Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 13 de janeiro de 2007

Uma Noite no Museu (2006): tão mediano que é difícil lembrar

Contando com milhares de efeitos impressionantes, apesar de uma história fraca, o filme se sustenta naquilo que vende, que são os efeitos especiais, já que a história principal do longa, além de nada criativa, serve apenas de pano de fundo para as atrapalhadas e as incontáveis realizações imaginárias da equipe técnica do filme.

Quem não já foi garoto e não teve o sonho de ficar preso em museu. Mas, claro, identifique aqui um museu digno, está bem? Com ossos de dinossauros, múmias e inúmeras outras imagens clássicas que quando crianças só víamos nas aulas de história. Se você já foi uma dessas crianças imaginativas, que rezava para conseguir ficar preso nos locais só para ver o que acontece depois que ele fecha, “Uma Noite no Museu” pode ser a realização de um sonho. Adulto, mas ainda com o espírito ingênuo e um tanto difícil de amadurecer, Larry Daley é um cara que não tem sua vida como sempre sonhou. Na casa dos trinta anos, já está separado, sua esposa está morando com outro cara, e ainda divide a guarda do seu filho com a mulher. Seu maior sonho é se tornar um pai digno e, por amor ao seu filho, acaba aceitando um emprego de vigia noturno no Museu de História Natural de Nova York. Achando que seria apenas mais um trabalho, ele acaba descobrindo que tudo é muito “maior” do que imaginava quando na primeira noite ele se depara com todas as criaturas do museu vivas e caminhando e perambulando e armando maior confusão dentro do local. Isso tudo por causa de uma maldição egípcia, que, desde 1952, habita o museu. Claro, a história não pára aí, e possui um pano de fundo batido, mas revelar mais detalhes da trama poderia, sim, estragar o filme, apesar de que os acontecimentos não sejam tão imprevisíveis assim.

Bom, se analisado por uma perspectiva do público alvo do filme, que para alguns pode parecer incrível, mas é infantil, o filme consegue ser digno de cumprir com todas as suas propostas. É um filme divertido, bobo, mas que irá aguçar com certeza a imaginação da criançada. Agora, claro, como projeto, que possa realmente se levar a sério, o longa não chega a ser um bom exemplar logo no início de 2007. O filme, na verdade, funcionava muito bem no seu original, uma história infantil ilustrada, que inclusive vendeu milhões de exemplares. Adaptado para o cinema, se for analisar, o filme não deixa de ser uma realização de toda uma equipe técnica, que coloca sua imaginação para voar, e esquece completamente que o projeto precisa de uma linha norte para que ele se desenvolva, senão acaba sendo mais uma pretensiosa produção para exibir grandes efeitos especiais. E acredito que aí entra o dedo de Chris Columbus.

Mesmo estando locado como produtor executivo, o roteiro de “Uma Noite no Museu” segue a linha de raciocínio de todos os traços dos filmes dirigidos por Columbus. Em sua vasta experiência, todos os seus filmes sempre se nortearam por três guias: sentimentos verdadeiros, ingenuidade, o processo de um adulto se mostrar digno perante o seu filho (ou, melhor dizendo, o processo de sentir deslocado em um meio). Todos eles podem ser analisados de perto em produções como “Esqueceram de Mim”, “Uma Babá Quase Perfeita” e até mesmo na adaptação de “Harry Potter”. O mesmo se repete na história que serve como desculpa para não transformar o filme em uma alegoria de personagens computadorizados: um pai sonhador, que não quer mais nada na vida além de provar ser uma pessoa digna e de respeito para seu filho (principalmente com a imagem paterna do novo namorado de sua esposa). Além, é claro, do processo que acontece durante o filme que o leva a esse “amadurecimento”, ser muito forçado e nada criativo, o filme, com medo de não ser entendido, ainda coloca em palavras nas bocas dos personagens (algo completamente dispensável) essa transformação.

Roteirizada pela dupla Robert Ben Garant e Thomas Lenon, a história não consegue deslanchar. A dupla se empolgou tanto com a idéia de trazer os objetos do museu à vida, fato este que eles sempre sonharam, já que confessam que foram crianças que sempre sonharam em ficar presas no museu à noite, eles simplesmente esquecem de fatos primordiais como não deixar furos no roteiro. Simplesmente criando a idéia da placa egípcia como responsável por trazer os objetos à vida, eles esquecem de colocar limites e até erram em informações contraditórias com relação à distância em que a placa tem que estar dos objetos para que eles criem vidas. Além disso, os personagens fracos, as “gags” (as piadas básicas) completamente batidas, trabalhando mais as reações ao impossível do que uma história que realmente dê um norte ao filme, tudo complementa para um roteiro que fica a desejar. Além disso, a criação de uma galeria de personagens em excesso acaba por deixar o filme muito mais raso, e a idéia de transformar a personagem de Ben Stiller como principal, acaba falhando.

Já que mencionamos o dito cujo, vejamos o elenco. Com um grupo espetacular que mixa a nova geração de bons atores com a velha guarda de Hollywood como Robin Williams, Ben Stiller, Dick Van Dyke, Carla Gugino, Bill Cobbs, o filme acaba por desperdiçar o talento dos atores para contar apenas com seus nomes no projeto, de forma a trazer mais público aos cinemas. A começar por Ben Stiller, a única diferença em seu personagem para seus outros trabalhos anteriores é que agora ele é um pai dedicado, afora isso, não há exatamente nada de diferente em sua atuação, embora seja um excelente ator para esse tipo de papel, mas se você já viu um filme de Stiller, você já viu toda sua capacidade de atuação. Carla Cugino, uma excelente atriz, simplesmente entra muda e sai calada nesse filme, sem explorar quase nada de sua personagem, a não ser o par romântico (ou o futuro par romântico) da personagem de Ben Stiller. Dick Van Dyke, Bill Cobbs e Mickey Rooney acabam se prendendo a um estereótipo que não convém falar aqui, mas também são mal aproveitados. Robin Williams, a verdadeira única graça do filme, consegue, com seu carisma, dar um pouco de vida a Teddy Roosevelt, mas não consegue ir além por limitações do roteiro.

Mas o que seria do filme se não fosse Shawn Levy? Mostrando ainda ser um mestre em direção, ele consegue trabalhar muito bem com um dos seus principais empecilhos: a computação gráfica, já que ele nunca havia trabalhado com projetos tão ambiciosos como “Uma Noite no Museu”. A sua direção, que mistura seres humanos, animais e computação gráfica, consegue levar o filme com uma leveza, que é realmente um dos poucos elementos que salva o projeto, já que em outros pontos o longa não conseguiu um destaque maior. Também, o gênero não era tão complicado para Levy, que já dirigiu projetos como “A Pantera Cor de Rosa” (remake), “Doze é Demais” e “Recém-Casados”. Mesmo não tendo um destaque muito maior do que nas suas outras produções, ele consegue entrar com enquadramentos que acabam fazendo a diferença. Infelizmente não havia muito que ele pudesse fazer para salvar o roteiro fraco, nem mesmo a criação de piadas engraçadas. Mas ainda assim, Shawn Levy parece ter feito o que pôde para levar o projeto às telas.

Mas um fato é certo nesta produção. Ela consegue ser boa e ruim ao mesmo tempo, levando a uma conclusão geral no nível mediano. Consegue, sim, preencher todos os requisitos ao que se propôs, porém, muitos poderão sair do cinema sentindo falta de algo a mais no filme. E acredite, esse algo a mais é verdadeiramente rir mais, já que o filme se trata de uma comédia. Entenda que há, sim, graça e alguns risos nos filmes, mas não o suficiente para ser lembrado como exemplar do gênero comédia.

P.S.: Não comentei sobre a trilha sonora, como geralmente comento, porque neste filme se ela existe, não há nenhum momento que mereça realmente aplausos ou seja marcante.

Leonardo Heffer
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