Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 04 de janeiro de 2009

Bolt – SuperCão

Divertido e empolgante, "Bolt - Supercão" pode não ser especialmente original quanto a seus temas, mas tem carisma o suficiente para subsistir por si só e se tornar um sério candidato a ser um dos filmes de maior bilheteria destas férias.

A história deste novo filme em 3D da Disney começa em um pet shop comum, no qual a garotinha Penny acaba de comprar seu cãozinho, batizado de Bolt. Alguns anos depois, ao lado de sua dona, agora uma adolescente, o cão passou a ser mais que o melhor amigo da garota, tendo sido modificado pelo pai desta, ganhando supervelocidade, superforça, visão de calor e um super latido. Juntos, Bolt e Penny tentam resgatar o progenitor dela, seqüestrado pelo vilão Dr. Calico – também conhecido como o homem de olho verde.

Bom, ao menos é isso que Bolt pensa. Na verdade, ele é o astro de um dos programas mais vistos na TV americana, com toda sua vida aventuresca existindo apenas na TV e em sua imaginação, embora os laços entre ele e Penny sejam reais. No entanto, o diretor do programa, pressionado pela emissora, resolve apimentar um pouco as coisas, criando um gancho entre um capítulo e outro, separando o cão de sua dona.

Quando, por acidente, Bolt acaba indo parar pela primeira vez fora do estúdio, mais precisamente do outro lado do país, crente e consciente de que é um supercão, ele vai passar por uma odisséia para retornar para junto de sua Penny, recrutando meio que a força a sarcástica gata de rua Mittens, que tenta fazer com que o cachorro entenda sua verdadeira natureza. No caminho, a dupla ainda recebe a ajuda do hamster Rhino, um dos maiores fãs do astro animal e que acredita piamente que as aventuras do amigo são reais.

Logo de pronto dá para notar que "Bolt – Supercão" é influenciado diretamente influenciado por duas fitas bem conhecidas do público. Uma é o primeiro grande sucesso das animações 3D, "Toy Story", com o convencimento do protagonista-título de que é mais do que ordinário enquanto outra personagem tenta convencê-lo da verdade, em uma relação bastante similar àquela entre Buzz Lightyear e Woody no filme da Pixar.

Já a outra influência é de "O Show de Truman – O Show da Vida", fita na qual um homem foi criado dentro de um programa de TV, tendo em comum, inclusive, o jeito excêntrico dos diretores das fitas dentro das fitas, com ambos mantendo seus protagonistas em mundos que todos os outros sabem ser irreais pelo bem de suas respectivas produções artísticas. Aliás, o nome da humana do cão-astro, Penny, é uma referência velada à Penélope da obra imortal "A Odisséia".

Apesar de ter em sua origem obras alheias, o carisma do cast virtual de "Bolt – Supercão" acaba ganhando a audiência, tanto por seus looks quanto pela vivacidade. O personagem-título, além de ter um visual perfeitamente criado pela Walt Disney Animation Studios, é simplesmente adorável, sendo energético e extremamente leal, se diferenciando do já citado Buzz Lightyear por conta da lealdade prévia em relação a Penny.

A gatinha Mittens funciona como o perfeito contraponto ao protagonista, com seu jeito cínico e sarcástico, tendo uma história bem sofrida por trás. Até mesmo visualmente ela contrasta ao cãozinho, aparentando maltratada e suja, enquanto Bolt não tem um pêlo fora do lugar. Por sua vez, o hamster Rhino é o menos desenvolvido do trio, com seu visual chamando pouca atenção, mesmo com sua bola de exercícios, com sua personalidade tentando representar, sem muito sucesso, a dos fanáticos por franquias famosas.

O núcleo humano é relativamente estilizado, sem ter muitos compromissos com a realidade. Penny, como não poderia deixar de ser, é a mais detalhada, até por ter mais tempo em cena, contando com figurinos diversos e jeito de menina comum – apesar de que nem na Disney uma estrela-mirím seria tão comportada. Já o Agente da garota conta com trejeitos mais contidos e malandragem característica do estereótipo da profissão.

O visual da película também é adequado, com uma fotografia virtual bastante caprichada, a iluminação e paleta de cores variando de acordo com o cenário e a situação. É bem interessante notar a cinematografia mais puxada para o tom azulado nas cenas que mostram as desventuras de Bolt em sua série de TV e as cores mais quentes quando o cão e seus amigos passam pelos estados do meio-oeste dos EUA em sua jornada.

Além disso, os diretores Byron Howard e Chris Williams foram bastante hábeis na parte técnica do filme, que possui um ritmo extremamente ágil, um visual agradável, além de seqüências de tirar o fôlego. Logo em sua segunda cena, a fita engata com uma cena de ação que não deixa nada a desejar em relação a muitas fitas de heróis ou policiais no mercado. Williams, aliás, também é co-roteirista do projeto ao lado de Dan Fogelman, ambos tendo já certa história na Disney e na Pixar. O primeiro trabalhou no texto de "Mulan", enquanto o segundo foi um dos escritores de "Carros".

Na dublagem nacional, como não poderia deixar de ser, quem domina a cena é o veteraníssimo Mário Jorge (o Burro da franquia "Shrek"). Considerado a voz oficial do ator John Travolta aqui no Brasil, nada mais natural do que ele emprestar seus talentos à Bolt, tendo em vista que Travolta dublou o personagem na versão original. Como sempre, atores globais têm de estar no elenco de dubladores, com Maria Clara Gueiros interpretando Mittens e Leandro Hassum como Rhino.

Embora não comprometam a ótima versão brasileira da fita, ambos os profissionais soaram deslocados no ofício, principalmente Gueiros, que não encontrou um tom perfeito para a personagem. A boa música-tema do filme, "I Thought I Lost You", foi deixada em sua versão original, interpretada por John Travolta e Miley Cyrus. A cantora juvenil, aliás, é um dos atrativos para aqueles que optarem por assistir ao filme nas cópias legendadas, tendo em vista que ela também empresta sua voz à Penny. Outros nomes de peso no cast de dubladores americanos incluem Malcolm McDowell e James Lipton.

Em suma, "Bolt – Supercão" é uma fita tecnicamente impecável e conta uma história que, mesmo não sendo das mais originais, traz personagens cativantes e carismáticos o suficiente para segurarem a onda e fazerem da película uma candidata a se tornar um dos filmes mais vistos neste período de férias escolares.

Thiago Siqueira
@thiago_SDF

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