Cinema com Rapadura

Críticas   quinta-feira, 14 de setembro de 2017

Amityville – O Despertar (2017): A fórmula que precisa ser renovada

O susto nem sempre é a forma mais inteligente para criar uma atmosfera de tensão, mas é a mais fácil. Quando um roteiro se prende demais nesse conceito de susto, perde a oportunidade de criar uma trama envolvente. É nesse que o terror do filme começa a cansar mais do que assustar.

Há uma beleza no terror que é só dele. Essa beleza refere-se essencialmente ao medo. Os alemães retrataram o medo que a 1ª Guerra Mundial trouxe, através das criaturas bizarras e do cenário confuso do expressionismo alemão. Os italianos apostaram nos crimes violentos para dar origem aos Giallos, enquanto os japoneses levaram seu riquíssimo folclore junto com o Kabuki (estilo de teatro japonês, normalmente ligado ao drama) para os cinemas. Hollywood já passou por várias fases, mas o medo sendo causado pelo susto, ainda é uma ferramenta padrão.

Amityville: O Despertar” utiliza – mais uma vez – eventos sobrenaturais famosos para tentar conquistar o público. Na trama, uma família decide se mudar para uma nova cidade a fim de oferecer um melhor tratamento para James (Cameron Monaghan, da série “Gotham”) que após um acidente teve paralisia cerebral. Porém, eventos estranhos passam a ameaçá-los.

Seria injusto dizer que este filme se foca apenas no susto simples. É muito fácil colocar uma criança gritando na tela para fazer o público dar um pulinho na poltrona. “Amityville: O Despertar” consegue criar uma atmosfera tensa em diversos momentos. Até mesmo os jumpscare (sustos causados por um acontecimento repentino) conseguem surpreender.

Dirigido e roteirizado por Franck Khalfoun (“i-Lived”), o longa não tem história muito envolvente. Primeiro por se tratar de um tema manjado (casa assombrada por espíritos) e com elementos que até quem não é fã do gênero conheces muito bem (a mãe que demonstra não se importar com os eventos, a filha rebelde, a filha menor que é inocente e está sempre confusa, um filho doente, o cachorro que consegue ver alguma coisa). Além disso os eventos de Amityville já foram abordados outras vezes. Não seriam problemas necessariamente ruins, e há uma tentativa de entregar algo original, mas não vai muito além da tentativa.

Belle (Bella Thorne, de “Fica Comigo”), a filha mais velha e protagonista do filme, tem o papel de explicar a história. Sua mãe, Joan (Jennifer Jason Leigh, de “Os Oito Odiados”), optou por não contar que a nova residência tinha um histórico negativo. Dessa forma, o público descobre os detalhes juntamente com a jovem e cabe aos colegas de escola explicar os detalhes e o público não tem tempo para tentar desvendar os mistérios do local. Em determinado momento, um dos colegas mostra o DVD do filme “Horror em Amityville”, de 1979, para ajudar na narrativa. Tratar os demais filmes sobre os acontecimentos em Amityville como ficção e usar os eventos reais da casa (os assassinatos realizados por Ronald DeFeo Jr. e os eventos da família Lutz) criam uma esperança de algo novo, mas o roteiro opta por utilizar a ideia apenas para justificar alguns eventos da trama.

Ainda é possível sentir o peso que a montagem carrega. O filme usa o Sol como referência: durante o dia temos as explicações, durante a noite os eventos sobrenaturais. Quando Belle precisa ser apresentada à uma explicação, o corte muda para uma cena rápida na escola, depois volta para uma cena noturna, nos entregando um novo susto e uma nova pergunta. Todas essas mudanças repentinas e apressadas quebram o ritmo do filme. Existe também uma inconsistência no roteiro quando usa um determinado horário para que os eventos comecem. Até ser apresentada essa informação, eventos estranhos aconteciam a qualquer momento. Porém, depois que sabemos o horário em que os crimes originais ocorreram, os eventos seguem essa nova premissa.

Franck Khalfoun (“Maníaco“) tem direção bem constante. A câmera consegue mostrar exatamente o que precisa ser visto, sem criar pontos cegos para esconder um possível susto. Assim, quando alguém desce uma escada, o público tem uma visão ampla do que está acontecendo, e quando é necessário ver o que algum personagem está vendo, a câmera muda o ponto de vista. Quanto aos sustos, por mais que alguns sejam previsíveis, eles não repetem exaustivamente a mesma lógica, nem se sustentam na trilha sonora. Mesmo havendo momentos em que a trilha cresce para antecipá-lo, em vários momentos, uma visão surge sem que seja esperada. Mas os pontos fortes são aqueles que criam uma tensão, quando o público ainda não sabe exatamente o que esperar.

“Amityville: O Despertar” não é um filme de todo ruim. Existem alguns méritos, porém faltou a coragem de trabalhar melhor a história e deixar que algumas perguntas fossem respondidas pelo público. As viradas na trama, principalmente a que é usada como justificativa para a mudança de residência em Amityville, não convencem muito bem, todavia o verdadeiro problema do filme está no medo. Usar os acontecimentos reais na narrativa e transformar os outros filmes em alegorias ficcionais foram duas justificativas válidas para reforçar o sentimento de que há algo de verdadeiro no que está sendo mostrado. O filme tropeça ao não abraçar totalmente essa ideia e recorrer ao susto como forma de criar tensão.

Robinson Samulak Alves
@rsamulakalves

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