Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 30 de abril de 2006

Transamérica

Um filme que usa todos os elementos de enredo que conhecemos, mas conta de uma forma diferente os problemas entre “pai” e filho adolescente tentando se conhecer.

Muitos filmes entram e saem de cartaz sem que as pessoas notem a sua existência. E quando alguém comenta sobre ele, muitos de nós nunca ouvimos falar ou até mesmo chegamos a dizer: “Passou nos cinemas?”. As vezes belíssimas histórias, mesmo que recontadas diversas e diversas vezes, captam mensagens de formas diferentes e nos são repassadas de pontos de vistas completamente novos, e é isso o que transforma a beleza de entrarmos em uma sala e re-assistirmos uma mesma premissa já contada em zilhões de filmes anteriores. Veja o caso do filme Titanic: uma história de amor impossível entre duas pessoas numa sociedade preconceituosa, mas que o amor consegue vencer barreiras. Uma história mais do que batida que pudemos ver em diversos outros filmes, mas nenhum nunca se utilizou de um evento histórico (a bem dizer da verdade, uma catástrofe).

Esse é o caso de Transamérica. A recontagem de uma história só que numa roupagem completamente diferente. Quando o filme tem início, somos apresentados a Bree Osbourne. Ela foi um cara que viveu a sua vida toda em um corpo que não era o seu. Seu maior sonho é fazer a operação de mudança de sexo para que pelo menos corpo e mente fiquem em nível de igualdade. Tudo vai bem quando termina bem, já dizia Shakespeare, e assim caminhava para Bree, até que, uma semana antes da sua cirurgia, ela recebe a ligação de um jovem rapaz, onde desccobre que ele é seu filho (apesar do garoto não saber). Agora ela terá que ajeitar a situação, antes que sua terapeuta autorize sua cirurgia. Então Bree vai até Nova York ao encontro do filho e com uma desculpa de ser da “igreja pai em potencial” (veja aí a ironia do nome da igreja com a sua situação). Os dois se unem agora por um único desejo em comum: chegar à Califórnia, onde para Bree há a salvação da sua condição (a operação será feita lá) e para Tobey, seu filho, a possibilidade se tornar ator de filme pornô. Durante a viagem de carro, eles passam por diversas situações e tentativas de aproximação.

Felicity Huffman, mais conhecida agora pela série Desperate Housewives, ganhou o Globo de Ouro por sua atuação nesse filme, e não era de se esperar menos do que isso. Brilhantemente maquiada, Huffman consegue manter os maneirismo de um homem, elemento até um pouco complicado, que poderia cair na caricatura facilmente. Segundo a produção, Huffman foi escalada para esse filme antes mesmo de sua estréia em Desperate Housewives. Elemento não muito estranho, se percebemos que o produtor do filme é William H. Macy, seu marido.

Na direção, Ducan Tucker, que fez poucos trabalhos anteriores, estréia agora na direção de um longa metragem, também assinando o roteiro do filme. Não há nada de excepcional, ou de diferente na sua direção. Nem ao menos conseguimos entrar nos problemas ou simpatizar por completo com os personagens do filme e esse é a grande falha do longa. Falha que consegue ser corrigida pela atuação de Huffman, mas só. Tucker não chega a ser um diretor fraco, porém poderia ter explorado muito mais as personagens do filme.

Transamérica vem ser mais um filme da nova onda de produções com personagens que retratam opções sexuais diferentes, que nos Estados Unidos está sendo chamada de “Hollywood gay”. Porém Transamérica, assim como O Segredo de Brokeback Mountain, não é só sobre personagens com orientação sexual diferenciada, mas sim aborda temas como amor (no caso de Brokeback), e amadurecimento como relações entre pais e filhos (em Transamérica). Claro que não podemos negar que está presente sim essa divergência, que até pode nos chocar à primeira vista, mas são elas que fazem dessas produções tão especiais, e não só bem produzidas, mas com mensagens belíssimas.

Transamérica, com certeza, não é o tipo de filme para o público em geral. Na verdade, pode ser que muitos nem gostem do filme, mas isso não tira o seu mérito de um bom filme, um filme com conteúdo acima de tudo. E, além do mais, é sempre bom assistir a Felicity Huffman atuar, não é mesmo?

Leonardo Heffer
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