Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 21 de agosto de 2010

A Epidemia

Os zumbis estão de volta ao cinema em um filme que segue a linha dos clássicos do gênero. Se peca pela falta de inovação, o longa ganha pontos pelas sequências eletrizantes e sustos bem distribuídos e posicionados na trama.

Zumbis são sempre divertidos. Essa é uma premissa infalível para qualquer gênero de cinema ou época de produção. Seja enquanto rasgam um pescoço a dentadas, nos filmes de horror, ou quando aparecem com um naco de braço pendurado entre os dentes, nas comédias escrachadas, os mortos-vivos ganharam variações técnicas, físicas e intelectuais e tornaram-se garantia de um bom público.

Partindo de George A. Romero, maior expoente do tipo, os zumbis ganharam popularidade e caíram no gosto comum. Seu “A Noite dos Mortos-Vivos”, de 1961, entrou para a seleta lista de filmes trash cultuados pelo público, e suas características ainda influenciam produções recentes. Prova disso é “A Epidemia”, refilmagem do clássico “O Exército do Extermínio”, quarto filme de Romero. Com roteiro semelhante ao original e exibindo um caráter técnico um tanto antiquado, essa nova versão é fiel ao seu antecessor e, justamente por isso, igualmente divertida.

A história acompanha a fuga de quatro moradores de uma cidade do interior dos Estados Unidos. O xerife do local (Timothy Olyphant), sua esposa (Radha Mitchell), um policial (Joe Anderson) e uma adolescente (Danielle Panabaker) tentam escapar de um vírus espalhado pelo sistema de abastecimento de água da cidade. Ao mesmo tempo, precisam fugir dos seus vizinhos, transmutados em zumbis sádicos após a ingestão da água, e de um exército policial enviado pelo Governo para deter a proliferação do vírus para além dos limites da cidade.

O roteiro é  enxuto, sem espaço para ramificações e narrativas paralelas. Vez por outra algum novo personagem ainda não infectado acompanha o grupo do xerife, mas sua participação é sempre limitada a poucos minutos de duração. E se a trama gira em torno de uma história simples e exaustivamente utilizada por outras produções, o que resta ao diretor Breck Eisner é apostar em cenas bem elaboradas de tortura e litros de sangue que escorrem como água.

E sob esse aspecto, a direção de Eisner é certeira. Mais conhecido pelo prejuízo milionário de “Sahara”, filme-aventura de 2005, estrelado por Matthew McConaughey e Penélope Cruz, Eisner se mostra agora menos ambicioso e assume um orçamento de US$ 20 milhões (“Sahara” custou, entre produção e distribuição, mais de US$ 200 milhões). O resultado é positivo, embora um tanto antiquado, e “A Epidemia” deve agradar aos fãs do cinema de horror.

As opções de enquadramento e ângulos de câmera remetem ao filme de Romero, com suas sequências tremidas e imagens explícitas dos momentos de morte. Eisner soube conciliar o tradicionalismo técnico do que já foi testado pelo mestre com a atualidade do estilo que consagrou filmes como os da franquia “Jogos Mortais” e “O Albergue”. Por utilizar o que há de melhor nas duas épocas, o hibridismo técnico de Eisner funciona e garante dinamismo durante toda a projeção.

A trilha sonora, com a representativa música folk de Johnny Cash em seus minutos iniciais, e os acordes inquietantes elaborados para as sequências de tensão, dão o tom certo para a pacata cidade caipira vítima da barbárie de seus próprios moradores. A música também embala as fugas e o desespero dos personagens, carentes de uma boa interpretação por parte de alguns atores.

O protagonista Timothy Olyphant não consegue escapar do amadorismo que permeia algumas atuações do cinema de horror. Embora seu personagem, o xerife da cidade, desperte simpatia imediata no público, sua interpretação não consegue atingir o equilíbrio exigido pela narrativa. Então, o que vemos é um excesso de expressões exageradas e caras retorcidas, que destoam até mesmo do clima naturalmente descomedido da produção.

O destaque vai para o trabalho seguro de Radha Mitchell e Joe Anderson. Os dois mostraram versatilidade para assumir papéis importantes em gêneros opostos. Ela já havia conseguido oferecer ao público atuações convincentes na comédia dramática “Melinda e Melinda” e no horror “Terror em Silent Hill”. Anderson, menos conhecido do grande público, participou de “Across de Universe” e do recente “Amélia”, e agora comprova seu talento em um gênero diferente.

“A Epidemia” não é eficiente na tentativa de criação de um clima pesado e constantemente assustador, característica de filmes como “Atividade Paranormal”. Talvez essa não seja sua ambição. Como um bom filme de zumbis, seu mérito está na caracterização dos mortos-vivos, nas sequências de fuga e nos inúmeros sustos bem espalhados por toda a narrativa. Vale a pena ser visto.

Jader Santana
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