em risco seu futuro como advogado. Alternando entre a proximidade criada com Mary, sua briga solitária diante do manipulador júri militar e as pistas surgidas no caminho, o jovem advogado vai montando o quebra-cabeça que definirá o destino dos personagens.
Dirigido de forma correta por Redford (vencedor do Oscar de Melhor Diretor pelo sensível “Gente Como a Gente”), “Conspiração Americana” mostra os EUA ainda frágeis e lidando com uma situação incomum. Bem produzido, fotografado e com direção de arte competente, o longa ainda ganha apoio pelo bem acabado trabalho do compositor Mark Isham, responsável pela trilha de filmes como “Crash – No Limite”, “Dália Negra”, “Leões e Cordeiros” (também dirigido por Redford) e “Nada É Para Sempre”, na qual recebeu uma indicação ao Oscar.
Embora envolva muitos personagens e fatos, a obra talvez funcionaria melhor em uma produção mais longa, como uma minissérie, mas o resultado não decepciona. McAvoy está competente no papel do jovem que se vê diante de um caso jurídico inédito, enquanto Wilkinson, ótimo, só peca por não ganhar mais destaque na trama, assim como a presença sempre bem-vinda de Kline. Porém, a grande surpresa é Robin Wright que, despindo-se de toda sua vaidade, dá a carga dramática necessária a uma personagem envolvida em uma situação sufocante.
Inevitáveis por conta do contexto histórico, nem mesmo alguns discursos calorosos sobre patriotismo estragam o produto final de “Conspiração Americana”, que prende a atenção, especialmente daqueles que não conhecem maiores detalhes do assassinato de Lincoln. E, de brinde, retrata de forma imparcial um fato histórico daquele delicado período da história norte-americana. Merece ser conferido.