Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 04 de dezembro de 2010

Megamente

E o que faz um vilão quando fica sem herói? A resposta está nesta nova animação da DreamWorks.

Todos nós adoramos um bom vilão. Pergunte a qualquer ator se ele prefere interpretar Otelo ou Iago que todos eles dirão “Iago” na mesma hora. Mas, o que acontece quando um vilão alcança o seu objetivo? Essa é a questão proposta por “Megamente”, interessante e divertida animação da DreamWorks.

Em um sistema solar moribundo, dois planetas habitados estavam à beira da extinção. Nesse momento, uma nave saiu de cada um desses mundos condenados. A primeira levava um garoto bonito e que foi destinado à riqueza, tendo ganhado pais abastados e poderes incríveis. A segunda, bem… seu pequeno ocupante caiu no meio de uma penitenciária e, por sua pele azulada e aparência diferente, sempre enfrentou o desprezo alheio. Assim, foram plantadas as sementes da rivalidade entre o heróico Metroman e o seu arquiinimigo, o supervilão Megamente.

Na cidade de Metro City, as batalhas entre os dois combatentes já viraram uma rotina absurda, tanto que a repórter Rosane Rocha, considerada como a namorada do herói, já nem se importa mais em ser sequestrada pelo gênio do crime e seu lacaio, o Criado, como isca para as armadilhas que visam a destruição do Metroman. Em meio a mais um desses embates, o impossível acontece: Megamente vence e só o que resta de seu rival é um esqueleto.

Mas… o que Megamente e Criado farão de suas vidas agora? Sim, o mundo foi conquistado, mas não há mais nenhum obstáculo em seu caminho, nenhuma meta a ser superada. Como cabeça vazia é a oficina do diabo, Megamente pensa no que fazer. Enquanto se relaciona com Rosane através de uma identidade secreta, ele tem uma ideia para trazer cor e aventura de volta aos seus dias, mas é claro que algo sai bem errado, obrigando Megamente a assumir um papel que nunca pensou ter: o de herói.

O filme, então, faz uma análise bastante intrincada sobre o que cria um vilão: será que as pessoas já nascem más ou suas criações as levam para o caminho sombrio? Tal questionamento, bastante complexo, é embrulhado em um verdadeiro caminhão de referências ao mito e aos filmes de super-heróis clássicos, sendo o mais evidente destes “Superman – O Filme”. O longa ganha até sua própria versão do Jor-El encarnado por Marlon Brando no filme de 1978! Fãs de quadrinhos mais atentos irão também reparar referências mais sutis, como a aliteração no nome da mocinha (RR) e o museu do Metroman, uma homenagem clara ao Museu do Flash.

No entanto, a fita não funcionaria se não tivesse personagens carismáticos e todo mundo adora um bad boy. Como conhecemos Megamente desde sua infância e pouco acompanhamos a trajetória do Metroman, passamos a simpatizar mais com o azulão, compreendemos suas motivações, rimos de suas sandices e até nos afeiçoamos a ele, tal como seu sidekick, Criado. Neste sentido, quando surge um novo vilão na cidade, não torcemos por Megamente só por ele ser “menos vilanesco” que o recém-chegado, mas por realmente gostarmos do personagem.

Olhando assim, “Megamente” parece ser uma obra bem séria, mas trata desses temas com uma leveza muito bem vinda, jamais querendo ser mais do que uma sessão descompromissada de cinema, apresentando tais densos conflitos mais como pano de fundo, sem tentar martelá-los na cabeça do espectador à força. Mostra-se bem vinda, então, a participação do consultor criativo Guillermo Del Toro, especialista em apresentar questionamentos pesados sem perder a ternura, vide os ótimos longas da série “Hellboy”.

Ao mesmo tempo, o diretor Tom McGrath ainda encontra tempo para desenvolver ótimas sequências de ação. As cenas de vôo, com o auxílio dos óculos 3D, ficaram soberbas e os confrontos que acontecem durante a narrativa, sempre absurdamente megalomaníacos, são divertidíssimos de se acompanhar.

Palmas para o cineasta e para os roteiristas Alan J. Schoolcraft e Brent Simons, por conseguirem um bom equilíbrio entre os componentes mais densos e a diversão pura, embora a fita claramente dê maior destaque para este segundo lado. A fotografia do filme também é um bom ponto a ser destacado, pendendo para tons mais claros e iluminados. A ótima trilha sonora do longa está repleta de músicas fenomenais podendo ser ouvidos desde AC/DC, Guns n’ Roses e Ozzy Osbourne até Michael Jackson e Minnie Riperton, sem contar a trilha original de Hans Zimmer, inspirado como sempre.

“Megamente” pode não ser um novo clássico da animação – e nem pretendia sê-lo -, tendo inclusive aquela moral já conhecida do seja quem você pode ser, mas sua roupagem superheróica, temas inteligentes e visual arrojado fazem da película um ótimo programa!

Thiago Siqueira
@thiago_SDF

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