Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 06 de agosto de 2009

História de Nós Dois, A

A certa altura, um personagem dispara: “O casamento é a eutanásia do romance”. Será mesmo? Essa é a pergunta que o diretor Rob Reiner tenta responder, ao contar as alegrias e problemas de um casal em crise, prestes a se separar e obrigados a encarar as verdades sobre seu relacionamento.

Assistir “A História de Nós Dois” é um exercício de observação puro e simples. Levar a intimidade da relação para o cinema pode incomodar, fazer rir, criar identificação, mas nunca é comum. A transição dos sentimentos para o papel, e depois para uma tela de cinema, não é lá tarefa das mais fáceis e deve-se perder muito em uma sala de edição, até o produto final cheguar ao espectador. Por isso mesmo merece aplausos o trabalho pontual e tocante de Rob Reiner à frente deste longa. Ao direcionar o olhar para a rotina problemática de um casal aparentemente feliz, o diretor revela e disseca aquele que é o maior medo da vida a dois: descobrir que não se está mais apaixonado.

O espontâneo escritor Ben (Bruce Willis) e a prática fazedora de palavras cruzadas Katie (Michelle Pfeiffer) estão juntos há 15 anos, têm dois fihos lindos e uma casa de comercial de margarina. Mas isso não é o suficiente para mantê-los juntos, quando percebem-se intolerantes um com o outro. A ida dos filhos filhos Josh (Jake Sandvig), de 12 anos, e Erin (Colleen Rennison), de 10, a um acampamento de verão, leva o casal a uma separação de corpos, enquanto eles repensam sua vida juntos e decidem se devem ou não permanecer casados. É a partir daí que o drama de Reiner mostra a que veio.

O diretor não apela para a histeria e até mesmo dosa os clichês tão comuns às tramas como esta. É na neutralidade de espaço entre os protagonistas que ele injeta uma boa quantidade de momentos marcantes, mostrando os altos e baixos da relação e as consequências do amor, da raiva, da intolerância, do respeito (ou a falta dele), do carinho na vida de Ben e Katie. Cada sentimento relembrado pelo casal é colocado por Reiner de foma não-traumática e sem gratuidade em flashbacks, ora de extrema felicidade, ora de extrema frustração, e por isso seu trabalho soa tão honesto.

“A História de Nós Dois” aproveita muito bem, além do talento óbvio, o carisma de Bruce Willis e a beleza de Michelle Pfeiffer. O ótimo elenco de apoio formado por Rita Wilson, Tim Matheson e Paul Reiser apresenta as metáforas mais absurdamente hilárias sobre o casamento e compromisso, enquanto discursam sobre o abismo que acaba tomando conta das relações conjugais.

Alan Zweibel e Jessie Nelson assinam um roteiro que consegue ser brilhante na simplicidade. Além de proporcionar exelentes diálogos para os prersonagens centrais, brindam o elenco de apoio com tiradas divertidas e extravagantes. A dicotomia tão bem expressa em palavras também o é em imagens. A fotografia de Michael Chapman ("As Duas Faces de um Crime", "Touro Indomável" e "O Fugiivo") privilegia o ambiente e as emoções dos personagens, aliado ao bom trabalho de edição de Robert Leighton ("Harry & Sally" e "Questão de Honra"). Eric Clapton, que assina parte da trilha sonora, resumiu o espírito do filme com a baladinha “Get Lost” nas cenas iniciais.

Aparadas as devidas arestas, Reiner fez um bom trabalho e soube superar o trivial. “A História de Nós Dois” não soa pretensioso, e não é mesmo. É um drama simples, com pequenas doses de humor, que entretem, faz refletir e ainda deixa um gostinho no ar de que é possível acreditar em finais felizes. Na tela, ou fora dela.

Debora Melo
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