Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 27 de fevereiro de 2010

Simplesmente Complicado

Meryl Streep e Alec Baldwin são as grandes atrações da mais nova comédia romântica de Nancy Meyers.

A roteirista e diretora Nancy Meyers é conhecida pelas comédias românticas maduras que realiza. Diferente da onda hollywoodiana atual, ela traz em boa parte de seus papéis principais personagens mais velhos, que já passaram do auge de seu fervor sexual, mas que ainda guardam juventude dentro de suas mentes. Financeiramente abastadas, essas figuras fictícias de Meyers costumam passar por situações atípicas que as tiram de sua rotina, colocando-as em entraves éticos e afetivos. Foi assim em “Alguém Tem que Ceder” e na série “O Pai da Noiva”. No seu último filme, ao tentar rejuvenescer seus personagens, acabou se dando mal em “O Amor Não Tira Férias”. Já neste “Simplesmente Complicado”, Nancy Meyers volta a retratar o que lhe alçou ao sucesso, fazendo seu longa mais engraçado, mesmo que ainda possua algumas falhas.

A história traz como protagonista a bem-sucedida Jane Adler (Meryl Streep), dona de uma padaria bastante sofisticada. Mãe de três filhos, ela não se incomoda em estar sozinha há dez anos, como relata para as amigas em reuniões particulares eventuais. O divórcio trouxe traumas, mas agora eles são apenas lembranças. A reforma que efetuará em sua casa representa a total independência dessa mulher madura e ainda bonita. Eis, então, que surge uma viagem para Nova Iorque.

O intuito de Jane era apenas estar presente na formatura do filho caçula, mas esse será um passeio mais radical. Bebidas, conversas e uma afinidade ainda existente, a levam a ter uma noite tórrida de amor com o ex-marido, o atrevido Jake Adler (Alec Baldwin), que está casado com uma mulher bem mais jovem. O romance, no entanto, vai além. Encontros casuais voltam a reacender a paixão que já parecia morta, e ambos tentarão esconder de todos o caso proibido que estão tendo. Surge ainda Adam (Steve Martin), o arquiteto contratado por Jane, que acaba se apaixonando por ela, completando o último lado do novo triângulo amoroso.

Longe de ser uma cineasta genial, Nancy Meyers transforma “Simplesmente Complicado” em um filme genuinamente cômico. Grande parte de todas as suas intenções de risadas funcionam e, para isso, contribuem o seu roteiro divertido e o trabalho do elenco. Meyers sabe que tudo não passa de uma grande brincadeira e explora todas as potencialidades de comédia que a trama proporciona, fugindo de dilemas dramáticos chatos que costumam surgir em filmes do gênero.

Jane Adler parece ser uma mulher cheia de padrões morais a respeitar e nos surpreende quando se rende aos desejos da carne, certamente influenciada pelos efeitos da bebida. Um “lar doce lar” hilário dá início a um romance secreto que primeiramente parece pautado por sexo, mas que se transforma em um relacionamento afetivo incomum. As desavenças que levaram a separação desse casal parecem ter sumido e, agora, o único entrave para que ele prossiga é o casamento de Jake com a antipática Agness (Lake Bell).

Desenvolvendo adequadamente esse romance inusitado, Meyers nos convence de que Jake pode ser a melhor escolha para o futuro de Jane, até que Adam dá as caras. Recém-divorciado, o arquiteto passa a nutrir um tipo de sentimento diferente pela mulher, que nasce a partir de uma mera conversa profissional entre ambos. Diante de algumas “vaciladas” do agora amante, Jane se vê diante de uma dúvida amorosa, a qual ultrapassa a tela grande e chega ao espectador. A imprevisibilidade dessa trama é outro grande trunfo de Meyers, que volta a surpreender positivamente com um desfecho incomum.

Entre encontros às escondidas e outros bem mais românticos, Jane Adler, no entanto, não é daquelas que ainda chora para escolher com quem deve ficar. Ela, simplesmente, curte. E é isso que faz do filme um prazer. A consulta com o terapeuta serve apenas para confirmar os rumos que já queria dá a sua vida amorosa. O errado nem parece mais tão errado assim, e desvirtuando padrões é que Nancy Meyers alcança seus melhores resultados. O relacionamento de Jane com Adam não chega a empolgar, mas o envolvimento com o ex-marido traz as melhores sequências de todo o longa.

Tiradas cômicas espertas do roteiro contribuem para o sucesso, mas são as atuações de Meryl Streep e, especialmente, de Alec Baldwin que são o diferencial do filme. A primeira surge contida em um primeiro momento, retratando a solidão dessa rica e conservadora mãe. À medida que o inesperado acontece, no entanto, a atriz põe suas mangas de fora, demonstrando todo o seu timing de comédia, mas nunca esquecendo a composição sutil de seu personagem.

Já Alec Baldwin é a grande atração de “Simplesmente Complicado”. Ele é o maior responsável pela incrível química que acontece entre o casal principal e pelas melhores cenas da película. Sem hesitar em aparecer nu, ele guarda na sua canastrice o que há de mais engraçado, porém ainda há espaço para “amolecer” o coração desse grande homem. Compondo o triângulo amoroso, está o discreto Steve Martin, que não tem grandes oportunidades de criar um personagem mais cômico.

Porém, nem tudo são flores no filme de Nancy Meyers. Erros infantis acontecem por parte de uma cineasta que parece menos madura do que seus próprios personagens. Fugindo eventualmente do tom sóbrio e homogêneo que impõe a fita, ela parece estar em fase de aperfeiçoamento profissional. As piadas inteligentes e a crônica de costumes dão lugar a comédia pastelão numa sequência específica e por meio de um personagem em especial.

Por mais que algumas risadas sejam inevitáveis na cena em que Jane, Jake e Adam dividem o mesmo baseado, a impressão é que estamos diante de outro filme, especialmente quando uma tragada é repartida entre Jake e seu genro Harley. Interpretado por John Krasinski, Harley, aliás, é o grande erro do filme de Meyers, já que parece saído diretamente da série de TV que o ator participa, “The Office”.

Mesmo assim, “Simplesmente Complicado” ainda é uma comédia romântica acima da média e pode até ser tratado como a melhor produção de Nancy Meyers. Com uma incrível capacidade de fazer rir, é uma ótima opção para todas as idades. Afinal, ver Meryl Streep e Alec Baldwin dividindo a tela e até mesmo uma cama de casal não acontece todos os dias.

Darlano Didimo
@rapadura

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