Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 10 de novembro de 2005

Callas Forever

Os últimos dias de uma grande estrela. É isso o que “Callas Forever” mostra. O fim da carreira de umas das maiores divas que o mundo já conheceu é misturado com a ficção, fazendo do filme uma trama sobre o que teria sido o final da vida dessa mulher que foi um dos nomes mais marcantes da história da música lírica.

Quem não conhece e nunca ouviu falar de Maria Callas demora um pouco mais para entrar no clima do filme e se situar, já que o roteiro não pretende ser biográfico, mas sim uma fantasia envolvendo o fim da vida da cantora, quando passava seus dias reclusa em seu apartamento em Paris, depois de ter terminado um romance com um dos homens mais ricos da história, o armador grego Aristóteles Onassis. Até aí a história é inteiramente verídica. A ficção do roteiro começa quando um ex-empresário e amigo de Callas, Larry (Jeremy Irons) comovido pela situação decadente da diva lança-lhe uma proposta: filmar as grandes óperas interpretadas por ela em sua época gloriosa e voltar em grande estilo para o show business.

Maria Callas não aceita a proposta de imediato, já que está convencida de que sua voz é apenas uma sombra do que foi no passado – o que realmente era verdade – mas quando surge a idéia de filmar a cantora dublando a si mesma em velhas gravações, a veia artística fala mais alto e Maria Callas acaba embarcando no projeto de encenação da ópera “Carmen”, uma das mais famosas de todos os tempos.

O filme é repleto de referências à carreira da diva, que só quem conhece pode reconhecer, como quando Callas faz cara de reprovação ao ouvir o nome de Renata Tebaldi, também cantora lírica, tida como sua rival no mundo artístico. É nesse ponto em que os “não-conhecedores” da cantora saem perdendo na história, embora isso não chegue a causar prejuízos ao entendimento e apreciação da película.

O diretor, Franco Zeffirelli, teve um carinho especial por essa produção, pois era amigo de Maria Callas e a conheceu profundamente (dizem que o personagem de Jeremy Irons foi inspirado no próprio Zeffirelli), por isso talvez podemos notar o cuidado com que ele conduz o filme quando mostra os bastidores por trás da aura de glória da estrela. O lado, digamos “histérico” de Maria Callas não é destacado, embora fique claro o seu temperamento forte, “como o de toda grande estrela” diz o diretor.

A trilha sonora de “Callas Forever” também é um detalhe à parte. Basicamente composta pelas grandes árias das mais famosas óperas já compostas.

Em termos de elenco, podemos ver uma reunião de grandes atores europeus. O inglês Jeremy Irons, sempre versátil, interpreta o empresário/amigo homossexual de Callas. A também britânica Joan Plowright (talvez mais conhecida como a velha rica insuportável de “A casa caiu”) está num papel modesto, mas não deixa de mostrar seu talento de veterana. E a francesa Fanny Ardant dá um show como Maria Callas, de tal forma que por vezes pensamos estar vendo a própria cantora na tela.

O encantamento maior do filme, penso eu, está presente ao mostrar aquela que é tida como a maior cantora lírica de todos os tempos, despida da aura de glória que a acompanhou durante os dias dourados de sua carreira. Maria Callas, no fundo, era apenas Maria Kalogeropoulos (seu nome de batismo), a garotinha que nasceu na Grécia, viveu um pouco em cada canto do mundo e no fim da vida percebeu que não pertencia a nada nem a ninguém. Só lhe restava um nome e a imagem de diva, a quem todos admiravam, mas ninguém realmente conhecia.

Enfim, há quem diga que o filme ficou um tanto quanto “açucarado” pelas mãos de Franco Zeffirelli, mas talvez a história pedisse exatamente isso. “Callas Forever” é, acima de tudo, uma homenagem póstuma a Maria Callas, no mínimo, bastante merecida e digna de ser prestigiada.

Cinema com Rapadura Team
@rapadura

Compartilhe

Saiba mais sobre