Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Estão Todos Bem

O que faz uma “família perfeita”? Com certeza esta é uma resposta que está longe de ser respondida. Mas neste longa, o diretor Kirk Jones, com muita honestidade, tenta nos mostra que uma “família perfeita” é difícil de se encontrar, por isso devemos aprender a valorizar as pessoas que temos.

Para começar, gostaria de citar um fato envolvendo este filme em questão,  que explica de forma simbólica os caminhos que esta história toma. O ex-beatle Paul McCartney, após assisti-lo, se propôs a compor a música “I Want to Come Home”, que acompanha os créditos finais do filme. Inspirado, McCartney foi indicado ao Globo de Ouro, e poderia muito bem ter sido indicado ao Oscar (seria o beatlemaníaco em mim falando muito alto?). Enfim, com certeza esta lenda da música se identificou com filme, talvez por apresentar elementos que façam parte de seu estilo, nuances que variam entre o humor e seriedade, tudo de forma muito interessante.

A história começa nos apresentando Frank Goode, homem que perdeu recentemente a esposa e se vê aposentado, perdido em afazeres domésticos aparentemente banais. Com a intenção de juntar os quatro filhos na mesma mesa,  e assim unir sua família, o pai elabora uma recepção calorosa, compra um bom vinho, uma churrasqueira nova, acessórios para mostrar com orgulho a seus filhos. Mas as coisas não saem como planejado, e todos eles acabam cancelando o encontro devido a vida atarefada que levam. Cada um com seu álibi.

Ele decide então fazer uma surpresa para todos eles, e parte em uma longa viagem. Nesta peregrinação, desaconselhado por seu médico, perguntas e respostas começam a aparecer, o fazendo entender o porquê do distanciamento que sua família acabou tomando. Mesmo com a saúde precária, o homem enfrenta horas de viagem, de ônibus e trens – pois viajar de avião não seria uma boa para os pulmões dele, como disse enfaticamente seu médico – apenas para falar oi a seus filhos e perguntar se estão felizes.

Nesta romaria, encontra rostos abatidos pela vida, e a honestidade que havia entre os filhos e sua mulher parece não existir com ele. Vendo-os rapidamente como as crianças que eram, o homem começa a perceber que nada mais é como antigamente e que para ele é difícil enxergar que seus filhos cresceram e enfrentam dilemas, decepções, rumos mal traçados ou mesmo não esperados.

Mas uma situação em particular atenua a preocupação de todos os irmãos. O filho David, de personalidade mais forte, aparentemente desapareceu de forma inesperada. Frank não sabe de nada, mas desconfia auspiciosamente, assim como todo pai o faria. Em meio a diversos problemas claramente profundos, a tentativa honesta e corajosa do pai ir atrás de seus filhos, gera um resultado positivo, por mais difícil que ele pareça.

O britânico Kirk Jones, que dirigiu “Nanny McPhee”, chama atenção com suas escolhas. De forma muita tranquila, entrega um filme de contrastes, uma união de cinema europeu com a linguagem do cinema novo americano. A obra possui toda a personalidade de um filme indie (independente), mas o elenco, cheio de caras famosas, quebra de forma diferenciada esta percepção. Cenas simples e contemplativas – esteticamente usuais e belas – que são envoltas por uma trilha sonora de primeira, composta por muita música folk. Juntamente a isso temos Robert De Niro em uma atuação edificante, mostrando que algumas escolhas ruins não fazem com que um grande ator perca o interesse por bons personagens. De Niro é sempre De Niro. Para o bem ou para o mal, a força de sua personalidade é sempre um ponto alto a ser usado em sua interpretação.

Entre os filhos, temos Sam Rockwell, ator que recentemente mostrou todo seu talento no incrível “Lunar” (filme de ficção cientifica de baixo orçamento). Em seu currículo estão também os excelentes “Guia do Mochileiro das Galáxias” (onde faz um imperador insano), “Frost/Nixon” e “Confissões de Uma Mente Perigosa”, uma pérola dirigida por George Clooney e escrita por ninguém menos que Charlie Kaufman, não nos esquecendo também do perverso e engraçado “Wild Bill” de “À Espera de um Milagre”. Aqui ele dá vida a Robert, um percussionista erudito que parece satisfeito com sua posição atual, mas incomodado em sentir o descontentamento de seu pai, que esperava mais dele, esperava um maestro, e não apenas um homem que toca tambores.

Interpretando a irmã Amy, temos a belíssima Kate Beckinsale, atriz que está fortemente ligada a franquia “Anjos da Noite”, e tem como seu último filme o fraquíssimo “Terror na Antártida”. Apesar dos títulos de qualidade questionável, a atriz tem potencial e sua personagem acaba sendo bem explorada. Ela se sai muito bem como esta mulher que gerencia uma agência de publicidade e lida com problemas envolvendo seu casamento e o relacionamento de seu marido com seu filho. Como toda boa publicitária, ela é uma mentirosa congênita (Uma pequena brincadeira com os amigos publicitários) e suas inquietações são as mais evidentes, talvez por ela ser uma das mais passionais crias de Frank.

Temos ainda Drew Barrymore, emprestando toda sua simpatia para a filha Rosie, uma dançarina que vive em Las Vegas praticamente escondida. Paralelamente à atenção e carinho evidentes com o pai, ela esconde segredos que exemplificam como esta família está distante, ou pelo menos distante de Frank.

Finalizando, o filme traz uma história simples, se a compararmos a um cinema onde mais da metade dos lançamentos envolve explosões, rapidez e muito retorno financeiro. O longa vai devagar, mostrando a vida de um pai com seus quase 70 anos, descobrindo uma forma de aceitar a vida como ela é. Para ele é complicado ver que as coisas não saíram exatamente como haviam sido planejadas, mas mesmo com desvios quase certos que a vida tem, no final, “Estão Todos Bem”.

Ronaldo D`Arcadia
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