Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 23 de junho de 2016

Independence Day – O Ressurgimento (2016): o fim do mundo, de novo

Mal montado, com um roteiro cheio de rombos e, acima de tudo, pouco divertido, essa continuação não faz jus ao longa original.

098589Em 1996, o “Independence Day” original teve a maior bilheteria daquele ano, superando outros blockbusters como o ótimo “Missão: Impossível”. O longa conseguiu isso, apesar de suas diversas falhas, por ser um filme extremamente carismático e divertido, abraçando o lado canastrão da sua premissa e não se levando muito a sério.

Vinte anos e diversas tentativas depois, eis que temos a primeira sequência daquele longa, com este “Independence Day – O Ressurgimento”, reunindo novamente o diretor Roland Emmerich e seu parceiro no crime original, Dean Devlin. Os dois, também roteiristas do primeiro filme, assinam o guião desta produção com outros três escritores, os relativamente novatos James A. Woods e Nicolas Wright e o operário-padrão James Vanderbilt (“O Espetacular Homem-Aranha”, “O Ataque”).

Duas décadas depois do conflito de 1996, as nações humanas usaram a tecnologia dos aliens para criar um sistema de defesa global, mas os invasores retornam ainda mais fortes, causando mais devastação e deixando o futuro da Terra nas mãos de um grupo que reúne antigos e novos personagens.

É importante destacar que a produção teve cinco roteiristas diferentes para salientar um dos principais problemas desta continuação, que é a sua absoluta falta de identidade. O primeiro filme encarnava com gosto o espírito dos filmes B da década de 1960 turbinado com um orçamento de primeira grandeza, além de contar com um Will Smith no auge de seu timing cômico e capacidade de improvisação (basicamente toda a antológica cena de Smith carregando um alienígena pelo deserto foi improvisada).

Já este “Independence Day – O Ressurgimento” não sabe exatamente o que quer ser. Seu maior acerto é mostrar o quanto o 2016 de sua narrativa difere daquele em que vivemos e mostrar – mesmo de maneira inconstante – como o cotidiano daquele mundo mudou por conta da guerra de 1996. Ao mesmo tempo, o filme “referencia” (aham) descaradamente produções como “Aliens – O Resgate”, “Godzilla”, “Macross” e “Patrulha Estelar”, jamais encontrando uma voz própria, parecendo mais um monstro de Frankenstein de franquias sci-fi – até a trilha sonora, em alguns momentos, parece tirada de “Star Wars”.

Além da invasão alienígena, Emmerich, Devlin e companhia entopem a projeção com plots mal-ajambrados, como a rivalidade pobremente estabelecida entre os pilotos Jake (Liam Hemsworth) e Dylan (Jessie T. Usher), este último filho do personagem de Will Smith, que faleceu entre os dois filmes da rara doença atorcobroudemaisite.

Além disso, temos a “loucura” de dois personagens do original, o ex-presidente dos EUA Thomas Whitmore (Bill Pullman) e o cientista Dr. Okun (Brent Spiner), o romance entre Jake e Patty Whitmore (Maika Monroe), as decisões desastrosas da atual presidente (Sela Ward), as pesquisas de David Levinson (Jeff Goldblum) e da sua colega Catherine (Charlotte Gainsbourg), o aparecimento de um chefe militar africano (Deobia Oparei) e de vários personagens chineses, as aparições sem sentido algum de Vivica A. Fox e Judd Hirsch no decorrer da projeção…

Sem contar o fato de que nosso planetinha agora está envolvido em um conflito intergaláctico entre duas raças antigas, sendo que uma delas é representada por um alien que parece a cabeça decepada do Marvin de “O Guia do Mochileiro das Galáxias”.

Obviamente essa verdadeira bagunça gera um filme extremamente inchado, com uma montagem sem nenhuma estrutura, que deixa o filme parecer muito mais longo do que realmente é. Para completar, as piadas não funcionam, há uma tentativa patética de repetir aquele discurso ufanista do Presidente Whitmore (embora tenha uma ótima referência a “Contato” envolvendo o discurso original).

A química entre o trio Hemsworth/Monroe/Usher é praticamente inexistente, inexistindo qualquer figura que substitua o carisma de Will Smith aqui. Jeff Goldblum e Charlotte Gainsbourg ainda estão tentando descobrir o que estão fazendo no filme – e o espectador também. E por mais que seja ótimo rever Brent Spiner – o eterno Data – na telona e que seja ótimo ver um personagem gay relevante em um blockbuster, todas as participações do Dr. Okun aqui só geram vergonha alheia.

Especialista com doutorado e pós-doutorado em destruir o mundo, Roland Emmerich até entrega um bom espetáculo pirotécnico nas cenas de ação, embora as batalhas aéreas sofram com a falta de uma melhor organização espacial e a devastação seja menos impactante. Mesmo apelando para a nostalgia noventista, “Independence Day – O Ressurgimento” está a anos-luz do seu predecessor, não apresenta nem um centésimo do frescor do seu antecessor e ainda conta com um gancho para uma continuação que, se sair, deve se afastar ainda mais do espírito do original.

Thiago Siqueira
@thiago_SDF

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