Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 23 de junho de 2012

God Bless Ozzy Osbourne (2011): os vícios e as ascensões do ‘pai do heavy metal’

Longa mostra, sem censura, como as drogas quase acabaram com a vida e carreira do líder do Black Sabbath,

Mais uma personalidade curiosa da música ganhou seu espaço durante o 4º In-Edit Brasil, festival de documentário musical que percorreu São Paulo. Ozzy Osbourne, o vocalista da banda Black Sabbath, lenda viva da música e considerado, como se ouve em um dos depoimentos, “o louco do rock”.

Em “God Bless Ozzy Osbourne”, dirigido pela dupla Mike Fleiss e Mike Piscitelli, o filme acompanha, por dois anos em turnês, a carreira do artista, que completou 60 anos em 2008. Mostrando desde a adolescência delinquente e pobre até o sucesso repentino e estrondoso junto ao Black Sabbath entre as décadas de 60 e 80, o documentário expõe imagens de arquivo (boa parte delas fotografias) e apresentações ao vivo e traça o perfil de Ozzy em seus mais de 40 anos de carreira.

Alternando desde as décadas de álcool e drogas em quantidades exorbitantes ao perfil atual de um homem que abdicou de tudo após chegar ao fundo do poço por conta de seus excessos, o filme tem parte de sua narrativa feita pelo próprio vocalista, na qual vemos de perto o início de sua carreira junto ao guitarrista Tony Iommi, do baixista Geezer Butler e do baterista Bill Ward em depoimentos sem pudores, na qual quatro jovens (Ozzy tinha 22 anos quando entrou para a banda) vindos de uma camada pobre britânica se viram encantados com o sucesso, mulheres e drogas.

Sem inovar no formato, “God Bless Ozzy Osbourne” se apoia na figura do próprio Ozzy, a “ovelha negra” de uma família tradicional, que teve seu primeiro contato com a bebida aos 14 anos e foi preso já aos 18 anos por roubos a lojas. Com um comportamento inquieto, nunca quis trabalhar ou estudar e decidiu, após contato com a música dos Beatles, que queria ser um astro do rock.

Disléxico e com um organismo que recebeu, durante quatro décadas, as mais inúmeras substâncias (especialmente doses cavalares de álcool e cocaína), vovô Ozzy hoje é visto com um homem de comportamento calmo, de voz arrastada (que necessita de legendas em muitas delas e estão repletas de palavrões). Nada comparado às loucuras que se envolveu com o Black Sabbath em décadas passadas.

“God Bless Ozzy Osbourne” traz, ainda, entrevistas com artistas que o reverenciam como um ícone do heavy metal: Robert Trujillo (Metallica), Henry Rollins (Black Flag), John Frusciante (ex Red Hot Chilli Peppers), Tommy Lee (Mötley Crüe), sir Paul McCartney, além de outros profissionais que estiveram perto do grupo, como o amigo Zakk Wylde, seu ex-empresário Colin Newman, o fotógrafo Ross Halphin (e seus closes impagáveis de Ozzy nas mais diversas loucuras sob efeito de drogas). Só vendo para crer, realmente.

Considerado um morto-vivo na vida pessoal em seu passado e uma eterna lenda nos palcos, o filme expõe, sem receio, Ozzy como um pai completamente relapso, que fica evidente nos depoimentos de seus cinco filhos (Louis e Thelma, do primeiro casamento; e Aimee, Jack e Kelly, do segundo), que relatam um homem que vivia inconsciente durante os poucos momentos que estava em casa e que escondia bebidas após cerca de 12 idas e vindas em clínicas de reabilitação/desintoxicação.

A união de quatro fatores que permeavam o grupo (pobreza,  juventude, fama e dinheiro) levou a usar, literalmente, quilos e quilos de cocaína, porém Ozzy foi quem mais se afundou nos vícios. Afinal, como fica evidente nos depoimentos de quem conviveu com ele, só parava de beber quando caía no chão embriagado. Os excessos ficam ainda mais evidentes em fotografias e comportamentos diante de entrevistas e apresentações ao vivo (muitas das quais nem lembra de ter participado, agindo como um zumbi em entrevistas).

Pontuando o lançamento dos álbuns do Black Sabbath e dividido em minicapítulos, “God Bless Ozzy” deixa de lado, em dado momento, o humor da loucura de Ozzy para mostrar o início do que poderia ser seu fim: a morte de seu pai e de outros dois amigos, a figurinista e maquiadora Rachel Youngblood e o parceiro Randy Rodhes (exímio guitarrista que participou de dois álbuns da carreira solo de Ozzy), vítimas de um acidente de avião em 1982. Com tal loucura e humor, que mascaravam uma personalidade insegura de perder todo o sucesso que conquistou, Ozzy renasce e volta a encarnar seu personagem, tanto nos palcos como na vida pessoal.

O filme expõe, também, atitudes ainda mais polêmicas, como a tentativa de assassinar a esposa Sharon estrangulada e o episódio quando, também completamente dopado, arranca a cabeça de uma pomba com os dentes. Tal fato deu margem para a lendária mordida em um morcego que, de fato,  aconteceu quando jogaram um morcego no palco e Ozzy, fora de órbita por efeito das drogas, mordeu a cabeça do animal acreditando se tratar de um brinquedo de plástico.

Com um epílogo mais dramático, acompanhamos o retorno de Ozzy à cidade natal, revisitando os locais onde cresceu, além de outros dramas que devastaram sua família durante o reality show “The Osbournes” (exibido pela MTV entre 2002 e 2005), quando toca na questão do vício em drogas dos filhos Jack e Kelly (e foi o pior período do alcoolismo de Ozzy), além da descoberta do câncer que acometeu Sharon em 2002.

E sem planos de se aposentar dos palcos, “God Bless Ozzy Osbourne” expõe o ritmo atual do vocalista, focando seu lado mais humano – o que pode soar piegas e careta aos fãs mais radicais – por mostrar Ozzy sóbrio, praticando exercícios físicos e que usa o desenho como hobbie terapêutico, com um jeito calmo e ironicamente típico dos britânicos. Mas, ao subir no palco, é o mesmo de sempre. Amém.

Léo Freitas
@LeoGFreitas

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