Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Gia – Fama e Destruição

A história forte e uma interpretação excepcional de Angelina Jolie colocam “Gia“ como uma das melhores cinebiografias sobre as drogas no mundo dos famosos, de uma forma nada glamourosa.

A ascenção meteórica e a decadência, devido ao uso de heroína, fez de Gia Marie Carangi um exemplo nas telas e fora delas. A garota de Filadélfia contou com a sorte para brilhar nas passarelas e capas de revista do mundo todo, mas não sabia lidar as pressões desse mundo e de sua própria vida. Sua personalidade vulcânica era acentuada por sérios problemas familiares, emocionais e por um constante preconceito frente à sua assumida bisexualidade. Talvez esses tenham sido os motivos que a levaram às drogas e a um fim trágico, aos 26 anos vítima da AIDS.

A vida de Gia Carangi é mostrada como uma orgia infindável pelo diretor Michael Cristofer, neste filme feito para a HBO. Com ares de documentário, Cristofer conseguiu fazer um trabalho que prima pelo bom senso e pela estética, intercalando depoimentos de amigos e conhecidos, com cenas do cotidiano da top model, interpretada por Angelina Jolie, de forma irretocável, culminando em seu primeiro Globo de Ouro de Melhor Atriz naquele ano.

Gia não era inocente e nem era frágil. Fez o que quis, levou uma vida sinuosa e cheia de excessos. Trabalhou para nomes como Armani, Diane Von Furstenberg, Dior, Levi’s, Maybelline, Versace, Yves Saint Laurent, os melhores da moda de sua época. Chegou a ganhar 10 mil dólares por dia e foi considerada a modelo mais bem paga do mundo durante três anos consecutivos. Seu único equívoco, em toda essa história de cinderela, foi não saber administrar suas relações afetivas – familiares e pessoais.

Insegura e carente, Gia encontrou na heroína o alento que não achou naquele que considerava o grande amor da sua vida, a maquiadora Linda (Elizabeth Mitchell), e na falta de apoio dos pais – sempre retratada de forma traumática –, o fio condutor de diversas crises da modelo, que alternava momentos de intenso amor – pela vida e pelas pessoas a seu redor – mas nunca por si mesma. Sem encontrar apoio na família, e ignorada pelos amigos, Gia chega a uma inevitável decadência em sua carreira, enquanto encara a crueldade da dependência química.

Por ser baseado em faos reais, o longa já ganha pontos no roteiro, escrito a quatro mãos por Jay McInnerney e Michael Cristofer. Os escândalos e problemas de Gia crescem a cada cena e isso confere ao filme, muitas vezes, certa excessividade, porém não perde o lado crível. As fragilidades da protagonista são expostas de forma bastante diretas e pontuais, seja na fotografia, na edição ou nos diálogos. Roberto Garcia consegue a proeza de mesclar o luminoso dos desfiles com a agonia interna da modelo, em cenas pesadas, sem apelar para o óbvio. O figurino (Robert Turturice) é um banquete servido em pequenas porções, repleto de nomes famosos e marcas do mundo fashion.

Com um elenco formado por desconhecidos do grande público, Gia encontra na interpretação de Angelina Jolie a força para ser lembrada. A atriz, que até aquele momento não tinha feito nada memorável, convence em um trabalho intenso, vibrante e hipnótico, que ofusca os demais, até mesmo a atuação de Faye Dunaway (excelente), como a agente e amiga Wilhelmina Cooper.

Assim como Gia era linda e louca, Jolie também servia à carapuça. Na época, a atriz dizia ter recusado o papel diversas vezes por se achar muito parecida com a personagem. O interessante é que foi justamente com este longa que Angelina conseguiu dinheiro, fama, respeito da crítica e do público, e a ambição dos estúdios, tornando-se um dos nomes mais cobiçados da indústria do cinema.

Mesmo com alguns tropeços, o filme de Michael Cristofer cumpre seu fim, já que a própria Gia queria que sua história fosse contada para alertar ao mundo os perigos das drogas. Lançado em 1998, o longa rendeu dois Globos de Ouro (Atriz e Atriz Coadjuvante), um Emmy de Melhor Edição e foi indicado em mais cinco categorias, além de outros prêmios. Bom trabalho!

Debora Melo
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