A trama mais rala, rasa e pobre da franquia tornou-se seu longa metragem mais conciso. E, apesar de perder parte do seu característico teor de “romance-descabelado”, a saga se abre para um público maior, ainda que passeie por velhos conceitos previamente estabelecidos e demonstre a notável evolução dos mesmos.
Novamente advirto: A chave para se criticar e apreciar um filme é compreender sua proposta. Feito isso, digamos que “Eclipse”, bem como seus antecessores, obtém um resultado adequado, ainda que esse último se sobressaia em quaisquer que sejam os pontos analisados.
Primeiramente, acho necessário salientar o quanto a saga cinematográfica de “Crepúsculo” sofreu na sua execução. Ainda que seja interessante contemplar as diversas visões acerca do universo de Stephenie Meyer, a irregularidade de estilos aplicados pelos diferentes diretores que assumiram seus respectivos filmes é sentida de maneira desconfortável por quem procura analisar uma linearidade narrativa como um todo. Algo bastante semelhante aconteceu com a primeira quadrilogia da saga cinematográfica “Harry Potter”.
Por isso acredito que a franquia “Crepúsculo” ainda peca por não ter conseguido estabelecer-se madura. Concordo com a proposta de interpretar a característica principal de cada livro e procurar o diretor mais adequado para reproduzi-la em tela, mas isso acaba por evitar um diálogo entre esses produtos, transformando-os em histórias individuais.
O terceiro capítulo da história de Bella narra suas incertezas acerca das escolhas que lhe são concedidas. Ela se encontra dividida entre Edward e Jacob, entre uma vida vampira e uma vida humana, entre seus desejos e suas responsabilidades. Durante suas crises de personalidade e seu gradual processo de amadurecimento, concomitantemente são descobertos vários ataques estranhos em Seattle, e acaba-se por descobrir que foram provocados por Victória, ainda em busca de vingança, agora com um exército de vampiros recém-criados.
O roteiro assinado por Melissa Rosenberg mostra leve evolução se comparado aos anteriores. Talvez por ser a única constante nas produções dos filmes, ela acabou por adquirir maior identificação com a história e talvez maior compreensão dos propósitos das obras literárias homônimas. Ainda que peque em certas transições e modifique alguns rumos narrativos, dessa vez ela nos poupa de palavras de amor inócuas em contextos ainda mais incabíveis, como fizera anteriormente.
Rosenberg procura firmar a personalidade dos personagens centrais, estabelecendo uma relação mais crível entre eles, e sabendo contextualizar a trama em princípios e valores da sociedade atual. Cortando excessos e uniformizando o ritmo, a roteirista ainda consegue, pela primeira vez, constituir diálogos mais sérios e maduros. Claro que ainda não presenciamos nem sombra da competência dessa mesma escritora, que assina roteiros da série “Dexter”.
A direção assinada por David Slade constitui-se no ápice de toda a série até agora. Uma vez que a história do livro oferecia situações difíceis, distoantes e extremamente constrangedoras, cabia a Slade equilibrar esses elementos. E ele o fez com grande êxito. E ainda ouso dizer que o motivo o qual o longa obteve sucesso, foi principalmente a direção sábia, precisa e original, impressa pelo diretor.
Vindo de filmes mais pesados como “Menina Má” e “30 Dias de Noite”, a escolha do diretor justifica-se devido ao tom mais sombrio que a história tem. Slade opta por closes e planos fechados, o que insinua intimidade com os personagens. Ele consegue transformar as situações mais apelativas e constrangedoras em cenas simples e cabíveis, e ainda filma as sequências de ação com grande competência.
O que coopera para a boa representação do que se vê em tela é a fotografia primorosa de Javier Aguirresarobe, que sabe alternar e definir brilhantemente os ambientes em que se passam a trama. Ele pinta uma Seattle caótica, uma Forks congelada e dá charme aos flashbacks de época, isso tudo sem perder sua linha sombria.
As atuações crescem gradativamente a cada filme. Ainda que se possa afirmar, por exemplo, que Robert Pattinson não atua corretamente, é inegável que sua falta de expressividade condiz em absoluto com seu personagem. Kristen Stewart, por sua vez, é brilhante e encontrou na saga “Crepúsculo” um bom personagem.
Durante sua – ainda – pequena filmografia, Kristen Stewart mostrou-se correta, ainda que repetitiva. Contudo, desde o primeiro filme dessa franquia, foi notável o quanto ela conseguia representar com precisão cirúrgica a personagem vinda das páginas de Stephenie Meyer. E nesse filme ela parece ainda mais a vontade, bem como o resto do elenco. Billy Burke segue muito bem de maneira sutil, Dakota Fanning ainda rouba as poucas cenas em que participa, Taylor Lautner permanece bastante sintonizado e temos o destaque de Jackson Rathbone, que teve seu papel com importância palpavelmente maior dessa vez.
A trilha sonora é outro ponto alto do longa. Algo que me incomodava outrora era o modo como os filmes antecessores conseguiam subaproveitar a trilha. Aqui as canções aparecem no momento correto, da maneira correta, e suas primorosas faixas vão desde – a reincidente – Muse, passando por Sia, Beck, Fanfarlo, até Florence + The Machine, essa última sendo apresentada apenas nos créditos finais.
A trilha instrumental, por sua vez, é violentamente desfalcada. Se em “Lua Nova” o ponto alto do filme foi justamente a trilha primorosa composta pelo mestre Alexander Desplat, aqui Howard Shore assume o comando e entrega um trabalho preguiçoso e sem originalidade. A trilha instrumental apresentada no filme aparenta ser composta de apenas uma música-tema e todas as demais são apenas releituras e variações dessa. Uma pena, posto que o filme anterior contou com uma trilha de qualidade tamanha, que não condizia com seu conteúdo.
Portanto, depois de três filmes, a saga “Crepúsculo” conseguiu encontrar maior equilíbrio. Ainda que “Eclipse” tenha a trama mais fraca da franquia, ele é superior nos demais quesitos. Contudo, é necessário compreender que esses filmes não são filmes sobre vampiros e muito menos lobisomens. É uma história de amor, que se utiliza de mitologias e alusões para acrescer uma linha narrativa sobre uma relação utópica que subverte valores amorosos dessa geração, onde questiona-os, e ao mesmo tempo, os discute.