Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quarta-feira, 08 de julho de 2009

Budapeste

Baseado na premiada obra de Chico Buarque, “Budapeste” mostra a aventura de um estrangeiro que decide se aventurar pela cultura de outro país, no caso a Hungria. Mas o filme está longe de se resumir a apenas isso, já que mergulha fundo na mente de um escritor complexo, cheio de ressentimentos e angústias.

José Costa, o narrador, é um ghost-writer, escritor especialista em escrever para terceiros. Para fugir de sua monótona vida, ele escreve biografias como a do alemão Kaspar Krabbe (Antonie Kamerling) e suas aventuras amorosas no Brasil. O interessante é que muitas vezes ele se coloca na pele do alemão como se aquele fosse um real desejo seu. Quando ele retorna do Congresso de Escritores Anônimos, em Istambul, uma ameaça de bomba faz com que seu vôo aterrisse em Budapeste, na Hungria. É o suficiente para ele se apaixonar pelo idioma daquele país e passar a vivenciá-lo até em seus pensamentos, o que acaba prejudicando seu casamento no Brasil, tornando o escritor mais angustiado ainda.

As impressões iniciais são as melhores possíveis. A bela fotografia dita o ritmo da obra principalmente com as imagens do território húngaro, acompanhadas de uma boa trilha sonora e belas palavras, uma verdadeira poesia como disse José Costa. Mas não demora muito para aparecer os sentimentos bem próprios dos melhores escritores, como a angústia de não saber como transformar sua monótona vida em poesia, as incertezas que tomam boa parte de sua mente, o ressentimento de não ser como a grande maioria das outras pessoas e, por isso, muitas vezes não entendê-las.

O filme está longe de atingir a linearidade, o que é bem coerente com a obra escrita. Dessa forma, tudo se entrelaça na produção. A biografia do estrangeiro mais parece com uma auto-biografia almejada, a história que antes era escrita agora é vivenciada no vídeo, a tão conhecida e raramente usada metalinguagem. E assim como na obra escrita, a ousadia não tem limites. Ela está nas fortes cenas de sexo, nos confusos pensamentos do escritor, ou até mesmo no roteiro que abusa da mistura de idiomas e culturas. Um espetáculo.

A direção de Walter Carvalho, que aqui faz seu primeira direção em longa-metragem sozinho, e apresenta muitas falhas, principalmente nas tomadas feitas em território húngaro. Na cena em que sua namorada Kriska (Gabriella Hámori) sai com raiva de um lançamento de mais um livro escrito por José Costa em que este não recebe a autoria, demosntra a falta de experiência do diretor e a cena acontece da forma mais forçada possível.

Na pele do ghost-writer está o modesto Leonardo Medeiros que neste papel mantém o tom certo e consegue ser bem convincente. Giovanna Antonelli é sua esposa Vanda, uma apresentadora de telejornal frustrada por não possuir uma vida convencional. Ela que é uma das melhores atrizes brasileiras, aqui, também tem um bom desempenho principalmente quando demonstra sua frustração devido a sua vida amorosa ao lado do marido.

A fotografia de Lula Carvalho é sensacional. As cenas feitas na Hungria são um espetáculo visual. Budapeste é amarela como diz o narrador logo no início da obra. É interessante ver o contraste existente nas cenas feitas em Budapeste e no Rio de Janeiro. As cenas de nudez, embora demasiadamente exploradas, também são bem eficientes.

A metalinguagem utilizada na obra é bem interessante. São as palavras que representam a vida. É o filme que representa o livro. É o autor que representa um personagem. Esse ousado recurso é bastante eficiente em obras como esta, em que a profundidade da história não é tão simples de ser explorada. Esse recurso consegue demonstrar a complexidade da trama.

"Budapeste" é uma obra que mostra a angustiante vida de um frustrado escritor que, além de não ter seu trabalho reconhecido, demonstra não saber dominar os contrastantes pensamentos que ora em português, ora em húngaro, e misturam-se às belas paisagens e sentimentos que transformam o filme em uma verdadeira poesia. O filme que merece ser apreciado por todos.

Marcus Vinicius
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