Cinema com Rapadura

OPINIÃO   segunda-feira, 05 de outubro de 2009

Deixe Ela Entrar

Ultimamente, as produções audiovisuais têm sido invadidas por vampiros. Seja pela febre da série de filmes “Crepúsculo” ou pelo reconhecimento do show televisivo “True Blood”, estamos com um vasto acervo moderno de produções do gênero. Como adendo, chega aos cinemas o filme “Deixe Ela Entrar”, cuja abordagem é feita de maneira tão distinta que torna-se difícil defini-lo como vampiresco.

Deixe Ela EntrarAssim que o longa terminou, senti-me anestesiado. É algo que causa claustrofobia e envolve o espectador na atmosfera proposta. O extremo silêncio e frieza com que se trata o filme é algo que imediatamente me remeteu a ideia de “Elefante”, dirigido por Gus Van Sant, que utilizava-se de um incidente para definir sem muitas palavras o que significa a adolescência. Já o primeiro utiliza-se da adolescência para definir o incidente.

As referências entre os filmes parecem claras e caberiam bem em uma coleção que defina a fase do amadurecimento do jovem. Nesse longa acompanhamos a história de Oskar (Kåre Hedebrant), um jovem que sofre de Bullying no colégio e que se cansa dessa humilhação. Procurando meios para revidar, ele conhece Eli (Lina Leandersson), uma garota diferente que dividia características comuns com ele. Após uma série de assassinatos que ocorrem por lá, Oskar começa a observar o quanto Eli é diferente e descobre com ela o amor e a vingança.

O diretor acerta bastante ao conseguir alternar entre as paisagens da fria Suécia e a violência silenciosa do filme. Primeiramente, fotografia interessantíssima acaba por ressaltar esses poucos momentos mais fortes. Os enquadramentos de Tomas Alfredson são inteligentes e valorizam as locações. Mas acima de tudo a maneira com que ele censura a carnificina o torna ainda mais genial, como se aquela fosse a ótica inocente de uma criança.

O roteiro não se prende a falas, mas sim a momentos. Dos mais simples possíveis. A sutileza dá o tom. O título da obra é realçado constantemente durante o filme, a cada vez que se põe alguma barreira material, onde na verdade representam a barreira imaterial, entre Oskar e Eli. A forma que é filmada a relação de Oskar com os pais mostra o quão é solitária essa fase do amadurecimento. Os elementos vampirescos que são apresentados na trama correspondem ao senso comum das pessoas, mas novamente a forma com que são mostrados que o torna singular.

A atuação da dupla de protagonistas tem uma química ótima. Eles retratam o primeiro amor de forma madura, coisa que não vemos por aí, e o embate psicológico relacionado à aceitação de cada um para com o outro é bem trabalhado.

O longa provavelmente não é de ampla aceitação do grande público, pelo ritmo que ele funciona, por ser longo e claustrofóbico, e isso não é agradável. Ele dialoga por meio de analogias e metáforas e preza pela introspecção. Talvez nem tenha o charme que os vampiros exigem, mas a mitologia está lá. Contudo, o filme é tão especial assim por mostrar algo que já vimos antes, mas aqui com uma fórmula inversa. Ele usa o monstro para explicar o ser humano.

Amenar Neto
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