Cinema com Rapadura

OPINIÃO   quinta-feira, 23 de junho de 2016

Como Eu Era Antes de Você (2016): um romance comovente e previsível

Apesar de abusar dos clichês e estereótipos, adaptação de Jojo Moyes deve agradar tanto aos fãs quanto o público geral.

Depois de Stephenie Meyer, David Nicholls, Nicholas Sparks e John Green, Jojo Moyes parece ser a bola da vez dos romances para jovens adultos. Com vários títulos em listas de best sellers pelo mundo, a autora tem sua primeira (provavelmente de muitas) obra adaptada para o cinema neste ano, pelas mãos da diretora (estreante no cinema) Thea Sharrock.

O filme conta a história de Will Traynor (Sam Claflin), um atlético e bem sucedido herdeiro dos milionários Stephen (Charles Dance) e Camilla Traynor (Janet McTeer), uma tradicional família britânica, que ficou paraplégico ao ser atropelado por uma moto. Depois de um longo período de depressão, sua mãe contrata Lou Clark (Emilia Clarke) como sua cuidadora pelo prazo de seis meses, em paralelo ao trabalho do enfermeiro Nathan (Stephen Peacock). Contudo, ao longo desse período, a relação dos dois começa a ficar mais próxima e intensa, o que provoca consequências na vida pessoal da moça e uma ponta de esperança na família de Traynor.

Apesar de seguir uma trama extremamente previsível, aqui vale a máxima que o importante não é saber o final e sim a jornada que leva até ele. Como o roteiro foi escrito pela própria autora do livro, seu controle sobre os personagens e a história como um todo permite que tudo seja coerente como que é apresentado ao longo da projeção. As personagens, tem a profundidade necessária, condizentes com seu tamanho na história, além de arcos bem desenvolvidos. Infelizmente, alguns estereótipos e artifícios repetitivos estão presentes, como: a pessoa inexperiente e claramente incompetente que é contratada para um trabalho de alta responsabilidade ou a visão preconceituosa de que pessoas ricas são sempre frias e mal humoradas, ou o fato de Lou começar a ser respeitada depois que começa a revidar as grosserias que escuta. Porém, depois de superados esses percalços, o restante do filme segue sem sobressaltos e com vários aspectos positivos.

Dentre estes, o que mais chama a atenção são os quesitos visuais que devem sempre andar em sintonia: fotografia, design de produção e figurino. O contraste entre os sentimentos e o modo de encarar a vida de Lou e Traynor salta aos olhos, ao passo que ele está sempre usando e envolto por cores escuras e frias, enquanto ela usa roupas sempre coloridas, penteados diferentes e ousados. Esse contraste também está presente nos ambientes que eles frequentam. Como a casa de Lou é pequena, um pouco bagunçada e ligeiramente apertada para tanta gente, o espectador fica com a sensação de proximidade e aconchego. Por outro lado, apesar do luxo, ambientes enormes, com pé-direito alto e tudo perfeitamente organizado deixa mais evidente a solidão e ambiente depressivo que permeia a família Traynor. Em uma análise um pouco mais filosófica, pode-se dizer que Lou realmente trouxe vida àquela família, uma vez que depois de sua entrada naquele lar, as cores e sorrisos tornam-se algo mais corriqueiro. A profusão de cores do universo de Lou lembram um pouco a composição visual do premiado “Brooklyn”, de 2015, dada a correção do uso desses elementos, ainda que aquela sobriedade de cores puras e sólidas não passe perto por aqui.

Além do visual, o filme também prima pela sua trilha sonora incidental, que vai de Ed Sheeran a Imagine Dragons, com cada música complementando com precisão as emoções que surgem em tela.

Entretanto, apesar de tantos aspectos positivos, nada supera o casal protagonista, Emilia Clarke e Sam Claflin. Clarke se desvencilha completamente do papel que lhe deu fama, a Daenerys Targaryen, do seriado “Game Of Thrones”. Ela consegue demonstrar muito mais talento, carisma e desenvoltura no desenvolvimento de sua personagem, afinal aqui ela expõe mais de duas expressões faciais e corporais. Ela é capaz de fazer rir com seu jeito desastrado e sua tendência de falar na hora errada ou quando tenta acompanhar o namorado atleta, da mesma forma que é capaz de levar a audiência às lágrimas (acertando em cheio o seu público alvo) em momentos mais dramáticos, como discussões mais pesadas no terceiro ato.

Já Sam Claflin tem um ótimo desempenho como o jovem tetraplégico. Ele consegue construir seu personagem de modo que se torne crível sua depressão, suas atitudes e suas decisões. Por isso, o impacto de Lou em sua vida a partir do início dessa relação é ainda maior, graças ao talento dos protagonistas.

Thea Sharrock é a grande responsável pelo sucesso dessa empreitada. Ela consegue extrair o que há de melhor do seu elenco, explorar ao máximo a química presente entre Claflin e Clarke, desde seus picos dramáticos, até o afiado timing cômico da dupla. Além disso, também demonstra habilidade em executar belas sequências, como o momento intimista em um casamento ou o confronto definitivo dos protagonistas.

Apesar de ser bastante previsível e repleto de clichês, o que pode tirar um pouco da força do filme, “Como Eu Era Antes de Você” tem um resultado final bem acima da média das recentes adaptações de romances, por conseguir fugir do drama fácil e ter um elenco talentoso que vai além de rostos e corpos bonitos.

David Arrais
@davidarrais

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