Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 01 de maio de 2010

Tudo Pode Dar Certo

Woody Allen monta uma história que de tão improvável acaba sendo engraçada.

Sem nunca parar de produzir, Woody Allen é conhecido por obras memoráveis, como o recente e badalado “Vicky Cristina Barcelona”, o tenso “Match Point – Ponto Final”, o incrível “Noivo Neurótico, Noiva Nervosa” e por aí vai. E também é conhecido por outras obras não tão memoráveis assim, como “Igual a Tudo na Vida”, “Scoop – O Grande Furo” ou “Celebridades”. Todos sabem que diretores acabam passando por altos e baixos em suas carreiras e com certeza a quantidade de material produzido por Allen deve ser levada em consideração, contabilizando no final um saldo muito mais positivo do que qualquer outra coisa. Neste “Tudo Pode Dar Certo”, o diretor realiza novamente um filme menor, por assim dizer, mas com mais sucesso do que outros.

A história começa com Boris (Larry David) se apresentando para o público (ele literalmente conversa com a plateia). O personagem é um desses caras geniais que até já foi nomeado para o Nobel de Física (mas não ganhou). Com uma concepção de realidade áspera e fria, Boris toca sua vida sem muitas expectativas, com um descaso hilário as relações humanas. É então que ele conhece Melody (Evan Rachel Wood), uma linda caipira americana que cai como por milagre em sua vida. Analisando tudo por um lado cético, o personagem estuda as possibilidades de se unir a uma pessoa tão inusitada, e acaba se rendendo aos encantos da garota. Apesar de muito mais velho, os dois iniciam um relacionamento e acabam se casando (Allen conhece bem este tema).

É então que aparece a mãe da menina, Marietta (Patricia Clarkson), que foi abandonada pelo marido após o mesmo fugir com uma de suas amigas. A mulher, sem ser convidada, entra na vida do casal e faz de tudo para juntar a filha com alguém mais normal. Enquanto elabora planos mirabolantes para acabar com este casamento, ela se descobre como pessoa, inicia uma promissora carreira de artista plástica e passa a viver um relacionamento com dois homens, “Um Ménage à trois muito feliz”, como ela mesma explica.

O pai da menina também aparece após o termino do relacionamento pelo qual largou o casamento. Quando ele, John (Ed Begley Jr.), vê a ex-mulher em outra “frequência”, parte também para o auto descobrimento e inicia um relacionamento com um novo parceiro. Mesmo em meio a muita confusão, tudo parece dar certo, como o próprio título sugere.

Apesar da história incrivelmente insana, a força deste longa está em seus personagens. Larry David, ator experiente que já escreveu para o “Saturday Night Live”, foi um dos criadores do ”Seinfield” e está na oitava temporada de sua série “Curb Your Enthusiasm”, entrega seu Boris com disposição. Ele seria algo como um irmão mais novo de Allen, misturado com o recente e engraçado Sheldon Cooper (da viciante série “The Big Bang Theory”), apesar de mais velho. O personagem é um mar de equações duvidosas sobre a vida e seus motivos, sendo que em alguns momentos tudo se torna tão insuportável que ele acaba pulando por algumas janelas, mas sempre escapa com vida.

Evan Rachel Wood está muito bem como a inocente e simpática Melody. Dona de uma beleza sem igual, a atriz consegue ficar ainda mais encantadora na pele da menina que veio do Mississipi, e que de forma inusitada se mostra uma pessoa muito inteligente, mas nunca perdendo aquele ar de desligada. Patrícia Clarkson está impagável como esta mãe que é uma verdadeira caixinha de surpresas, assim como Ed Begley Jr., que interpreta o pai que descobre qual é sua verdadeira identidade sexual.

Filmada em Nova York, a obra é bem tradicional, com aquele tom leve e costumeiro de Allen. Sendo uma história que claramente é mais um pensamento anabolizado do que uma trama coerente, suas reviravoltas são propositalmente forçadas e isso atrapalha na hora de absorver o filme. Principalmente no fim do segundo ato e início do desfecho, fica difícil engolir tantas mudanças bruscas. O humor está lá, de primeira, especialidade do mestre, mas a enxurrada de informações é que faz com que não levemos nada daquilo a sério.

No final, ironicamente, funciona de sua maneira, mas como disse, sem muitas pretensões. O diretor aparentemente gosta de falar sem ser ouvido algumas vezes, divertindo seu público apenas no momento da projeção, sem levarmos muito daquilo para casa. É claro que este aspecto fugaz sempre chama a atenção dos fãs, que dão um valor maior para obra, mais pelo nome do diretor do que por sua qualidade geral, o que é justo devido à credibilidade conquistada. Mesmo assim vale pelas risadas. Isso é tudo que aparentemente importa para Woody neste caso. Risadas, mesmo que breves.

Ronaldo D`Arcadia
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