Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 16 de julho de 2010

Encontro Explosivo

Essa divertida reunião de Tom Cruise e Cameron Diaz tem seus defeitos, mas é uma bela homenagem aos filmes de espionagem clássicos.

Alguns bons anos atrás, Julia Roberts estrelou um filme chamado “O Segredo de Mary Reilly”, no qual vivia a personagem-título, uma empregada do notório Dr. Henry Jackyll, que presenciava nos bastidores as ações do doutor e de seu alter-ego, Sr. Hyde. Pois bem, este “Encontro Explosivo” nos dá o mesmo tipo de história, só trocando a notória trama de “O Médico e o Monstro” pelas aventuras de um agente secreto nos moldes de 007 (ou Ethan Hunt).

Escrito pelo estreante Patrick O’Neil, o filme tem como protagonista a mecânica June Havens (Cameron Diaz), que está voltando para sua cidade para o casamento de sua irmã após uma viagem para comprar peças para o carro que está restaurando. Por acidente (ou não), June acaba embarcando no mesmo voo que o charmoso Roy Miller (Tom Cruise) e um flerte começa a se desenvolver entre os dois.

No entanto, Roy é atacado dentro do avião, que sofre um acidente e cai. Após ser levada para casa, June começa a ser perseguida por misteriosos (e suspeitos) agentes federais, que afirmam que Miller é um traidor. Quando Roy a resgata, June acaba não tendo opção se não ir com o espião em sua missão, que envolve um jovem cientista (Paul Dano) e um estranho objeto chamado Zephir.

Fica óbvio desde o início que o filme é uma versão das aventuras de 007 (o clássico, não a versão de Daniel Craig), por meio do ponto de vista da Bond Girl. O roteiro de O’Neil é bastante claro nesse sentido, brincando com essa interessante premissa com cenas e detalhes divertidos, tais como o próprio nome de June (exótico, como o de uma garota Bond deve ser) e até explicitando a homenagem, fazendo Tom Cruise ter seu dia de Ursula Andress ao sair do mar de roupa de banho, em uma clara referência à “007 Contra o Satânico Dr. No”.

O diretor James Mangold entra na brincadeira e nos mostra as cenas de ação e as fantásticas manobras perpetradas por Roy pelos olhos de Julie, fazendo com que nós fiquemos tão maravilhados e espantados pelas ações do agente quanto ela. Outra sacada bastante interessante é a quantidade de vezes com que June é nocauteada enquanto Roy a leva para lá para cá, outra referência a James Bond.

Nesse ponto, o filme chega a lembrar “True Lies”, fita de 1994 comandada por James Cameron. Infelizmente, há uma cópia quase frame por frame de uma gag daquele longa, envolvendo June e uma metralhadora. A produção simplesmente não necessita disso, até porque os próprios atores conseguem segurar muito bem o filme em seu ritmo altamente acelerado.

Aliás, o maior problema do filme é justamente o seu ritmo. Após engrenar praticamente 40 minutos em altíssima velocidade, deixando o espectador ligado entre gargalhadas e adrenalina, o filme praticamente para por 15/20 minutos para simplesmente enrolar com situações clichês de desconfiança e sem desenvolver de maneira adequada a trama, até engrenar de novo uma marcha alta e acelerar novamente.

Cameron Diaz, que tem uma ótima química com Cruise, só compromete em algumas cenas em que voa solo. As trocas de diálogos dos dois são tão divertidas que a maioria das cenas em que ela aparece só ou com outro ator soam um pouco chatas, principalmente no final do segundo ato. Mas Diaz se redime com uma hilária sequência envolvendo ela, o vilão do filme e um soro da verdade. De todo modo, a atriz ainda faz um bom trabalho ao ser os nossos olhos na narrativa.

Tom Cruise, que realmente possui um timing cômico impecável (e que precisa ser mais explorado), nos mostra o seu charme de modo hilariamente exagerado, explorando cada nuance dos clichês básicos dos espiões cinematográficos, desde as frases de efeito até o excesso de segurança ao fazer o impossível parecer uma caminhada no parque. Pouca gente consegue soar convincente ao dizer que vai dar tudo certo quando está dependurada de cabeça para baixo e sob tortura. Até a corrida típica dele temos aqui!

Quanto aos vilões, Peter Sarsgaard e Jordi Mollà fazem um trabalho bem padrão, até porque não se trata do tipo de filme que depende de seus antagonistas, pois o “mistério” envolvendo Roy e o Zephir é bem secundário. Sarsgaard até tenta passar alguma dubiedade em alguns momentos, mas é algo bem passageiro. Mollà, por sua vez, banca o típico vilão europeu dos filmes de espionagem, sem oferecer muito para a narrativa.

Viola Davis e Paul Dano só estão aqui mesmo para complementar o elenco, embora Dano faça um ótimo trabalho ao representar o seu Simon, principalmente retratando-o como uma aparente vítima de síndrome de Asperger.

Tecnicamente, o filme é competente e só. Mesmo tendo uma boa direção de arte (em especial nos esconderijos de Roy e de Antonio), os efeitos especiais desapontam em determinados momentos, principalmente em algumas tomadas durante o clímax da fita, algo que torna a fotografia bastante frágil e artificial nesses momentos. A trilha sonora é decente, embora não empolgue em momento algum, empalidecendo ainda mais se comparada ao trailer da fita, que encaixou perfeitamente com a música da banda Muse lá colocada.

Embora desaponte em suas cenas em baixa rotação, incluindo aí um epilogo relativamente forçado, “Encontro Explosivo” acaba se mantendo fiel à sua premissa divertida, se sustentando graças a um primeiro ato forte, um clímax empolgante (embora pontualmente falho) e um casal principal com uma química fenomenal.

Thiago Siqueira
@thiago_SDF

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