Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 09 de novembro de 2008

Orquestra dos Meninos

“Orquestra dos Meninos” chega aos cinemas para contar a história real de Mozart Vieira, músico pernambucano que criou a orquestra-título do filme e foi acusado de crimes de pedofilia nos anos 90. O longa-metragem apresenta inúmeras falhas, mas vale pela história de sonho e luta de Mozart e pela música dos meninos.

No final dos anos 80 e início dos anos 90, na cidade de São Caetano no meio do agreste pernambucano, o músico Mozart Vieira realizou um sonho. Formou uma orquestra com meninos que trabalhavam na roça e nunca tinham visto instrumentos de sopros antes. Enfrentando dificuldades de dinheiro, infra-estrutura e apoio na região, a Orquestra dos Meninos, como ficou conhecida, gravou um CD, fez apresentações em Brasília, Rio e São Paulo, e despertou o interesse da mídia e a inveja de muitos.

Em 1995, o clarinetista Erivaldo foi seqüestrado e abusado sexualmente. A polícia acusou ninguém menos que o maestro Mozart do crime. É essa história de sonhos, luta e superação em busca da justiça que Paulo Thiago (do enfadonho e previsível “O Vestido”) conta em seu mais novo “Orquestra dos Meninos”.

Transportando a história real para o Sergipe, Thiago contou com Murilo Rosa no papel do maestro. Apesar do bom desempenho do ator, ele leva uma desvantagem que acomete também sua companheira de cena, Priscila Fantin, e todos os globais em produções do gênero: o falso sotaque nordestino. Se não é uma sátira de Guel Arraes ou novela das 8, não funciona. A jovem atriz tem ainda o dom da inexpressividade e parece uma peça solta no meio da orquestra. Impossível não questionar sua participação no grupo de meninos e meninas, seja pela idade ou pelo não pertencimento àquela terra. Na cena em que os garotos entoam tristemente o Hino Nacional e Fantin se junta posteriormente a eles, tudo que podia pensar era: “Tira essa moça daí. Está matando a emoção da cena”.

O trabalho de preparação com os meninos da Orquestra foi realizado por Laís Corrêa (excelente também no papel da diretora da escola). A escolha se deu dentre 300 crianças do próprio estado. Algumas já faziam teatro e todas tiveram que aprender a manusear e soprar os instrumentos. Infelizmente, o cuidado que cercou a escolha do elenco infanto-juvenil passou longe quando de alguns personagens. O delegado e a promotora são caricatos ao extremo e a edição corrobora para esse tom pastelão a cada aparição rompante da oficial de justiça.

Mais desagradável ainda para a audiência de “Orquestra de Meninos” são os solavancos na história. A falta de coesão no roteiro (também de Paulo Thiago) é sentida principalmente quando das elipses de tempo e espaço. Mais uma vez a edição não ajuda aqui. O diretor já havia dito o quão era difícil ficcionalizar uma história real. Acontecimentos de 10 anos eram rearranjados em um só e outras dificuldades. Infelizmente, ele parece não ter dado conta do recado.

Apesar de todos os problemas, o longa-metragem também tem suas qualidades. Rodado inteiramente no Sergipe, o filme passa longe de estúdios dando mais realidade aos acontecimentos. Além disso, conhecer a história de Mozart Vieira e ouvir música boa dos grandes mestres da música clássica vale uma ida ao cinema. Atualmente, todos os meninos e meninas que tocavam àquela época vivem da música e Mozart cursa mestrado na área. A Fundação Música e Vida, criada para ajudar a Orquestra, atende 200 jovens.

Igor Vieira
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