Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 20 de julho de 2006

Lula e a Baleia, A

A Lula e a Baleia não é um filme para muitos. É um roteiro original baseado numa situação caótica e que muito acontece: a dificuldade da separação e os problemas que isto desencadeia nos filhos.

Baseado na infância do próprio diretor, que também assina o roteiro, Noah Baumbach, o filme retrata os problemas que uma família enfrenta quando os pais se separam. O patriarca, um autor que outrora fora conhecido e cheio de pompas, agora tenta viver nas chamas apagadas de sua fama, embora não saiba lidar com a coxia da vida literária, enquanto sua mulher começa a escrever livros. O casal tem dois filhos, nos quais sempre incutiram o amor pela literatura, quer gostem ou não. A vida segue aparentemente bem alicerçada até o momento em que os pais resolvem se separar, depois de anos de tentativas para se manterem unidos. A partir daí, os problemas que antes não eram tão visíveis (só aos olhos do patriarca) afloram e junto com eles afloram a "rebeldia" dos filhos.

Com personagens marcantes e muito elemento inserido em gestos, olhares, pequenas frases, o filme traz excelentes atuações por parte de todos os atores (Jeff Bridges, Laura Linney, Jesse Eisenberg e Owen Kline). Aliás, ponto forte e principal sobre o qual o filme inteiro é construído. Um patriarca que não conversa com seus filhos, que acha que a vida se faz de livros, que qualquer "filistino" é um monstro. Pena o personagem de Laura Linney não ter tanta presença como os outros três personagens masculinos, mas acredito que, como o filme fala de problemas, a única que ainda consegue viver sua vida depois da separação é Linney.

A presença das nuances do filme estão até mesmo no nome. Fica claro para nós, quando o personagem de Jessé Eisenbeg, em conversa com um psicólogo, fala sobre uma peça no museu de história natural de Nova York, onde há uma grande réplica de uma luta pela vida entre uma lula gigante e uma baleia. Naquele mesmo momento, a sua explicação de que sempre fechava os olhos para não ver, por causa do medo, e que, mais tarde, antes de dormir, quando conversava com a mãe, e essa lhe explicava o que tinha visto, ele passava a achar um pouco menos aterrorizador e mais interessante. Uma alusão ao momento em que está passando durante a separação onde, mesmo com medo, fechando os olhos, ele sabe que conseguirá atravessar por esse momento. Uma alusão que mesmo nos momentos difíceis, haverá dias ensolarados.

O filme não traz nada de surpreendente na direção, ou mesmo trilha ou qualquer parte técnica, mas o surpreendente mesmo está nas atuações. Aliás, é um erro dizer que não traz nenhum ônus na direção, já que grande parte das atuações se devem à firmeza do diretor, e nesse quesito Noah Baumbach está de parabéns.

E não estranhe se ao terminar de assistir você achar estranho, sentindo uma sensação de que a história não terminou. Ela realmente não terminou. Ela continua em cada família que se separa, desde 1986 (época do filme) até os dias atuais, e continuará acontecendo.

Leonardo Heffer
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