Cinema com Rapadura

OPINIÃO   domingo, 08 de janeiro de 2006

Marcha dos Pingüins, A

Abrindo o ano com chave-de-ouro, temos a "A Marcha dos Pingüins", documentário premiado em todo o mundo, ultrapassando médias e blockbusters como "O Quarteto Fantástico" e "Guerra dos Mundos". Mas o que esse documentário possui de distinto dos outros que conhecemos?

Na inóspita Antártica, encontramos os únicos sobreviventes do frio devastador: pingüins imperadores. Mesmo com todo o drama de ter que sobreviver no local, vemos uma linda estória que se repete há milênios e que se dá início com a primeira marcha destes pingüins, que é a caminhada em busca do par com quem cada um deles terá um filhote e conviverá de forma leal.

Nesta caminhada, instintivamente, machos e fêmeas seguem por dias, até que, como por mágica, todas as caravanas de pingüins se encontram, no mesmo horário e sítio. Por haver machos em minoria, as fêmeas têm de lutar para conseguir o seu par, e a partir do resultado disso, um lindo balé romântico é encenado, com um “clima” que dá inveja até nos dramas românticos de Hollywood.

“A Marcha dos Pingüins” poderia ser classificado como qualquer documentário exibido em canais de ciência da televisão paga, se não fosse mostrado em primeira pessoa. Sim, vozes dublam os pingüins. Na França, país em que o documentário foi feito, as vozes são de Romane Bohringer, Charles Berling e Jules Sitruk. A versão estadunidense conta até com o renomado ator Morgan Freeman na dublagem dos pingüins machos. Talvez fosse mais interessante ouvir os simpáticos animaizinhos como na versão original, pois, pelo menos para mim, foi impossível ouvir as vozes de Patrícia Pillar e Antônio Fagundes sem imaginar os seus respectivos rostos. O ideal, talvez, seria a contratação de dubladores menos conhecidos pelo público brasileiro, ou até dubladores renomados, porém mais versáteis.

Assim como no onírico documentário “Ser e Ter”, também francês, “A Marcha dos Pingüins” nos traz muitas mensagens, que podem ser retiradas como exemplos e aplicadas como lições. Como a não-diferenciação dos sexos, no momento em que fraca e depois de rebentar, a fêmea parte numa longa e árdua jornada em busca de comida, para poder alimentar-se e alimentar o filhote. Durante todo esse tempo, o pai é encarregado de cuidar do ovo, aquecendo-o do frio, até a mãe voltar, para que, finalmente, chegue a sua vez de partir em busca do oceano para que possa pescar. Outro exemplo disso é quando, em meio a uma brusca e aterradora tempestade de gelo, todo o grupo se acolhe, formando juntos um imenso e quase que imbatível, “casco de tartaruga”. Assim, os animais ficam mais protegidos e aquecidos, ao mesmo tempo em que protegem os seus bebês. Em momentos como estes, ou quando surgem os predadores, o espectador surpreende-se com o coração batendo mais forte, emocionado, e torcendo por aquelas criaturas que inspiram docilidade.

Luc Jacquet, cineasta responsável por “A Marcha dos Pingüins”, teve a idéia de realizar o filme após ter aceitado uma proposta ousada de passar 14 meses gravando pingüins na Antártica, em 1992. Luc, que também é biólogo, ao passar por essa experiência, tirou a conclusão de que a marcha dos pingüins imperadores era composta de amor, vida e morte, e que ele deveria explorar mais essa raça de animais. Animais em locais gélidos sempre foram de seu interesse: em 1993, trabalhou como câmera do filme suíço The Congress of the Penguins e seu primeiro filme foi Sea Leopard, Lord of the Ice. “A Marcha dos Pingüins”, que em francês é representado como “A Marcha dos Imperadores”, é o primeiro longa-metragem de Luc Jacquet, e possui a peculiaridade de mostrar tudo pela perspectiva do animal.

Alguns momentos no filme foram bastante marcantes, como a aurora boreal, e como o acasalamento dos animais, que é mostrado de forma bastante carinhosa, ao acompanhamento de uma linda música. A trilha sonora é da cantora Émilie Simon, 24 anos, que, coincidentemente, gravava uma música chamada “Ice Girl” na mesma época em que foi convidada a elaborar a trilha do documentário. A canção também pode ser conferida no filme. A jovem, que já trabalha como assistente de som há tempos, contou a colaboração do engenheiro de som Markus Dravs, que já trabalhou com Björk, o que talvez tenha deixado as obras das duas cantoras repletas de semelhanças.

No mais, ficam as reflexões acerca da eterna marcha dos pingüins imperadores em busca da sobrevivência. E, ao contrário do que alguns comentaram sobre o filme humanizar os animais, pergunto: será que somos capazes de tornarmo-nos pingüins?

Cinema com Rapadura Team
@rapadura

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