Longa faz uma homenagem ao universo jovem e seus heróis.
Abençoados sejam os nerds. Antes vistos como isolados e bitolados nos estudos, os “Neo Nerds” de hoje, devido à maciça socialização alavancada pela internet, dominaram o mundo “cool” em quase todas as áreas do entretenimento, de jogos a filmes, e se tornaram um público alvo a ser bajulado. É graças a eles que pérolas como “Kick-Ass – Quebrando Tudo” são produzidas.
Depois de filmes como “Star Trek”, ou mesmo “Matrix” (que pode ser considerado um dos precursores desta onda), este filme do herói mascarado e improvável é com certeza a celebração deste advento. Tudo começa com Dave Lizewski (adivinhem só?), um garoto nerd que certo dia se pergunta: Será que ninguém até hoje teve a brilhante ideia de se tonar um super herói na vida real? Após comprar uma roupa um tanto quanto fajuta na internet, ele parte para a vida de vigilante. Com intuitos honrados, o garoto se esforça e, mesmo depois de uma estreia mal sucedida (e bota mal nisso) na vida do combate ao crime, ele vira “hit” na internet após ser filmado enfrentando alguns brutamontes que espancavam um pobre rapaz, mobilizando assim a opinião pública.
Despreparado e fora de forma, Kick-Ass (codinome adotado por ele) quase se dá mal com bandidos barra pesada. Mas na hora certa é ajudado por Hit Girl e Big Daddy, heróis de verdade que sabem lutar, usar armas e agem de forma cautelosa. O problema é que o envolvimento com esta dupla dinâmica acarreta um lado negativo e ele acaba na mira de um dos grandes chefões do crime local. Enganado por Red Mist, ou melhor, Chris D’Amico, filho de Frank D’Amico (chefão da máfia em questão), o herói juvenil vê que sua vida corre verdadeiro perigo. É então que, motivado por seus ideais e também pela possibilidade de continuar namorando a linda Katie, Kick-Ass tem que se virar.
O filme é de Matthew Vaughn, antigo produtor de Guy Ritchie, que tem em seu currículo de diretor o ótimo “Nem Tudo é o que Parece” e o subestimado “Stardust – O Mistério da Estrela”. Capturado pela história em quadrinhos de Mark Millar (criador da obra também adaptada paras telonas “O Procurado”), Vaughn abraçou a ideia do longa de corpo e alma, e o produziu de forma independente, para assim, juntamente com o autor, ter total controle do conteúdo.
Com cenas de violência absurda (como um homem sendo esmagado dentro de um carro de forma brutalmente realista) e abusando do “politicamente incorreto”, o filme é uma amostra de como se contar uma história com prazer e liberdade. Podemos conferir Hit Girl, de apenas 11 anos, praticamente triturando seus inimigos, sendo alvejada a queima roupa pelo próprio pai como parte de um treinamento e muitas outras coisas que não cabem no comportamento de uma garota normal de sua idade.
A direção é excelente, assim como seu roteiro surreal e antenado. Vaughn optou por cenas de lutas limpas, sem imagens sendo jogadas de um lado para o outro. No melhor estilo “Matrix”, enquanto a ação acontece, a câmera desliza suave por entre seus protagonistas, nos colocando em uma posição privilegiada, onde podemos realmente acompanhar quem está matando quem, e como está fazendo isso.
Mas o grande diferencial fica a cargo da edição dinâmica (herança cultuada do cinema inglês de Ritchie) e a trilha sonora, que com certeza é um dos pontos mais fortes, pois é com ela que o diretor passeia pelo humor, drama e momentos tensos de forma tão natural. Além da trilha incidental excepcional, que traz, por exemplo, John Murphy com sua arrebatadora “In a HeartBeat” (tema original do filme “Extermínio 2”) , o longa reúne também uma trilha sonora inspirada, que vai do funkadelic ao rock pop instigante, do punk “Bad Reputation” de Joan Jett & The Blackhearts, a “Crazy” de Gnarls Barkley, de The Prodigy com “ Omen” a Primal Scream com “Can’t Go Back”, e por ai vai, a lista é longa.
E para completar temos um elenco afiado. Aaron Johnson, que interpreta o intrépido Dave/Kick-Ass, foi a escolha certa para protagonista. Apesar de o ator ser inglês, ele se passa por um americano perfeito. Sua existência comum é encarnada de forma exata. Dave é um símbolo de uma geração, e por mais que às vezes ele parece sem graça, sua normalidade acaba sendo um grande diferencial.
Como a encarnação de Adam West, temos Nicolas Cage com seu Big Daddy, que obviamente, mais parece o Batman. Na sua melhor interpretação desde “Adaptação”, o ator consegue alguns créditos após uma sequência de balelas que anda fazendo. Seu Big Daddy é incrível, muito engraçado, por vezes insano, ironicamente atencioso com sua filha, um personagem rico e complexo. Seu modo de falar aos solavancos é hilário, ao melhor estilo do homem morcego das séries dos anos 60.
Hit Girl é um show a parte, com certeza o maior destaque do longa. Interpretada com desenvoltura pela jovem Chloë Grace Moretz, a personagem é uma das forças motrizes da história. No papel do vilão Frank D’Amico temos o sempre eficiente Mark Strong, que consegue se reinventar a cada vilão que protagoniza, e junto a ele está Christoper Mintz-Plasse vivendo o filho que quer ser bandido Chris D’Amico/Red Mist. O ator, que tem vocação para a comédia, se saiu muito bem como este vigilante falsário que fuma alguns baseados enquanto faz sua patrulha rotineira. Entre os coadjuvantes, destaque para os amigos nerds e engraçados Marty e Todd, interpretados por Clark Durke e Evan Peters.
“Kick Ass – Quebrando Tudo” é uma miscelânea de referências dos tempos modernos. Homem-Aranha, Superman, Batman, ao mesmo tempo em que são desconstruídos, são homenageados. Música contemporânea introduzida com classe. Uma sequência de FPS (First Person Shooter) que deixará os “gamers” de boca aberta. Muito diferente dos filmes do gênero, como o interessante “Defendor” (obra com Woody Harrelson de temática semelhante), o filme de Vaughn soube se conectar melhor com seu público, e assim realizar uma obra a ser cultuada. Uma boa oportunidade de conferir o que os novos diretores ingleses são capazes. Que venha “Scott Pilgrim Contra o Mundo”.