Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 30 de julho de 2006

Viagem Maldita

"Viagem Maldita" se resume praticamente a sangue jorrando, miolos aparecendo, gente com medo, tensão e nojo. Drama, terror, horror, suspense e, acima de tudo, bastante trash. Assista-o preparado para ver atrocidades e cenas de provocar refluxo.

A refilmagem de "The Hills Have Eyes" de 1977 finalmente chega ao Brasil depois de ser adiada algumas vezes. O longa conta a aventura de uma família americana aparentemente comum que viaja no país e decide atravessar o deserto do Novo México, mas o trailer no qual estavam quebra misteriosamente no meio do nada e uma série de acontecimentos estranhos começam a ocorrer com a família. O que o grupo não esperava é que no misterioso deserto outras pessoas estariam vigiando-o e, ainda por cima, com a ânsia de matá-lo, motivo que, claro, é revelado no decorrer da história.

Uma história basicamente fácil de entender e sem muitas novidades. Alexandre Aja e Grégory Levasseur foram os responsáveis pela remontagem do roteiro original para trazer o longa à tona e chocar os espectadores. Os primeiros minutos de filmes são os mais tensos por ainda não conhecermos os vilões da história e não termos a idéia do perigo que causarão mais adiante. A movimentação desgovernada da câmera, a respiração intensa de seres desconhecidos e a angústia da família perdida são os principais responsáveis por causar incômodo à primeira vista aos espectadores. A sensação de perigo foi passada de forma competente e intensa na primeira metade da trama, mas com o desenrolar dos fatos e a mostra dos vilões deformados, tal sensação vai perdendo força e nos vemos apenas alvos de sustos estereotipados e clichês de certa forma irritantes. Infelizmente a tensão que o público adquiriu no começo vai diminuindo e o que era de terror/horror/suspense/trash abre possibilidades até para a comédia, que se junta à forma trash de ser e tira até algumas gargalhadas daqueles que gostam do gênero e se divertem com as mortes bizarras e com os personagens geralmente assustadores e nojentos.

Alexandre Aja assumiu a direção com competência, conseguindo se render às inúmeras possibilidades de ângulos e à câmera solta, captando possíveis movimentos dos misteriosos vilões e transportando o espectador àquele ambiente deserto e medonho. É difícil encontrarmos filmes de teor trash que dê para perceber uma preocupação em ter uma direção notável sem cair na liberdade imatura que os diretores acham que precisam seguir quando o filme é feito só para assustar e mostrar muito sangue. Aja vai além, tirando planos únicos do deserto e fazendo tomadas ímpares que abrilhantam, se é que pode-se dizer assim, algumas das mortes do filme. Mortes que não têm pena de mostrar sangue derramando, pedaços de corpos espalhados, miolos expostos e apelando até para a sensibilidade do público quando põe em perigo a criancinha da família, mesmo não saindo dos clichês, mas que incomodou e, particularmente, me deixou desgostoso, assim como a trilha sonora que pode ser definida conscientemente de tosca e irritante. A produção de Wes Craven foi um fator essencial para que diferenciasse Viagem Maldita de qualquer outro filme trash e da categoria B. Depois de assinar filmes como o bom "Vôo Noturno" e o inferior "Amaldiçoados", Craven teve mais espaço para interferir na trama e nos dar momentos horripilantes de tensão.

As atuações não merecem Oscar, claro, mas Framboesa de Ouro também não. É fato que a maioria dos personagens conseguiram convencer que estavam aterrorizados com todos os acontecimentos, mas já no final, o roteiro consegue imbecilizar o grande herói Doug, personagem de Aaron Standford, fazendo-o praticamente indestrutível. A arma na mão do novato Dan Byrd, que interpretou o caçula da família, parecia tão bem punhada que fez do menino uma terrível máquina de raiva e vingança. Pena que seu personagem seja superficial, pois Byrd tem uma grande capacidade cênica. Outro destaque também é para Emilie de Ravin, até então conhecida como a Claire do seriado "Lost". A moça aparentou maturidade e sua expressão facial foi a chave para o sucesso de umas das cenas mais agonizantes de todo o longa e de uma forma geral, o elenco de apoio não tem muito espaço para se destacarem atuando, mas também não deixam margem para grandes críticas.

Rico em clichês e imagens fortes e nada digeríveis, "Viagem Maldita" não tem medo de arriscar e por isso tem enfrentado a alta censura que tem sido imposta. Mas não é para menos. A partir do momento que decide-se fazer um filme forte e chocante, tem que estar preparado para a censura e inclusive para faturar pouco, já que nem todos gostam de filmes do gênero e ainda é proibido para menores de 18 anos. De qualquer forma, é um prato cheio para os admiradores de tosquices que, inegavelmente, provocam momentos de pura angústia e sustos leves, culpa do áudio pesado. Enfim, "Viagem Maldita" não veio para fazer história, mas também não ficará despercebida. Adequada para o gênero, apelativa e forte, a película é uma boa opção para quem quer um entretenimento sem compromisso e que certamente não vai causar reflexões depois que o 'the end' aparecer. E o mais importante: não levem a pipoca para não passarem mal e quererem sair correndo da sala para o banheiro.

Diego Benevides
@DiegoBenevides

Compartilhe

Saiba mais sobre