Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 08 de maio de 2010

Zona Verde

Paul Greengrass está longe de sua melhor forma neste patriótico filme de guerra. Mesmo assim, ainda supera muita gente apenas com o seu cinema técnico.

Dono de currículo invejável, o diretor Paul Greengrass é conhecido por retratar tramas que misturam com muita eficiência História, política e ação. “Zona Verde” não é diferente. No filme, sobram incessantes perseguições, denúncias de corrupção e tiros, muitos tiros. A Guerra do Iraque, mais especificamente durante o ano de 2003, é o cenário da vez e onde o cineasta volta a utilizar, com mais afinco do que nunca, sua famosa trêmula câmera. O seu ator preferido também compõe o projeto. Na verdade, uma espécie de Jason Bourne é novamente o seu protagonista. E é exatamente por isso que o projeto mais ambicioso de Greengrass passa longe de ser o seu melhor.

Matt Damon retorna como o subtenente Roy Miller, cuja equipe sob sua liderança é responsável por achar armas de destruição em massa supostamente escondidas em solo Iraquiano. Seguindo denúncias anônimas tidas como fontes confiáveis pela inteligência americana, eles caçam qualquer indício que confirme a justificativa do conflito. Nada, porém, é encontrado. Sua luta parece em vão, mas o subtenente não é daqueles que costumam seguir ordens superiores.

Tratando de forma questionável uma denúncia de um cidadão local, Miller acaba se deparando com uma realidade distante daquelas descritas nos jornais americanos. Agora ele precisa vasculhar os serviços secreto e de inteligência escondidos em terra estrangeira para encontrar respostas definitivas que poderão chocar a opinião pública e destruir a imagem do governo americano diante do mundo. O problema é que ele é um mero membro do exército, apesar de o patriotismo guiá-lo a cada nova empreitada.

Constituindo-se como um bom thriller político, “Zona Verde” é um Paul Greengrass meramente técnico. O diretor é tão competente que mesmo quando não faz o seu melhor ainda supera muitos outros profissionais do ramo. Revelado ao planeta com sua obra-prima “Domingo Sangrento”, em 2002, pelo qual ganhou o Urso de Ouro no Festival de Berlim, o cineasta é conhecido por seu estilo documental de cortes rápidos, imagem instável e ritmo incessante. Todas essas características sobram neste filme.

O melhor Greengrass, no entanto, também sabe como poucos manipular os espectadores em favor de uma questão polêmica. Humanizando sua trama, ele gera indignação e impaciência no público, tendo “Vôo United 93” como um dos principais expoentes deste estilo. Se nos dois últimos filmes de Jason Bourne ele soube contornar esse déficit, realizando a melhor franquia de espionagem em anos, em sua mais nova película, o diretor é incapaz de entregar uma fita que agrade tanto comercial quanto artisticamente.

Em parceria com o roteirista Brian Helgeland  (“Sobre Meninos e Lobos”), o cineasta realiza um filme que utiliza os cenários iraquianos apenas como pano de fundo para contar uma história que parece atrasada em sua proposta. O mito das armas das armas de destruição em massa já foi desconstruído há anos, assim como os verdadeiros interesses dos Estados Unidos com a guerra já são de sabedoria mundial. Se lançado há cinco ou seis anos, o filme, definitivamente, teria uma recepção diferente, digladiando com obras como “Fahrenheit 11/9” e tantos outros documentários que denunciaram a vergonha que é este conflito que não parece ter fim.

Paul Greengrass parece rendido a uma fórmula industrial que caricaturiza o povo local e os vilões americanos em favor de um patriotismo que dê vazão a uma história recheada de sequências de ação. Roy Miller é um soldado americano que não mede esforços para se arriscar nos labirintos de Bagdá em prol de uma resposta satisfatória para seu povo, no que desconfia ser uma mentira de proporções astronômicas. Qualquer relação familiar e afetiva é retirada da vida do rapaz, assim como sensações como medo, tristeza e alegria. Ele é, definitivamente, um Jason Bourne com mais memória e menos capacidade atlética.

A parceria com o editor vencedor do Oscar por “O Ultimato Bourne”, Christopher Rouse, continua. E o caos que já instalou em outros três filmes permanece. Se há algo que o diretor consegue repassar para os espectadores por meio de suas técnicas de câmera e proposta de montagem é a instabilidade dessa terra em luta e sem dono. No entanto, há um certo exagero de cenas de perseguições  e tiroteios, e nenhuma delas funciona como deveria. Tecnicamente, o filme acerta na edição de arte e nos efeitos especiais ao reconstruir com perfeição o Iraque.

O elenco não costuma ser a maior atração nos filmes de Greengrass, e aqui não é diferente. Matt Damon é prejudicado pela inexpressão de seu herói. Brendan Gleeson está longe do seu melhor como o representante da CIA Martin Brown. Já Amy Ryan demonstra versatilidade como a inocente jornalista do Wall Street Journal, Lawrie Dayne. Quem rouba mesmo a cena é Greg Kinnear, que pode ousar como o maquiavélico líder da inteligência americana no país, Clark Poundstone.

“Zona Verde”, no entanto, não é o melhor resultado que Paul Greengrass poderia ter obtido ao filmar a Guerra do Iraque. É político, histórico e tem, mais do que qualquer outro de seu filmes, muitas cenas de ação. Mas falta coração para sua história. Serve, definitivamente, como um belo entretenimento, mas diante do que Greengrass já nos apresentou, não traz nada de novo. Quando se é competente, é preciso cobrança.

Darlano Didimo
@rapadura

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