Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 06 de outubro de 2007

Resident Evil: A Extinção (2007): uma afronta à boa vontade do espectador

Eis o fechamento da primeira trilogia de “Resident Evil”. O filme, “baseado” na série homônima de jogos para videogame e computador, chega para melhorar seus antecessores ou piorar a franquia cinematográfica de vez.

Sempre é bom ter esperanças. Não é porque dois filmes de uma trilogia foram ruins que o terceiro não poderá ser bom. Ele pode funcionar de tal forma que consiga melhorar os outros lançados. Por outro lado, também posso afirmar que, em uma trilogia, se os dois primeiros filmes foram bons, não implica dizer que o terceiro será bom também. A tendência é que seja bom, mas ele pode vir à deturpar os seus antecessores. Vejamos o que aconteceu com a trilogia “Matrix”, por exemplo. Nesse caso, o terceiro filme só não é de um todo descartável, pois o primeiro é muito acima da média, enquanto que o segundo cumpre seu papel. Logo, diante de tal singela “filosofia da expectativa”, eu até que esperava algo de “Resident Evil 3: A Extinção”. Todavia, um dos poucos acertos nesse projeto foi o subtítulo: extinção.

No terceiro e, pelo visto, não último filme de “Resident Evil” somos, mais uma vez, levados à tramas que se envolvem com o antecessor. Nesse caso, como há dois antecessores, então ele se envolve com os dois filmes anteriores. Enquanto “Resident Evil: Apocalipse” (o segundo da cine série) começou com o final de “Resident Evil: O Hospede Maldito” (o primeiro da cine série), esse terceiro começa com o início do primeiro. Isso não é, porém, um recurso com o objetivo de deixar os três filmes interligados – talvez Quentin Tarantino (“Kill Bill”) tivesse tentado fazer isso -, mas trata-se de apenas um começo comum que será rapidamente esclarecido da forma mais simples que você venha a imaginar. Algo que poderia surtir como uma boa idéia, acaba surtindo como uma falta de tato para se começar uma seqüência. Além do mais, acabam economizando algumas horas de filmagem, já que é só pegar um rolo pronto do filme anterior e anexar ao novo.

Mesmo com esses inícios mal arrumados, sempre somos enganados. Tenho a sensação de que gastam bastante tempo tateando os primeiros vinte minutos, a fim de iludir um pouco os espectadores. Convenhamos, o começo do primeiro “Resident Evil” – quando Alice (Milla Jovovich) se levanta de uma banheira, machucada e se olha em um espelho – tem lá seus propósitos, conseguindo ser sombrio e misterioso. O começo do segundo filme também tem lá seus méritos, apesar de ser uma colagem do final do seu antecessor. Mais uma vez, apesar de também ser uma colagem do começo de toda a trilogia, esse terceiro tem lá seus acertos. Ficamos nos perguntando: “porque isso está acontecendo novamente?”, “será que vão explicar o que deixou sem explicação no primeiro filme?”, etc. O problema, porém, é como esse começo tão cheio de perguntas consegue ser explicado da maneira mais clichê e esdrúxula possível. Clonagem: a explicação da vez. Poupem-me do assunto mais batido do cinema hollywoodiano.

Não cabe mais nem discutir o filme como uma adaptação, já que o diretor da Capcom (empresa detentora dos direitos dos jogos) já transpareceu que os filmes devem ser tratados à margem dos jogos. Entretanto, para não sentirem a falta de tal comparação, ele é, basicamente, um desrespeito para com aqueles que gostam da estória de “Resident Evil” nos jogos. Para aqueles que passaram preciosas horas se divertindo com os jogos, atirando em zumbis, matando chefões e decifrando puzzles, a terceira “adaptação” é a maior afronta dentre os três filmes. Mais do que o primeiro e bem mais do que o segundo.

Como filme em si, o parágrafo não tem como se modificar muito. De desrespeito para com os fãs da série, passa a ser uma brincadeira de mau gosto para com os espectadores que curtem um bom filme de ação. Até onde eu saiba, filmes do gênero não devem ser lentos ou manter tanta distância entre uma cena frenética e outra. Nesse caso, isso não foi levado a sério. Talvez o problema não seja nem a lentidão em si, pois já assisti a filmes que têm uma certa lerdeza, mas compensam quando se propõem a mostrar suas cenas de aventuras. No caso de “Resident Evil 3”, o problema é a distância de uma cena para a outra, o que causa grande expectativa, e a forma com que elas são filmadas.

Será que não foi entendido que eu quero ver os socos e pontapés nas cenas de luta? Não… eles (o roteirista Paul W.S. Anderson e o diretor Russell Mulcahy – nesse caso, vale citar Anderson, pois ele está vinculado a todo o projeto) insistem em repetir o erro de não mostrar os “finalmentes” dos golpes. Quando mostram esse tal “finalmente” a que me refiro, são aqueles quando Milla Jovovich faz sua “ginástica olímpica”. Diga-se de passagem, nada ela faz o mais simples. Para um simples chute, porque ela tem de dar três rodopiadas ao próprio eixo, duas cambalhotas, fazer as unhas, olhar para a câmera fazendo caras e bocas e, aí sim, acertar o oponente? Desculpem os super-exagerismos, mas é mais ou menos essa linha que a personagem da atriz segue. Quando se sabe fazer o super-exagerismo, faça, caso contrário faça o simples mesmo, fica menos artificial. Isso só dá trabalhando para quem está segurando os cabos que erguem a atriz (ou a dublê desta).

Dos três, esse também leva a marca de ser o pior dirigido. O primeiro até que tem lá seus acertos e algumas cenas são bem feitas. O segundo também tem algumas cenas interessantes, como a que L.J. (Mike Epps) fica frente a frente com o Nêmesis, ou até mesmo a cena em que Jill Valentine e outros personagens estão cercados por monstros em uma igreja. Nesse, porém, somente uma cena é realmente bem feita. Falo da cena dos corvos, quando estes, em grande quantidade, rondam os personagens do filme. A tensão, ali sim, foi bem aplicada. É esse nível de detalhes que eu sempre espero em um filme de ação/aventura. Infelizmente, só uma vez isso foi observado.

Transformaram Carlos Olivera (Oded Fehr, de “A Múmia”) em um viciado em maconha. Além disso, o personagem teve um final completamente indigno da sua importância nos jogos. Claire Redfield (Ali Larter, de “Heroes”) passou de motoqueira em busca do seu irmão Chris, para uma caminhoneira alucinada por nicotina. Convenhamos, para que citar tanto a indústria tabagista nesses dois últimos filmes da cine-série? É algum contrato ou coisa do gênero? A época em que fumar cigarro era legal não já passou? Enfim, esse é outro detalhe inútil da trama.

A deixa do filme nos leva a entender que o quarto será uma continuação direta. Sendo assim, não nos livraremos tão cedo da super-ginasta-Alice, nem dos cigarros, nem do roteiro lento e mal construído e, sinto informar, mais desrespeito para com os fãs e o público de cinema está por vir. “Resident Evil 3: A Extinção” é uma afronta à boa vontade do espectador.

Raphael PH Santos
@phsantos

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