Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 25 de maio de 2008

Quebrando a Banca

"Quebrando a Banca" é apenas mais um filme de cassino relativamente divertido e facilmente esquecível. Poderia até ter sido mais interessante, se apostasse menos no moralismo.

Cassinos são um prato cheio para o cinema. A sétima arte já explorou seu funcionamento, assaltos a vários destes e, é claro, as apostas. Fora que não há como se sentir mal em se divertir vendo um cassino afundar, pois são instituições especializadas em tomar o dinheiro das pessoas. Isso nos leva a esse mediano "Quebrando a Banca", adaptação do livro de Ben Mezrich intitulado "Bringing Down the House: The True Story of Six MIT Kids Who Took Vegas for Millions" que, por sua vez, é baseado em uma história real.

No longa, após um mais que dispensável prólogo, somos apresentados a nosso narrador-protagonista, Ben Campbell (Jim Sturgess). Um gênio matemático, estudante modelo, bom filho e com vida social praticamente inexistente, Ben está se graduando no MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts) com honras, mas deseja cursar medicina em Harvard, algo que lhe custaria cerca de 300 mil dólares.

Sem ter esse dinheiro e com poucas chances de conseguir uma bolsa, ele acaba se juntando à equipe do Prof. Micky Rosa (Kevin Spacey) para contar cartas em Vegas nas mesas de Black Jack (ou 21) nos fins de semana, faturando milhares de dólares em cada viagem. Enquanto isso, tenta conquistar sua companheira de equipe – e objeto de desejo – Jill Taylor (Kate Bosworth). No entanto, o sucesso do grupo acaba chamando a atenção de Cole Williams (Laurence Fishburne), um consultor de segurança durão e extremamente inteligente, que está prestes a ser substituído por um programa de reconhecimento facial.

O filme nos martela a todo o momento que contar cartas não é algo ilegal, mas que vencer o sistema é, daí a perseguição de Williams ao time do protagonista, que recorre a vários disfarces em suas idas aos cassinos. No entanto, no decorrer da projeção, existem diversas descaracterizações dessa premissa de legalidade junto aos personagens, que simplesmente não fazem sentido na história.

Ben se juntou ao grupo de Rosa para conseguir fundos para custear o curso de medicina, mas acaba se envolvendo demais no jogo. Até aí, tudo bem. No entanto, o próprio personagem sabe que está participando não de um jogo de azar, mas de probabilidades, algo que ele joga para o alto depois de uma discussão boba com seus amigos nerds, que o acusam de tê-los abandonado.

Ora, tal briga não seria suficiente para deixar uma pessoa racional como Ben chateada por meros minutos, quanto mais por dias, muito menos ao ponto de arriscar seu futuro e seus lucros, o que acaba com a linha lógica da trama. Aliás, vamos e convenhamos, Ben estava conquistando legalmente (como o próprio filme não cansa de afirmar) uma vida de festas, baladas, dinheiro, além de estar se divertindo ao lado da mulher que amava. Trocar uma competição de robótica por isso com certeza não seria uma dúvida para ninguém.

Outro detalhe é a inserção de um background na vida de Jill que não serve para nada. Em certo diálogo, a garota afirma que seu pai perdeu muito dinheiro apostando nas mesas de 21, algo que só serve para criar um contraponto inútil para a história de Ben. Além disso, a exceção dos quatro personagens principais, os coadjuvantes são tão ralos quanto pires, jamais gerando o menor interesse para o espectador.

No elenco, Jim Sturgess consegue cativar o espectador como o protagonista. Se o filme não desaba após a lambança absurda que toma conta deste após o segundo ato, é por conta do jovem ator, que defende seu personagem com convicção. Kate Bosworth também aparece muito bem em cena. A linda atriz realmente é um colírio para os olhos e não se sai nada mal como Jill, com seu relacionamento com Ben evoluindo de maneira natural – a ótima química entre Sturgess e Bosworth ajuda muito nesse ponto.

Kevin Spacey começa por cima no filme, dando a desenvoltura certa para Micky Rosa. No entanto, após o segundo ato, o personagem acaba se transformando praticamente em um Lex Luthor, acabando com o clima de canalha simpático estabelecido no início da projeção. Sim, sabemos que Rosa é ganancioso, mas não que seria estúpido o suficiente para arriscar o controle de sua equipe e sua principal fonte de renda. Já Laurence Fishburne só precisa aparentar ser inteligente e bruto, algo muito abaixo do que este ator tem a oferecer nas telas.

O diretor Robert Luketic até que surpreende em "Quebrando a Banca". Vindo de filmes absolutamente descartáveis como "A Sogra", Luketic se sai relativamente bem aqui, mostrando ter um bom tino visual. O cineasta aproveita bem o clima que um longa de cassino deve ter, se utilizando de um recurso narrativo bastante efetivo para demonstrar os códigos utilizados pelos jogadores, além de dar o tom certo nas cenas que enfocam as partidas.

Para mostrar o clima dos cassinos e clubes de Vegas, Luketic teve a ajuda do competente diretor de fotografia Russell Carpenter, que oferece uma cidade do pecado muito bem iluminada, com cores fortes, contrastando com a frieza dos cenários do MIT. A montagem, que ficou por conta de Elliot Graham, escorrega no equivocado prólogo, mas demonstra força durante o restante do filme.

Possuindo falhas óbvias de roteiro no final de seu segundo ato e forçando uma reviravolta na conclusão da narrativa, "Quebrando a Banca" até que diverte, mas poderia se sair melhor se fosse menos moralista e investisse mais no cinismo que a cidade de Las Vegas traz.

Thiago Siqueira
@thiago_SDF

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