Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sexta-feira, 02 de setembro de 2005

Ameaça Invisível – Stealth

O filme é bom – ponto. Nada muito além do que isso. Muito previsível, não conseguiu reeditar os velhos tempos em que se curtiam muito dos filmes os quais enfatizavam aviões em sua aventura. Torna-se uma opção razoável para as telonas

A humanidade cumpre fielmente o seu fatal, constante e histórico movimento de evolução, atingindo, nesse final de milênio, monstruosa proporção no que pertine ao avanço tecnológico. Poder-se-ia considerar o advento do computador como o termo inicial e impulsionador da era da informática a qual se assiste implementar e proliferar-se com uma assustadora e incontrolável rapidez.

Interessante observar as conseqüências práticas que as revoluções as quais a civilização presenciou, proporcionaram a vida humana em todos os níveis tangíveis à compreensão. A Revolução Industrial já sinalizava mudanças profundas e inquestionavelmente irreversíveis no modo de viver do homem. Máquinas substituíam com brilhantismo e eficiência o trabalho braçal. A economia ascendia, a produção tornava-se cada vez mais satisfatória, a evolução das máquinas representava o espelho insuportável do homem que se descobria substituível. Deixando esse papo um pouco de lado, vamos ao filme e suas vias de fato.

Vemos um bom enredo. A película conta a trama de três ótimos pilotos da Marinha Americana. Eles estão em um projeto de testar super-aviões e novas tecnologias para tal fim. Para estar nesse lugar lutaram muito, afinal a concorrência foi grande. Nesse caso eles são os melhores entre os melhores. Apressado em colocar seus planos em prática, o Capitão Sam Shepard pula algumas fases do projeto e resolve colocar um novo piloto na equipe. Isto causa indignação entre os três colegas, pois eles não gostariam de aceitar um quarto elemento em seu time. O que causa mais indignação, principalmente no líder do grupo, o piloto Ben Gannon (Josh Lucas; "Hulk", "Uma Mente Brilhante") é o fato do quarto companheiro não ser um ser humano, mas sim um avião com inteligência artificial, deixando de lado a necessidade de ser guiado por alguém, porem precisa desse alguém para aprender, fazendo assim um vasto banco de dados com táticas de vôo. Entre o trio – que é complementado pelo ator Jamie Foxx ("Ray", "Colateral") e a bela Jessica Biel (de "Blade Trinity" e do remake de "O Massacre da Serra Elétrica") – ainda há os que ficam divididos perante a idéia e eles vão perdendo cada vez mais a confiança por conta das manobras e ‘decisões’ arriscadas da máquina.

Os acontecimentos se desenrolam de forma simples. Com alguns clichês o filme perde a graça e torna-se previsível. A idéia de um avião voar sozinho não é nada extraordinário, pois redes neurais estão sendo implementadas em pesquisas pelo mundo a fora, como se toma Tylenol para dor de cabeça. Isso já é fato e talvez, futuramente, o medo do piloto Ben Gannon de dividir seu espaço com uma máquina ‘inteligente’, seja o mesmo que o nosso. Tal como a algum tempo atrás, quando pensávamos ser substituídos (e estamos gradativamente) pelas mesmas, só que não tão inteligentes e autônomas. Mas o próprio filme deixa passar que os maquinários ainda dependem e muito de nossas funções como seres vivos.

No desenrolar da projeção, algumas coisas interessantes acontecem (a maioria, simplesmente para diversão não-cômica), entretanto, peca por não ter uma apresentação melhor da tecnologia do avião o que causa aquele famoso suspiro de ‘ô mentira grande’ nos espectadores. Talvez se fosse mais bem explicado, melhorasse a aceitação de alguns. Por outro lado, se isso fosse feito, seria gasto um bom tempo, tornando o filme sacal e cansativo, mesmo sendo dirigido por Rob Cohen. O diretor, acostumado com películas rápidas e densas de aventura, soma essa com outras de sua carreira, como ‘Velozes e Furiosos’ e ‘Triplo-X’, ambos do grandalhão Vin Diesel. Note bem que tal filme não (lê-se, dificilmente) somar-se-á na lista dos bons de ação veloz. Muito menos na que conta com o sempre lembrado ‘Top Gun – Ases Indomáveis’; clássico. O resultado final é um certo tipo de lição moral no tema ‘máquina/homem’ em tom de aventura-pipoca.

O trio de atores que compõem os pilotos da missão, juntos, fica interessante. As falhas de uns, são compensadas por acerto de outros. O líder, Ben Gannon, encarna um personagem um tanto quanto amostrado e bastante garanhão; Josh Lucas. Até aí tudo bem, fica fácil, mas quando se exige um pouco mais do ator, ele chega a demonstrar algumas vaciladas. Sua paquera e companheira de time, Kara Wade, encarnada por Jessica Biel, está bem interessante. O problema, mais uma vez, é quando se precisa ser mais do que interessante. Por sua vez, Jamie Foxx apresenta-se bem. Lembrando que o ator ganhou prêmios pelo seu papel em ‘Ray’. Para esse filme, foi convidado antes de isso acontecer. Do contrário, ele não teria aceitado participar, tendo em vista que o filme não é nada para prêmio algum.

Voltando ao assunto tocante à tecnologia…
Indubitavelmente, a geração atual vive e sobrevive a maior das revoluções, um crescimento tecnológico já há muito fora do controle humano, um desafio interessante, necessário e rigorosamente indispensável à alma do homem moderno. Faz-se relevante, portanto, conhecer o fenômeno, procurar entender os seus mecanismos o mais amplamente possível. Para que seja possível uma coexistência harmoniosa e, acima de tudo, inteligente entre o homem e a máquina, ou ainda, entre o criador e a criatura. Enfim, a alta tecnologia deve ser encarada como uma aliada muito positiva à civilização, um fator imprescindível à construção da história e evolução humanas. É preciso fruir com inteligência de todos os frutos dessa evolução científica, conhecer os seus mecanismos, admitir seus limites, implementar suas imperfeições, encarar a sua força e se preparar pra um futuro repleto de ainda mais conquistas, avanços e prosperidade.

Que tal fazer um exercício de memória sobre o tema? Vamos lá: alguma vez alguma máquina de refrigerante já ‘comeu’ uma moedinha sua? Como você se sentiu? Alguma vez alguma porta giratória de banco já te fez retornar tantas vezes que você teve que tirar até a sua aliança de ouro que você não tira nem pra tomar banho? Qual foi a cor do seu sorriso para as pessoas que te aguardavam na fila? Alguma vez você já tentou fazer um saque de um Caixa Eletrônico às 21:50 e ele te disse, curto e grosso, “Terminal Em Manutenção”? O que você falou pra ele? Pois é… Em momentos meigos assim eu sempre me lembro do Pato Donald quando tinha aqueles acessos de cólera e arrancava as próprias penas. E eu que nem tenho penas…

Cinema com Rapadura Team
@rapadura

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