Mais uma história sobre mitologia nórdica, agora com uma diferente visão, pegada mais teen e feita pelos próprios nórdicos, mas que falha como entretenimento.
A Netflix há alguns anos vem apostando em produções ao redor do globo e, dessa vez, foi a hora da península escandinava – o que se torna bem interessante do ponto de vista cultural. Confiando na alta da mitologia nórdica, vide as sequências de “Thor” da Marvel e a série “Vikings”, a série norueguesa “Ragnarok” nos apresenta o adolescente Magne, de volta com a mãe e o irmão caçula para sua cidade natal, Edda. Durante a viagem de carro, que apresenta paisagens interessantes, ele vê um idoso em dificuldade e vai ajudá-lo. Uma senhora que assistiu à cena aparece, agradece por sua bondade e lhe toca o rosto. A partir daí, a vida do rapaz muda e ele recebe os poderes do deus Thor. Tudo isso acontece, literalmente, nos primeiros três minutos, já indicando a velocidade do primeiro episódio como algo marcante. Nele já somos apresentados a todos os personagens e entendemos a dinâmica entre eles, assim como há o pontapé da trama central e das secundárias, tudo isso de forma coerente e coesa.
O protagonista Magne, além de bondoso, tem uma personalidade introvertida e é disléxico, o que basicamente guia o rumo de suas atitudes e o torna “excluído”. Esse é, então, tipo de herói que geralmente cria carisma no espectador, porém não é o que ocorre. Na verdade, quase nenhum personagem cria empatia, demérito das atuações que só não são mais frias que as montanhas da Noruega e que ainda são mais prejudicadas pelo roteiro quadrado e descritivo. Uma exceção é o alívio cômico, que não pode ser deixado de lado, o irmão caçula Lauritis. Ele é a contraposição do rapaz mais velho e, claramente, uma referência ao deus Loki, que tem uma personalidade zombeteira e devassa.
Devido a suas características, Magne logo se aproxima de uma colega de turma na nova escola, Isolde. Ela também é excluída, entre outras razões, por conta de sua posição ativista pelo meio ambiente – por sinal, a preocupação com o ecossistema aliada à mitologia serão os dois grandes macrotemas que guiarão os rumos da série. A escolha de tratar a crise ambiental, tema tão atual e urgente de se falar, enquanto algo milenar como os deuses nórdicos rende muitos pontos à narrativa. Ela propõe a reflexão através de uma metáfora entre os gigantes da indústria, que tem poder e estão destruindo o planeta, e os Gigantes mitológicos, que eram seres vistos como “malignos”.
Ao contrário do primeiro episódio, a partir do segundo o ritmo se perde e o resultado é uma história que se arrasta. Os conflitos demoram a se desenrolar e há muitos momentos de diálogos simplesmente para estender o tempo dos capítulos. O principal, na realidade, é o protagonista sozinho, após uma tragédia com Isolde, embarcando numa jornada de autoconhecimento enquanto tenta enfrentar a família mais poderosa da região (que assim como ele não simples humanos), e provar que ela esconde segredos terríveis. Se você espera cenas iradas de lutas, monstros, deuses e efeitos à la Marvel, vai se decepcionar, já que aqui tudo é mais sutil e até minimalista, uma tendência escandinava que está espelhada na cinematografia da série.
Pode-se dizer que “Ragnarok” criou um universo que poderia ter potencial para desenvolver uma segunda temporada e dar um pouco mais de dignidade para as trajetórias do personagem principal: por exemplo, uma transformação física de Magne e uma demonstração maior de seus poderes. Analisando o que há de finalizado, conclui-se que é uma obra de boa escolha temática, mas que, infelizmente, não marca muito. Apesar de um roteiro redondinho, não tem tanta força nem personagens com carisma. Uma tentativa cheia de boas intenções da Netflix de variar os países provedores de conteúdo que não deu certo. Portanto, se ela estiver na lista de favoritos, não precisa ter pressa.