Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 02 de janeiro de 2010

Férias Frustradas de Verão

Lançado precipitadamente direto em DVD no Brasil, “Férias Frustradas de Verão” é uma comédia romântica juvenil nostálgica e tocante.

Qual o critério de seleção dos distribuidores brasileiros ao decidirem se lançam ou não um filme nos cinemas? A pergunta reflete uma indignação antiga de cinéfilos nacionais que já se cansaram de ver produções brilhantes saírem direto em DVD, enquanto outras medíocres têm seu lugar garantido nas telonas. Devido a decisões do tipo, somos forçados a assistir preciosidades cinematográficas em uma televisão pequena no sofá de casa sem a mesma emoção e clima da grande sala escura. Como se não bastasse, ainda tratam de dar ao longa um nome ridículo à lá Sessão da Tarde, dificultando sua identificação pelos que já ficaram de olho no bom lançamento internacional. Mas “Férias Frustradas de Verão” (“Adventureland”, em título menos vergonhoso) supera a tudo e a todos com sua trama que homenageia as saudosas comédias românticas juvenis dos anos 80.

A película traz todos os elementos típicos dos filmes do gênero que hoje são considerados cult por quem viveu essa década única. Estamos exatamente em 1987. James Brennan (Jesse Eisenberg) acaba de se formar no colégio, mas as suas pretensões para o futuro não começam nada boas. Um “fora” de uma garota com quem vinha “ficando” nos últimos dias é o primeiro indicativo de um período negativo que pode vir pela frente. No entanto, nada se compara a uma notícia dada por seus pais: eles não tem mais condições financeiras para manter o filho em uma eventual faculdade de Jornalismo em Nova York e de dar a prometida viagem à Europa pós-formatura. Brennan terá de trabalhar no verão para financiar os próprios estudos.

Sem um currículo qualificado, o garoto consegue apenas um emprego no parque de diversões local, o Adventureland, como controlador dos jogos de sorte. Como ele, dezenas de jovens estão em busca de um dinheirinho extra. Entre narrações de corridas de cavalo e ameaças de clientes ávidos por um urso de pelúcia, Brennan faz amizades. Lá ele conhece os loucos donos do parque, Bobby (Bill Hader) e Paulette (Kristen Wiig), o cara da manutenção, Mike Connell (Ryan Reynolds), o nerd ateu, Joel (Martin Starr), e a gostosona Lisa P. (Margarita Leviava). Entretanto, ninguém lhe prende mais a atenção do que a bela Em Lewin (Kristen Stewart).

“Férias Frustradas de Verão” é nada mais do que o reflexo da inocência da juventude dos anos 80 se comparada com a da atualidade, até mesmo cinematograficamente. Basta olhar para o currículo do diretor do filme para constatar essa realidade. Enquanto que em “Superbad – É Hoje”, George Mottola retrata uma história regada a muita bebida, referências sexuais e nomes feios, aqui ele realiza algo bem mais leve e romântico. Não que faltem bebidas e sexo, mas aqui esses fatores não são a mola mestra. A amizade e o amor guiam os ideais destes jovens sonhadores.

Assim como os excelentes “Curtindo a Vida Adoidado” e “Clube dos Cinco”, dois marcos da década de 80, este filme reúne todos os elementos para se tornar um novo clássico juvenil, apesar de os tempos serem outros. Como característica mais marcante temos uma trama aparentemente fútil que mostra uma eventualidade na vida de um adolescente. Mas as histórias crescem. A banalidade dá lugar ao importante amadurecimento destes jovens e, quando menos esperamos, a emotividade faz destes filmes inesquecíveis. O caricatural é outro selo destes longas e “Férias Frustradas de Verão” faz uso desta propriedade com louvor porque é gradual e discreto. Os donos do parque são responsáveis pelo fator comédia, enquanto Lisa P. é sinônimo de sensualidade. A moça não hesita em demonstrar seu belo corpo enquanto dança com suas calças apertadas e coloridas no meio do público.

No entanto, é por James Brennan que o longa triunfa. O rapaz passa por aquelas fases indefinidas em que não se sabe se é adolescente ou adulto. Algumas responsabilidades surgem, enquanto outras ficam longe de quererem ser assumidas. Roteirizado pelo próprio Mottola, o enredo é sutil ao tratar sobre as mudanças que estão ocorrendo na vida de Brennan. A virgindade dele é guardada para alguém especial, já o uso de drogas acontece a qualquer momento, mesmo com certa moderação. Outro acerto do roteiro é não deixar os problemas ligados unicamente ao rapaz e seus amigos. Os pais deles também enfrentam dificuldades, com destaque para o pai de James que, após sofrer um decesso no emprego, se rende à bebida, mesmo que escondido da família.

Em época de inúmeras comédias românticas adultas, quem imaginaria que uma relação entre dois jovens seria uma das mais maduras do ano? James e Em protagonizam nada menos do que uma das histórias de amor mais bonitas do cinema dos últimos tempos. Tudo começa com uma gentileza da moça, que o salva de ameaças de clientes imbecis. Depois, passa para uma amizade inocente e, quando eles menos percebem, vira uma paixão de verão. Entraves existem para que essa relação prossiga. Ela tem um caso secreto com o mecânico metido a cantor e é bem mais experiente sexualmente do que James. Mas a simpatia e a inteligência do rapaz é exatamente o que Em precisa para enfrentar as responsabilidades da vida adulta que batem diariamente a sua porta.

Entre beijos tórridos, abraços verdadeiros e conversas reveladoras, os personagens são embalados por uma belíssima trilha sonora que reúne baladas famosas dos anos 80. É impossível resistir aos refrões de “Your Love”, de The Outfield, de “Sattelite of Love”, de Lou Reed, de “Pale Blue Eyes”, do Velvet Underground, e de “Don’t Change”, do INXS. Músicas de Crowded House e David Bowie também compõem a lista de canções melancólicas do filme, transformando a produção em uma incrível jornada de autoconhecimento. James, Em, Lisa P., Joel e Frigo são os nomes de alguns dos personagens cujas experiências de verão adorariam ser vividas por cada um de nós. Nem mesmo com um final açucarado demais, “Férias Frustradas de Verão” deixa de ser um dos melhores filmes do ano. Alugue e se delicie!

Darlano Didimo
@rapadura

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