Cinema com Rapadura

OPINIÃO   sábado, 11 de fevereiro de 2006

Terra Encantada de Gaya, A

Nada de inteligente. É um filme infantil mesmo, porém trás consigo alguns assuntos que um dia alguém sempre chega a se perguntar. Com uma equipe de talento, A Terra Encantada de Gaya, poderia ter sido melhor. Para a criançada é legal e para os fãs de dublagens ele mostra bons momentos, por incrível que pareça.

O ponto forte de Gaya é a participação como diretores e roteiristas da dupla Lenard Fritz Krawinkel e Holger Tappe. O primeiro tem um currículo muito bom e tem fama de, ao entrar de cabeça em uma nova forma de animação, chegar ao máximo que aquilo pode transmitir. Quando surgiu a febre de fazer animações live-actions (captura de movimentos humanos para a feição do personagem), Lenard Fritz entrou verdadeiramente no clima, tanto que seus últimos projetos são seis curtas e longas com essa tecnologia. Isso nos cabe dizer, pois a tecnologia da animação de Gaya é nova. Ela é alemã e foi feita propriamente para esse filme. Logo, ninguém melhor do que Fritz para inicia-la na industria cinematográfica. Seu companheiro é iniciante, mas nos bastidores demonstrou talento.

A Terra Encantada de Gaya é um programa de TV passado em um mundo fantástico, repleto de paisagens paradisíacas, cores e os mais variados seres. Nele vivem o corajoso Zino (Márcio Garcia), o trabalhador Boo (Wellington Muniz) e Alanta (Sabrina Sato), a linda filha do prefeito, além dos terríveis Snurks: Galger (Marcos Chielsa), Zeck (Rodrigo Scarpa) e Bramph (Carlos Alberto). Quando a pedra mágica, o elixir da vida de Gaya, desaparece, os Gayanos entram em atrito com os Snurks. Repentinamente eles são arrancados de seu mundo para outra dimensão, na qual precisam se unir para sobreviver.

O roteiro, assinado por Don McEnery e Bob Shaw (Vida de Inseto), dois da longa equipe da Disney/Pixar, é um pouco diferente. Mas só um pouco mesmo! Primeira coisa que eu lembrei foi de Space Jam. Sabe aquele lance de personagens saírem das telas e irem para o mundo real. Pois é isso! Gaya é um mundo – justificando o título – encantado, onde Boo e Zino disputam contra os terríveis Snurks. Além deles, a filha do prefeito, Alanta, quer mostrar que pode ser independente. Esse mundo fantástico é mantido pela dalamite (tipo uma pedra energizadora). Na verdade isso é um roteiro de um desenho animado que passa em um mundo paralelo (no caso o real) e tem como escritor o Sr. Albert Drollinger. Entretanto, um dia, um cientista frustrado resolve trazer esses pequenos personagens para esse mundo real e, de vez, destruir o tão famoso desenho animado (uuuh, que plano maligno).

Esse é um típico roteiro bem Disney mesmo, mas, se prestada a devida atenção, ele trás consigo algumas reflexões. Lógico, muito minúsculas, mas que se comentado com crianças, podem valer a pena, pois é abordada a questão de livre-arbítrio: o livre pensar e livre agir. Podemos comparar o Sr. Albert como Deus, por exemplo, e os diálogos mesmo mostram que ele é como um criador para aquelas criaturinhas.

Apesar dessa diferenciação o filme tem a mesma leva de clichês que são observados em quase todos os filmes do gênero. Nada de diferente e nada de muito importante, mas que se passado a um olhar mais crítico, pode ser chato. Todavia, é um filme para o as pessoas miúdas e essas não estão muito preocupadas se já sabem mais ou menos o que vem por aí.

Outra coisa chata que, se passada pelos menos olhares mais atenciosos se torna chata é a edição. Convenhamos, do nada cortam a cena e já se inicia algo mais à frente. Mas é de uma forma tão descarada que não soa natural, tampouco normal. Zero total nesse quesito. E olha que é algo difícil de se observar, mas nesse filme foi o que mais me chamou atenção.

O que também chamou bastante atenção foi a dublagem, cuja grande parte feita pela turma do programa Pânico na TV, alterna entre altos e baixos. Por incrível que pareça esse é um resultado satisfatório, haja vista que os dubladores não são profissionais e, ainda menos, pois a maioria é humorista. Sabrina Sato é o ponto mais baixo nesse aspecto. Para quem pensa que só é possível escutar os “É verrrdade!” dela no programa Pânico na TV, se engana. É só assistir ao filme e comprovar. A ex-BBB não deveria nunca ter passado perto desse filme. No original a voz é feita pela britânica Emily Watson. Eu não escutei essa, mas com certeza o sotaque da moça passa muito longe (e de forma melhor) do que o paulista de Sabrina. Poupem-me! Por outro lado, também há surpresas dentre os dubladores. Wellington Muniz, o Ceará (comedor de Rapadura), dá vida à voz de Boo de forma muito boa, só escutando pra ver. Carlos Alberto, de tantos personagens, o Mendigo, é o melhor disparado. O humorista realmente encarnou o sentido da coisa e fez uma voz que é um show a parte. Ele dubla magistralmente o grandalhão Bramph. Uma boa e grata surpresa. Parabéns mesmo para o trabalho de Carlos Alberto.

É importante observar a qualidade dessa nova tecnologia. Para ser a primeira vez que ela é utilizada até que está boa. Com certeza, uma evolução que acontece naturalmente com as tecnologias hoje em dia, a tornará bastante utilizada no meio das animações. O que falta muito a ela é o expressionismo, mas com um esforço ali, outro dinheirinho acolá, rapidinho ela se fixará no mercado. Quando eu digo mercado, isso inclui também o dos videogames, para que não pensemos que ela nunca mais foi utilizada em filmes.

Agradável para uns e nem tanto para os outros, o filme se torna mediano. Vale a pena conferir para aqueles que são fãs de animações, pois o longa é um ponto de início para a tecnologia usada. Para outros que duvidaram da dublagem (como eu) é também interessante assisti-lo, mas, por favor, quando ver que a personagem Alanta for falar, tapem os ouvidos e se protejam dos chatos “É verrrrdade!”.

Cinema com Rapadura Team
@rapadura

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