Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 29 de dezembro de 2005

Guia do Mochileiro das Galáxias, O

Em suma, um filme divertido, competente, apaixonado. Uma história como essa merecia estar nas telas do cinema. Uma das histórias mais malucas de que se tem noticia.

O livro de Douglas Adams foi escrito em 1979, e conquistou os leitores pelo quase sadismo de suas páginas, de humor escrachado. Desde então, o autor veio tentando através dos anos fazer uma versão cinematográfica para o livro. Diversas fontes (leia-se, a internet) que consultei mostraram que Ivan Reitman, Bill Murray, Dan Aykroyd, Jim Carrey, Jay Roach, Spike Jonze e Michel Gondry queriam ter adaptado a obra, e até mesmo Adams havia feito um roteiro. Pois bem: a Disney finalmente pegou o projeto, mas Douglas Adams não o viu concretizado. Morreu de infarto em 2001. Depois de tanta demora, os fãs ávidos esperavam uma excelente adaptação, e enquanto o filme não chegava às telas, o trailer do filme (com a música "What a Wonderful World") deixava a todos interessados. O filme saiu, e muitos se decepcionaram.

A história conta como Arthur Dent (Martin Freeman), um homem comum que reside na Terra, acaba sendo salvo da destruição do planeta por seu melhor amigo, Ford Prefect (Mos Def), que na verdade é um extraterrestre. Conseguem carona com os ETs que destruiram o planeta [para construir uma via expressa interplanetaria], que torturam seus inimigos usando como arma… a sua poesia. Sorte a deles que escapam e acabam dentro da nave Coração de Ouro, cujo capitão é Zaphod Beeblebrox (Sam Rockwell), ninguém menos que o presidente da galáxia, que se sequestrou e furtou a nave. Aproveitando-se da carona, eles viajam juntos com Zaphod (passando por muitos problemas) até o planeta Magrathea, onde está o Pensador Profundo, que tem a resposta da pergunta que há séculos todos querem saber: qual é a pergunta que pode explicar a Vida, o Universo e Tudo o Mais e cuja resposta é 42. Para chegar até lá, é fundamental que usem o livro que tudo sabe: o guia do mochileiro da galáxia.

Entendeu? Não? Como diz o lema do livro: "Não entre em pânico". O filme pode parecer um tanto quanto estranho escrevendo assim, mas não se preocupe. Quando assistir, vai ser pior. E isso é ótimo, porque quando menos você entende, mais você se diverte. Como no planeta onde qualquer pessoa que pense toma um golpe de pá na cara. É engraçado, divertido, mas não se entende bulhufas. Pelo menos não imediatamente. Para aqueles que não leram o livro, como eu, fica complicado. Mas logo se acostuma com o ambiente e tudo fica mais fácil.

As atuações estão ótimas. Martin Freeman e Mos Def estão muito bons, há uma relação boa entre eles. Rockwell está melhor ainda, como o tresloucado presidente da galáxia de duas cabeças, e completamente abilolado e com crises de grandeza. As participações especiais dão conta do recado, como Stephen Fry como o narrador, Helen Mirren com a voz do Pensador Profundo – hilário! – e John Malkovich como Humma Kavula (personagem criado por Adams para o filme) é um caso à parte. Aparece pouco, mas o que aparece vale a pena. E o melhor de todos deixei para o final: o robô depressivo Marv, que tem a voz de Alan Rickman, tem as melhores cenas do filme. Nervoso, pessimista, maníaco-depressivo, Marv conquista o coração das pessoas, talvez até porque muitas delas se identifiquem com ele. Meu caso.

A direção de Garth Jennings (oriundo dos videoclips) é típica de iniciante promissor: não exagera, mas peca pela contenção. Muitas das cenas poderiam ter mais força se o diretor fosse mais experiente. Um Zemeckis no comando faria um "estrago" (no bom sentido) melhor. E o filme poderia ser um pouquinho maior. Mas também não chega a ser um terror de diretor. Em outras cenas, nota-se o talento que provavelmente vai ser aperfeiçoado com o tempo, como se pode ver na criativíssima cena inicial com os golfinhos.

Em suma, um filme divertido, competente, apaixonado. Uma história como essa merecia estar nas telas do cinema. Uma das histórias mais malucas de que se tem noticia. É uma pena que muitos fãs do livro reclamem, dizendo que a adaptação não foi fiel ao livro. Sou suspeito para falar já que não o li, mas vou fazê-lo e analisarei pelo ponto de vista de quem leu. Mas como sugere o Guia, não vou entrar em pânico…

Cinema com Rapadura Team
@rapadura

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