Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 10 de abril de 2010

Caso 39

Neste suspense irregular, Renée Zellweger se perde em meio a uma história atropelada e pouco contundente.

Sempre é uma surpresa agradável saber que filmes de suspense serão produzidos com nomes de peso no elenco. Pois afinal, o gênero passa por uma escassez tão grande de bons exemplares, que talvez acabe realmente assustando alguns atores. Em “Caso 39” isso não aconteceu e com Renée Zellweger a obra  ganha em visibilidade, mas infelizmente perde em qualidade. A atriz, que tem bons filmes em seu currículo, como o recente “Appaloosa – Uma Cidade sem Lei”, já se aventurou por este terreno mórbido do cinema com o mal cotado “O Massacre da Serra Elétrica – O Retorno”, mas no filme em questão a decepção que temos com sua personagem Emily Jenkins é grande o suficiente para colocar todo o resultado em xeque.

Jenkins é uma assistente social dedicada que enfrenta casos sérios aos montes, 38 para ser exato, e, com a adição de mais um, sua vida vira um verdadeiro inferno. O caso envolve a garota Lillith Sullivan (Jodelle Ferland), que aparentemente sofre maus tratos de seus pais, que parecem dois lunáticos. Depois de uma intervenção drástica, a assistente resolve adotar legalmente a menina. É aí que os problemas começam. Estranhos e trágicos eventos se desencadeiam, revelando que a garota esconde uma ligação com as forças do mal. Basicamente isso.

O roteiro vem das mãos de Ray Wright, que tem poucos filmes escritos e aqui entrega um trabalho com diversos problemas. A trama não poderia ser mais comum, envolvendo uma criança cabeluda, telefonemas estranhos e descrença de tudo e todos ao redor da protagonista. Wright até que tenta amarrar algumas coisas, e assim situar seus personagens na história com uma ligação convincente. Mas o problema é que esta suposta linearidade perde completamente seu ritmo e não segura as cenas forçadas.

As reviravoltas são fulminantes e, mesmo se tratando de algo sobrenatural, sentimos que as coisas foram de 0 a 100 em segundos. Alguns bons diálogos trazem pontos positivos, como a entrevista entre a garota e o psicólogo Douglas, ou mesmo cenas de tensão com os pais da menina, mas no geral, esta irregularidade acaba sendo fator decisivo para a recepção negativa do filme, que culmina com um final obviamente sem inovação.

A direção ficou a cargo do alemão Christian Alvart, que entre seus poucos trabalhos está o recente “Pandorum”. O diretor demonstra possuir certa percepção com sua câmera e se utiliza de ângulos e sequências interessantes, tendo o seu melhor nos momentos de tensão com ação. Cenas como o ataque de vespas ou a invasão domiciliar são alguns dos trechos aproveitáveis do filme. O resto perde em ritmo devido à fluidez descompassada da história, o que demonstra uma terrível aceitação do óbvio, sejam lá quais forem seus motivos (U$A).

Mas os problemas são profundos quando a protagonista não dá conta do recado. Renée Zellweger parece indisposta na pele de sua Emily Jenkins. Enquanto tudo está bem e ela é a assistente social dos sonhos das crianças carentes, a atriz até parece confortável, mas com as viradas bruscas do roteiro ela fica perdida e não convence ninguém com suas caras e bocas. Seus momentos de medo ou raiva são hilárias, dignos de filmes B (Sam Raimi na direção e roteiro seria perfeito, pois nada melhor que um alívio cômico para uma atuação tão improvável). A relevância da personagem para a obra acaba se tornando uma pedra que afunda qualquer coisa que se mostre positiva ao redor. Realmente uma péssima escolha dela e do casting do filme.

O time de coadjuvantes se sai um pouco melhor. Os pais da garota, Edward e Margaret Sullivan, interpretados por Callum Keith Rennie e Kerry O’Malley (atores com extensa experiência em séries de TV), geram alguns bons momentos. Já Iam Macshane se esforça com seu detetive Mike Barron e até consegue despistar o roteiro incrivelmente previsível em algumas ocasiões, mas manter sua relevância se mostra uma difícil missão, sendo que no final, seu personagem é o mais contraditório e descartável de todos.

Bradley Cooper, ator que tem ótimo tom para comédia – comprovado em “Se Beber, Não Case” -, aqui fica preso a um estereótipo de possível galã e não rende muita coisa com seu psicólogo Douglas J. Ames. A jovem atriz Jodelle Ferland, que vive a bonitinha e terrível Lillith Sullivan, se sai bem dentro do possível, principalmente por parecer uma criança normal na maioria do tempo. Mas analisando a participação de todos os atores de apoio, o correto é entendermos que toda e qualquer relevância que esses personagens possam vir a ter, não muda em nada o fato do filme ser ruim.

Esta é uma obra que não conseguimos levar a sério e acaba soando falsa na maioria dos momentos. Além de falhar no andamento e apresentar uma direção limitada, traz atuações que estão praticamente ligadas no piloto automático, sendo Zellweger o destaque neste quesito. Quando vemos filmes como este, percebemos o dilema que o gênero passa nos dias de hoje, pois seu público, diferente do passado, busca informações mais contundentes, e não apenas fatos que são atirados na tela. Parece cada vez mais difícil ficarmos realmente assustados mediante a tamanha bobagem.

Ronaldo D`Arcadia
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