Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quarta-feira, 15 de agosto de 2007

Escorregando Para a Glória

Mais um filme ao melhor estilo Will Ferrell. “Escorregando Para a Glória” é realmente ruim, mas como o filme não se coloca em nenhum momento como algo que vá revolucionar a história do cinema, vale a pena assisti-lo e curti-lo como uma comédia trash.

Quando falo “mais um filme ao melhor estilo Will Ferrell”, aqueles que acompanham a carreira desse ator podem entender. Para os que não, eu explico. Ferrell é daqueles atores que até tem talento para um determinado gênero, nesse caso, a comédia. Porém, algo move o comediante a aceitar muitos projetos bizarros, por mais que estejam em sua área. Não é só no caso de Ferrell que isso acontece, afinal Jim Carrey já participou de filmes como “Debi & Lóide” e “O Pentelho”, mesmo tendo uma fama de grande comediante. Ben Stiller (que nesse filme está como produtor) é outro que já migrou de clássicos como “Entrando Numa Fria” para bizarrices ao estilo de “Heróis Muito Loucos” – que muito se assemelha com “Escorregando Para a Glória”, salvo a mudança de trama. O problema de Ferrell, todavia, é que ele exagera em escolher esses tipos de papel. Parece que ele vê alguns nomes que gosta na equipe técnica, algumas situações inusitadas do roteiro e acaba aceitando sem pensar muito. O fato é que o ator talvez seja hoje o símbolo-mor da comédia trash. Há quem goste. Há quem não.

“Escorregando Para a Glória” é um novo meio de encaixar Ferrell em papéis, no mínimo, estranhos para uma pessoa que mede 1,92m, tem uma cara que só de olhar já dá para rir e sem falar no jeitão de rockstar. Depois de aparecer como piloto em “Ricky Bobby – A Toda Velocidade” (o qual também roteirizou), personagem de um livro em “Mais Estranho que a Ficção” e da paródia “O Império (do Besteirol) Contra-Ataca”, chega a vez do ator patinar. Melhor ainda: patinar no gelo como um competidor da patinação artística.

Na trama do filme, Chazz Michael Michaels (Ferrell), um patinador agressivo e inovador, se coloca como o maior adversário de Jimmy MacElroy (Jon Heder, de “Escola de Idiotas”) na busca do tão sonhado ouro. MacElroy foi criado com todos os luxos depois de ser adotado por Darren Jimmy (William Fichtner, o Agente Mahone do seriado “Prison Break”), um dos maiores empresários do esporte. Chazz, por outro lado, é um viciado em sexo que gosta de estar sempre no centro das atenções, o que não o tira o título de um dos melhores patinadores ao lado de Jimmy. É tanto que em uma competição ambos empatam na disputa pelo ouro, brigam na frente de todos e acabam sendo banidos da patinação artística na categoria solo masculina. Reviravolta: ambos voltarão a ativa como uma dupla e é aí que o filme ganha contornos.

Nada de surpreendente há nesses contornos. É um filme simples, de trama simples, com várias referências a famosos filmes hollywoodianos. Na verdade, é mais um projeto onde os envolvidos se divertem fazendo cinema, sobretudo Will Ferrell. Para deixar isso bem claro, tente enxergar isoladamente da trama a cena em que Chazz corre na esteira tendo o personagem de Jimmy sentado a uma mesa próxima. Além de ter ficado claro que essa foi uma cena gravada sem pretensão alguma de enriquecer o filme, os atores se divertem nos seus papéis e, consequentemente, Josh Gordon e Will Speck se divertem em dirigi-los. Isso fica claro mais de uma vez. Outro exemplo é uma passagem que Jimmy fica perguntando sobre as tatuagens de Chazz. Brincaram até com os quilinhos a mais de Ferrell nessa cena.

Essa de brincar com os trejeitos dos atores também não foi somente uma vez. Praticamente todos tiveram seus momentos. A própria atuação de Jon Heder é uma autoparódia. O ator ainda em crescimento no cenário da comédia é taxado de ser um rapaz singelo, digamos assim. Nada melhor do que curtir com as pessoas que dizem isso do que fazer um personagem de voz aveludada, maneirismos afeminados, mas que conquista a mocinha da trama. É um verdadeiro “cala a boca” para muitos. A barriga de Ferrell foi colocada como chave da piada mais de uma vez. Uma delas, como dito, foi na cena das tatuagens, a outra foi no continuar desse momento quando o ator faz uns movimentos estranhos de barriga, como se estivesse fazendo um alongamento localizado. Tal como o filme: bizarro. Sem dúvidas, essas cenas estão aí para agradar aqueles de riso fácil ou pessoas em um momento desprendido da seriedade, chamemos assim – eu fui um desses, mas não durante toda a projeção.

Quanto às referências, aA principal delas, e mais engraçada, é para com a franquia 007, mais precisamente ao filme “007 – Um Novo Dia Para Morrer” – um dos filmes da fase 007/Pierce Brosnan com um dos desfechos mais absurdos. Em “Um Novo Dia Para Morrer”, James Bond protagoniza uma cena fugindo de vilões. Normal até aí. O fato é que Bond estava esquiando enquanto seus vilões estavam de jet-ski. Em “Escorregando Para a Glória” a referência é clara quando Chezz foge de Stranz Van Waldenberg (Will Arnett, de “Férias no Trailer”), não pelo equipamento que usavam, mas pela atuação de ambos e a trilha sonora. O mais interessante, porém, é a outra referência dentro da referência. Em um close no rosto de Stranz, ele está penteado (leia-se: calvo e cabelo para trás) tal como o Agente Smith de “Matrix” e aquela risada de canto de lábio do personagem é prontamente copiada por Arnett.

Tirando essas referências que farão alguns rirem e algumas passagens solo de Will Ferrell, o filme é muito descartável para o âmbito das comédias. Eu disse “das comédias”! Isso quer dizer que, para o gênero de comédia trash, aí sim ele é um pedido interessante. Não mais do que isso, porém.

Raphael PH Santos
@phsantos

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