Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quarta-feira, 20 de junho de 2007

Invasor, O

Com fotografia, trilha sonora, roteiro, direção e atuações em alta, é impossível julgar mal a película. Bem como é dificílimo escolher o ponto forte da produção brasileira "O Invasor". Digamos que o filme mantém um excelente ritmo em todos os seus elementos do começo ao fim.

O que o cinema nacional mais precisa é manter uma linearidade para com seus filmes de gênero. Aqui e acolá um longa estoura no âmbito mundial, porém, infelizmente, ainda nos falta manter uma boa média. "O Invasor" é um desses estouros acima da média, onde a firmeza da produção já é afirmada desde os primeiros minutos, quando se coloca no âmbito do gênero policial/drama, propondo-se a prender a atenção do espectador.

A história gira em torno da façanha ambiciosa de Gilberto (Alexandre Borges) e Ivan (Marco Ricca). A dupla, a fim de ascender suas ações de sócios na construtora a qual dirigem, manda assassinar Estevão (George Freire), o sócio majoritário da empresa. Entretanto, o matador contratado começa a fazer chantagem com os dois contratantes e, como se não bastasse, entra na vida de Marina (Mariana Ximenes), filha de Estevão, que também perdera a sua mãe em tal crime encomendado.

Os primeiros minutos de "O Invasor" já são de acertos. Em vez de perder tempo aprofundando personagens ou tentando explicar algo da história, já se coloca como suspense. Fácil observar isso, pois na cena em que Gilberto e Ivan vão contratar o matador, o direto Beto Brant nos coloca na pele de Anísio (Paulo Miklos) com a câmera em primeira pessoa enquanto há a negociação da morte. Sem dúvidas, essa tirada é um recurso literário de começar a história com algo que nos faça prender a atenção, que nos crie expectativas e dúvidas. O bom é que não ficamos presos só pelo começo, pois, com o passar dos minutos e um correto aprofundamento da história, vamos nos apegando mais e mais à celulose.

Depois de sermos apresentados à trama central e aos personagens, eis que as atuações começam a tomar conta. O primeiro destaque vai para Paulo Miklos, integrante da banda Titãs, que faz sua estréia no cinema. Realmente foi surpreendente ver o músico tão bem em um papel tão interessante logo na sua estréia e logo para o cinema. É fato que ele comete algumas falhas, mas nada que comprometa o trabalho final. Pelo contrário, haja vista que ele rouba várias cenas e, em uma cena solitária, tira onda de Robert De Niro em "Taxi Driver" ao se encarar no espelho fazendo alguns gestos.

Quem também demonstra estar muito bem, inclusive quando ao lado de Miklos, é Mariana Ximenes. Acostumada com os papéis globais de mocinha, ela foi astuciosa em seu papel de garota rebelde, que não está pouco se importando com as imposições de uma sociedade conservadora. Sem dúvidas, foi preciso coragem para aceitar tal papel interpretado com pulso forte pela atriz. Ela protagoniza cenas picantes e complicadas, como usar drogas e se relacionar com mulheres. Nota-se aí, como também na atuação de todo o elenco, o manejo criterioso de Beto Brant para com seus atores.

Malu Mader interpretando a misteriosa Cláudia, mesmo estando em pouco tempo em destaque, esbanja toda sua sensualidade. Note-a, sobretudo, na cena de frente para o mar juntamente com Marco Ricca. Por falar nele, é outro que pareceu muito a vontade no papel. O ápice da atuação de Marco é observado na cena onde, depois de ter batido o carro, seu personagem cambaleia desorientado por uma periferia. Logo depois, como se não bastasse a brilhante atuação anterior, dá uma de desajustado sem rumo ao falar diretamente para a câmera. Alexandre Borges, com seu personagem Gilberto, mantém a média das atuações.

A câmera, mais de uma vez, se porta como um real personagem. Muitos são os enquadramentos diferenciados – que podem parecer estranhos a um "olhar leigo". Além disso, Beto ainda trabalha sua direção com a tal da câmera livre dando um show à parte – diga-se de passagem, esse recurso às vezes é completamente mal usado no tão querido cinema hollywoodiano. É como se nós estivéssemos assumindo um papel no filme, enquanto estamos simplesmente assistindo-o.

Assim como as atuações e a direção de Beto, o roteiro – também assinado por ele, Marçal Aquino e Renato Ciasca – desempenha papel fundamental no projeto. Prendendo-nos da maneira certa como pede um real filme de gênero (no caso, gênero policial), apresenta-se bem amarrado com começo ao fim. Apesar de amarrar todas as pontas, até as mais simples, ele se demonstra bastante inteligente e não zomba da interpretação do espectador minuto algum.

Para completar, fotografia e trilha sonora andam lado a lado. O filme é ambientado ora na zona rica e média de São Paulo, ora na zona periférica e a trilha segue muito bem todo esse vai-e-vem de locações. O rap predomina, é tanto que o falecido cantor de rap Sabotage até faz uma participação especial em uma das várias boas cenas que Paulo Miklos protagoniza.

"O Invasor" passa longe de ser um filme descartável. Pelo contrário, é um dos melhores filmes de gênero no cenário nacional. O longa vale a pena ser visto e revisto.

Raphael PH Santos
@phsantos

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