Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 17 de novembro de 2005

Primavera, Verão, Outono, Inverno… E Primavera

Esse é com certeza um dos melhores filmes "estrangeiros" (leia-se filmes não nacionais ou em língua inglesa) do ano, se não for o melhor

Esse é um filme que me bateu uma enorme curiosidade de ver depois do que li em um Fórum de internet. Mas nunca pensei que iria assisti-lo no cinema, ainda mais porque fiquei interessado em vê-lo há mais de dois meses, e desde aquela época só estava passando em uma sala de cinema. E por intermédio divino isso continua, dando-me assim a oportunidade de conferi-lo na tela grande. Devo dizer que o filme me surpreendeu, esperava dele apenas o excelente visual, mas não, o filme tem um belo conteúdo – mesmo sendo lições de moral um pouco ultrapassadas, mas não deixam de ser belíssimas as maneiras que esses valores são mostrados. Esse é com certeza um dos melhores filmes "estrangeiros" (leia-se filmes não nacionais ou em língua inglesa) do ano, se não for o melhor.

Muito do poder do filme se encontra na belíssima fotografia, que chega a ser melhor a cada momento que se passa. A paisagem é linda, inebriante, um lugar que dá vontade de morar mesmo sendo completamente isolado de tudo. E isso nota-se bem pelas imagens postadas acima. Sinceramente, são poucas as fotografias de tal qualidade, ou mesmo o cenário. E mesmo se o filme não tivesse conteúdo, valeria só pelas fantásticas imagens que o filme proporciona. Pode-se até dizer que o filme é técnico, pois tudo gira em torno disso, mas é muito mais que isso. A trilha sonora é esplêndida. Tecnicamente impecável, primorosamente lindo.

Kim Ki-Duk é um bom diretor, sabe conduzir bem, e tem sim seus méritos. Escreveu um ótimo roteiro sobre um monge velho que está a ensinar um jovem a se tornar um monge, a aprender como viver no mundo árduo e corrompido, esse é o motivo da solidão. Cada estação do título se refere a uma mudança na vida do monge novo, a cada nova experiência, percorrendo todo sua vida. Como se a vida e as estações fossem ciclos intermináveis, e é isso que o filme quer mostrar. De uma maneira sensível e exploradora da cultura oriental. O que se renova a cada estação? o que de novo acontece nelas? As fases da vida são como estações.

O que o homem aprende com os outros? Porque há a necessidade de haver as descobertas por conta própria mesmo se já disseram o que ocorreria? Porque para um possível arrependimento é necessário que você passe pelo mesmo? Todos tem a mesma resposta, e a celulóide explora exatamente isso. A cada fase de sua vida você aprende algo, algo que pode ou não representar um grande amadurecimento nela, uma mudança drástica, nunca se sabe o que está por vir. A calamidade que é o ser humano tem limites infindáveis variando por cada um. Todos são diferentes, mas a essência é a mesma. É inevitável afirmar que seremos iguais por todas nossas vidas e que nada pode nos abalar ou alterar de alguma maneira para que não mudemos de qualquer forma, nem que seja uma sutileza. O que é destino? Aquilo que foi pré-determinado pelo ser supremo ou a conseqüência de nossos atos? O questionamento de nossa vida não é sempre algo que possa ser respondido, ninguém sabe melhor que nós da própria vida, e isso não significa que saibamos de tudo dela. A película é uma análise do comportamento humano, de seus questionamentos, de suas atitudes. Porque somos de tal maneira e não de outra? Por que agimos mais pelo emocional que pelo racional? Por que não ouvimos os outros?

Oh Yeong-Su interpreta o monge velho. Ele que ensina o garoto. Ele é um excelente ator. Fatos. Mas o filme não é formado de exatidões, e de perfeições, por mais que seu visual diga que sim. Conceitos ultrapassados, mas nunca tão bem explícitos. A vida, o ciclo, mostra que por mais que andemos e vaguemos nesse mundo a procura de algo novo, vai sempre terminar da mesma maneira…só, vivendo num mundo seu, esquecidos pelos outros. Por mais que tenhamos milhares de amigos e sejamos o supra-sumo da sociedade, vamos morrer engasgados pela solidão. E o monge velho sabe de tudo isso, ele é um sábio, um místico, que mesmo assim se vê num fiasco e frustração.

O trecho que mais gostei foi o do outono, provavelmente por ser o mais poético. Em que após o esquecimento das disciplinas e o conhecimento do mundo real, há a volta as origens. Onde a melhor cura para o ódio é proferindo esse ódio em algo focado, o relaxamento. Não quero ir além desses trechos subjetivos para não estragar quem não viu, portanto não vou mais além. Mas tem outras cenas que gostei bastante, como o primeiro aprendizado do menino, que se debulha em lágrimas ao ver a cobra.

Quero revê-lo, só que não entendo o coreano. Devo revê-lo por lembrar do que acontece e pelas maravilhosas paisagens. Um filme que vale muito a pena ser visto no formato digital e cristalino; as cenas se tornarão mais conquistadoras e o filme provavelmente mais encantador.

Cinema com Rapadura Team
@rapadura

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